
“As feias que me perdoem, mas beleza é fundamental.” (Vinícius de Moraes)
Há um coeficiente mínimo de beleza física que o desejo de cada homem impõe para que ele se relacione com uma mulher. Este coeficiente aumenta de acordo com o grau de compromisso da relação a ser estabelecida. Para dar um estalinho em micaretas, por exemplo, normalmente é baixo; para casar, o maior de todos (ainda que, em alguns casos, o maior seja o para trair).
Isto não quer dizer necessariamente que o homem vá se casar com a mulher mais bela com quem se relacionou (o que é raríssimo, aliás), mas sim que poderá “ficar” e transar com mulheres com as quais jamais se casaria, dada a beleza insatisfatória das mesmas (ou qualquer outra característica que o homem julgue aquém de sua necessidade). Não estou falando de desejo sexual, portanto, aplicável a numerosas mulheres, mas de necessidade mesmo de beleza física, uma vez que, além de conseguir uma ereção, o homem-cônjuge também terá de aguentar olhar para a mulher, de preferência com o encanto que o puro desejo sexual dispensa.
Há inúmeros fatores que pesam para o prolongamento e o grau de compromisso de qualquer relação, assim como para o grau de encanto (no sentido de “memória poética”, de que fala Milan Kundera), mas nem a mulher mais adorável do mundo – ou mesmo a de melhor desempenho no beijo e no sexo – conquistará o coração de um homem se não estiver ao menos à altura do coeficiente mínimo de beleza física de que ele necessita para a relação pretendida.
Quanto maior o investimento amoroso que a mulher exige do homem antes de beijá-lo ou de transar com ele, mais ela diminui o risco de “ficar” ou transar com um homem que jamais namoraria ou casaria com ela. O motivo é óbvio: a maioria dos homens que só querem pegação e sexo com determinada mulher desiste da dita-cuja quando é alta a sua exigência de investimento, de modo que ficam apenas os realmente interessados, os fortemente atraídos e os autênticos cafajestes. Sempre haverá uma dificuldade feminina de distinguir entre estes – e é verdade que a facilidade atual de manter virtualmente o cortejo diminuiu o número de desistências categóricas -, mas a porcentagem de realmente interessados dentro desta amostra filtrada decerto tende a ser maior do que dentro da amostra original.
A mulher que dispensa maiores investimentos – que “não se valoriza”, como se diz por aí – para ficar ou transar com um homem, seja porque não resiste a seus encantos, seja porque tem a esperança de pertencer à categoria das namoráveis ou casáveis, seja porque quer desfrutar a pegação e talvez o sexo independentemente do futuro, escolhe um risco mais alto por livre e espontânea vontade, sendo portanto responsável pela sua escolha. Valorizar-se, diga-se, não é esnobar, como se pensa, mas conhecer e deixar-se conhecer sem se entregar fisicamente.
Se é verdade que cada vez mais os homens se deixam inebriar pela busca exclusiva de belezas monumentais para consumo imediato, também o é que as mulheres rancorosas da beleza alheia perdem de vista a necessidade mínima que todos eles realmente têm neste quesito. Os homens que desejam encontrar uma namorada ou esposa – e eles obviamente existem – estão obrigados a buscar a melhor opção em termos de personalidade entre aquelas que lhes são fisicamente viáveis; e se alguns deles às vezes também apelam a relações sem futuro com mulheres fúteis, isto também se deve, em certo grau, ao descaso com o corpo que as supostamente menos fúteis muitas vezes demonstram. Mulher feia que não busca a compensação física com exercícios, e ainda reclama que “os homens só querem as periguetes”, precisa é de muita terapia, nem que seja ao menos para reconhecer que os homens de sua alçada talvez não sejam aqueles que CONSEGUEM ficar com as “periguetes”.
O fato é que uma cultura que planta a ilusão colhe o rancor, e a cultura da pegação, à medida que facilita beijos e atos sexuais, ilude não apenas aqueles que os conseguem com a possibilidade – muitas vezes de antemão inexistente – de conseguirem levar a relação (amorosa) adiante, mas também aqueles que NÃO os conseguem com a certeza de que a culpa de suas frustrações é exclusivamente desta mesma cultura (ou dos tipos de homem que ela traz à tona), e não de necessidades alheias vitais ou da própria preguiça.
Nada contra quem se pega, nem contra a pegação. Mas há um coeficiente mínimo de discernimento e responsabilidade pelas próprias escolhas que pegadores e recalcados de ambos os sexos poderiam ter, em nome de uma convivência mais saudável.
Pegou?
Felipe Moura Brasil – https://veja.abril.com.br/blog/felipe-moura-brasil
Leia também:
– Pegação sem retorno;
– O mictório da estética;
e ainda: Human Beauty and the Golden Ratio.