Assine VEJA por R$2,00/semana
Imagem Blog

Em Cartaz Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO

Por Raquel Carneiro
Do cinema ao streaming, um blog com estreias, notícias e dicas de filmes que valem o ingresso – e alertas sobre os que não valem nem uma pipoca
Continua após publicidade

Viola Davis a VEJA: “Aprendi muito com as guerreiras africanas”

O filme 'A Mulher Rei', estrelado pela atriz, se dedica especialmente às heroínas ofuscadas pela narrativa dos colonizadores europeus

Por Raquel Carneiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 23 set 2022, 14h45 - Publicado em 23 set 2022, 06h00

Ao longo de três séculos, um peculiar exército africano deixou militares europeus atônitos. “O grupo possui coragem admirável e muita audácia”, registrou, em 1890, um soldado francês invasor do Reino de Daomé, atual Benin, na costa ocidental do continente. Mais do que a habilidade no campo de batalha, o batalhão local surpreendia os inimigos por ser totalmente composto de mulheres. Os colonizadores as chamavam de “Amazonas de Daomé”, numa referência às míticas guerreiras gregas. Mas o grupo tinha nome próprio: agojie — termo ligado à fidelidade dessas mulheres ao rei. Na história escrita, elas foram mencionadas pela primeira vez em 1725, quase um século depois de sua formação. Agora, as agojies desembarcam em Hollywood com um retrato inédito e luxuoso.

Imagens do Daomé

Protagonizado e produzido por Viola Davis, o épico A Mulher Rei (The Woman King, Canadá/Estados Unidos, 2022), já em cartaz, destrincha a cultura e o treinamento árduo desse regimento sem precedentes. O resgate realista ganhou impulso graças ao sucesso de Pantera Negra, filme de 2018 que se inspirou nas agojies para a criação das Dora Milaje, implacáveis guerreiras de Wakanda. A Mulher Rei, porém, segue um movimento mais amplo em voga na literatura e no cinema, no qual descendentes de africanos escravizados vêm tomando de volta para si a narrativa sobre os antepassados. A investigação expõe um outro lado da história — aquele que não foi “escrito pelos vencedores”, como diz o chavão. Esse caminho reverso do colonialismo ilumina parte do passado ofuscado da África. É uma jornada de alto custo emocional, que fala do prazer de se conectar à ancestralidade sufocada e da cicatrização das feridas da opressão, mas também não esconde as atrocidades e a participação de camadas poderosas da África no comércio de escravos.

VIDA REAL - O batalhão de Daomé no longa: as guerreiras na linha de frente -
VIDA REAL - O batalhão de Daomé no longa: as guerreiras na linha de frente – (Ilze Kitshoff/Sony Pictures/.)

Numa posição geográfica privilegiada, Daomé abrigava um importante porto de tráfico humano, num acordo lucrativo com os europeus. Muitos cativos eram vítimas das agojies — que também recrutavam mulheres capturadas: todas eram proibidas de ter relações sexuais e filhos. “Elas transformaram sua situação adversa num meio de viver que lhes garantiu respeito e, mais tarde, virou um legado”, disse Viola a VEJA.

Jinga de Angola: A rainha guerreira da África

O filme da diretora americana Gina Prince-Bythewood não se desvia das polêmicas, mas opta por fazer de A Mulher Rei um manifesto sentimental sobre a força feminina e o poder de suas relações. Viola interpreta a general Nanisca, braço direito do soberano (vivido por John Boyega). Ao mostrar o próspero Reino de Daomé, com uma organização política e militar estabelecida, e seus avanços na agricultura e no comércio, o longa refuta o estereótipo de que a África era um antro tribal primitivo a ser salvo pelo cristianismo e pela civilização.

Continua após a publicidade
SOBERANAS - Jinga da Angola (à esq.) e Yaa Asantewaa (à dir.): rainhas guerreiras que desafiaram os invasores europeus na África -
SOBERANAS - Jinga da Angola (à esq.) e Yaa Asantewaa (à dir.): rainhas guerreiras que desafiaram os invasores europeus na África – (National Portrait Gallery - Londres; Savannah african art museum/.)

A óptica eurocêntrica ainda condenava a ordem social dos africanos, que permitiam mulheres em posições de poder — e as agojies não eram as únicas. Outras personalidades femininas deram dor de cabeça aos colonizadores. É o caso da rainha guerreira Jinga da Angola (1583-1663). Difamada pelos portugueses, que a descreveram como petulante, canibal, selvagem e promíscua, Jinga governou por quatro décadas, entre 1624 e 1663, os reinos pré-coloniais de Matamba e Ndongo — hoje Angola. Em um episódio simbólico de sua “petulância”, Jinga se indignou durante uma negociação com um representante da Coroa portuguesa, que a recebeu sentado em uma cadeira, reservando a ela apenas um tapete no chão. A soberana chamou uma de suas escravas, que se agachou de quatro e lhe serviu de banco. Estrategista, aliou-se a tribos variadas e até aos holandeses. Chegou a flertar com Roma, convertendo-se ao catolicismo, em manobras desenhadas com o intuito incansável de desafiar os portugueses — que nunca a capturaram.

Em busca de mim

Continua após a publicidade

A mesma empáfia demonstrou Yaa Asantewaa (1840-1921), rainha-mãe do Império Ashanti, atual Gana, que liderou seu povo contra o Exército britânico. Curiosamente, um assento foi o estopim do embate. Um militar inglês exigiu se sentar num trono sagrado dos ashantis — prova de que a petulância era, na verdade, uma especialidade europeia. A Mulher Rei, enfim, vinga essas poderosas africanas.

ENTREVISTA: “Aprendi muito”
Em visita ao Brasil, Viola Davis, 57 anos, falou a VEJA sobre A Mulher Rei e a preparação física para interpretar uma guerreira agojie.

EM CENA - Viola e John Boyega: preparação física intensa -
EM CENA - Viola e John Boyega: preparação física intensa – (Ilze Kitshoff/Sony Pictures/.)

Na pesquisa para o filme, o que mais a surpreendeu sobre a história das agojies? Foi chocante saber que essas mulheres eram rejeitadas. Tinham sido jogadas fora — e isso foi decidido por outros quando tinham entre 8 e 14 anos. Elas não eram livres para ter filhos, nem relações sexuais.

E como viraram o jogo? Elas transformaram sua situação adversa num meio de viver que lhes garantiu respeito e, mais tarde, virou um legado. Aprendi muito sobre o espírito guerreiro das mulheres.

A pesquisa a colocou em contato com outras figuras históricas femininas da África? Nosso foco era a cultura agojie, mas claro que conheço Jinga da Angola, entre outras. Meu mergulho foi muito intenso. Estudei sobre a fé em vodus, li documentos sobre o treinamento militar delas — fora minha preparação física, que levou meses. Mas descobrir a existência das agojies foi meu maior aprendizado.

Continua após a publicidade

Publicado em VEJA de 28 de setembro de 2022, edição nº 2808

CLIQUE NAS IMAGENS ABAIXO PARA COMPRAR

Imagens do Daomé
Imagens do Daomé
Jinga de Angola: A rainha guerreira da África
Jinga de Angola: A rainha guerreira da África
Em busca de mim
Em busca de mim

*A Editora Abril tem uma parceria com a Amazon, em que recebe uma porcentagem das vendas feitas por meio de seus sites. Isso não altera, de forma alguma, a avaliação realizada pela VEJA sobre os produtos ou serviços em questão, os quais os preços e estoque referem-se ao momento da publicação deste conteúdo.

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.