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Felipe Moura Brasil

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Análises irreverentes dos fatos essenciais de política e cultura no Brasil e no resto do mundo, com base na regra de Lima Barreto: "Troça e simplesmente troça, para que tudo caia pelo ridículo".

A miséria espalhada no breu

Por Felipe Moura Brasil Atualizado em 31 jul 2020, 04h36 - Publicado em 23 jan 2014, 16h40

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O escritor não é um isolado.
 
Aprendi com Lavelle: “Não se deve levar uma vida à parte. Ela mais cega que esclarece.” Com Sertillanges: “Se a solidão vivifica, o isolamento paralisa e esteriliza.” Com Victor Hugo: “À força de ser alma, cessa-se de ser homem.” Com Schopenhauer: “Mas é este o caso de muitos eruditos: leram até ficarem burros.” Com Goethe: “O talento se aprimora na solidão, o caráter na agitação do mundo.” Com Montaigne: “Os próprios jogos e o exercício serão uma boa parte do estudo: a corrida, a luta, a música, a dança, a caça, o manejo dos cavalos e das armas.”
 
Aprendi também que, se eu disser essas coisas a um brasileiro, ele responderá: “Não falei? Você também precisa sair, se divertir, curtir a vida!”, sem jamais atinar que, por sua vez, ele precisa buscar conhecimento, aprimorar talentos, vivificar-se. Bernard Lonergan escreveu em seu “Insight”: “Há, de fato, bem lá no fundo de todos nós um impulso para conhecer, compreender, ver o porquê, descobrir a razão, encontrar a causa, explicar, que desponta quando o ruído dos outros apetites se aquieta.” Mas, no Brasil, o ruído dos outros apetites não se aquieta jamais.
 
“Sexo, sexo, sexo. Na nossa história não existe mais nada. O Brasil será sempre e só isso: o lugar onde o homem é livre para se comportar como ‘um bode em um cercado cheio de cabras, sem ideais, sem preocupações estéticas, políticas, intelectuais e artísticas’”, escreveu Diogo Mainardi, citando um trecho do “Retrato do Brasil”, de Paulo Prado, ensaio fundamental sobre a tristeza brasileira. Um bode “proletarium”, completo eu, na acepção romana – distinta de “pobre” ou “trabalhador” – de que fala Russell Kirk: um homem que não contribui à comunidade política com nada, a não ser com a própria prole e “vive, tal como os cães, dia após dia, sem refletir”.
 
Schopenhauer, inclusive, julgava a ignorância degradante somente quando associada à riqueza, aliviando a barra dos pobres, cujos trabalhos ocupavam o pensamento: “os ricos que são ignorantes vivem apenas em função de seus prazeres e se assemelham ao gado, como se pode verificar diariamente”: “devem ser repreendidos por não usarem sua riqueza e ócio para aquilo que lhes conferiria o maior valor”. Hoje nem é preciso sair do isolamento para constatar a vida de gado da elite brasileira, seja jovem ou adulta. Basta dar uma olhadinha no Instagram.
 
Não quero, com isso, dizer que o cidadão comum precisa se tornar um intelectual e vice-versa. Como define Lavelle: “Não se há de esquecer que os homens não têm a mesma vocação, que uns têm por missão aumentar esta luz interior que esclarece a consciência de toda a humanidade, e os outros utilizar e multiplicar os recursos do universo material em proveito da vida do corpo. Mas nem uns nem os outros estão dispensados de se prestar serviços mútuos.” Se os escritores se isolam da realidade da vida, a luz que esclarece logo se apaga. Se o cidadão comum se entorpece com a diversão obsessiva, os recursos materiais escasseiam e inflacionam.
 
Enquanto houver uma incomunicabilidade entre uns e outros, que os impeça de se prestarem serviços mútuos, a busca do sentido e da realização pessoal será sempre derrotada pela do sexo e do dinheiro, e o Brasil será sempre e só isso: uma porta aberta ao comunismo.
 
Isto é: à miséria espalhada no breu.
 
Felipe Moura Brasil – https://veja.abril.com.br/blog/felipe-moura-brasil
 
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