Tom Cruise ri da cara do perigo em despedida de ‘Missão: Impossível’
Ator faz escola ao expor o fascínio causado por cenas reais de ação sem dublês — os estúdios pagam caro para bancar o risco, mas o retorno compensa

O diretor Christopher McQuarrie costuma compartilhar publicações divertidas das redes sociais com o amigo e colega de trabalho Tom Cruise. Numa dessas, o cineasta que assina os quatro últimos filmes da franquia Missão: Impossível se arrependeu. Ao mostrar o vídeo de um homem andando sobre as asas de um avião no ar, Cruise se animou: “Eu posso fazer isso”, disse. “Não, não pode”, respondeu McQuarrie. Ao consultar um especialista, Cruise ouviu a mesma negativa e respondeu: “Obrigado por seu conselho”. O ator de 62 anos, amante de adrenalina e um tanto teimoso, desafiou as advertências e protagonizou a cena perigosíssima em Missão: Impossível — O Acerto Final (Mission: Impossible — The Final Reckoning, Estados Unidos/Reino Unido, 2025), oitavo e último título da franquia, já em cartaz nos cinemas.
Na sequência, o americano, que chega a ficar sozinho num bimotor nas alturas, não só atua como manuseia a câmera e alinha o avião para encontrar a luz ideal. É perceptível a dificuldade da façanha quando ele sai da cabine: o ar rarefeito e a alta velocidade deformam seu rosto. “A 10 000 pés de altitude, é como pisar em outro planeta”, explicou McQuarrie no Festival de Cannes, onde o filme fez sua estreia. “O vento bate na pessoa a 220 quilômetros por hora. O corpo não assimila o oxigênio. Em doze minutos, a fadiga física equivale a duas horas intensas de academia.” Buscando o take perfeito, Cruise ficou vinte minutos na asa e sofreu breve desmaio. Ele ficou deitado ali até se recuperar, voltar à cabine e, enfim, pousar o avião, deixando a equipe apavorada.

As peripécias arriscadas de Tom Cruise ilustram aquilo que se chama de “ação prática” — as cenas que dispensam o uso intensivo de efeitos (e de dublês) em prol do realismo. Cruise já pintou e bordou nisso: escalou o Burj Khalifa, maior prédio do mundo, em Dubai; saltou de moto num penhasco; e passou seis minutos sem respirar embaixo d’água. Volta à ação subaquática, aliás, no novo filme do agente Ethan Hunt — personagem que, como o ator, ri na cara do perigo.
Ao abrir mão de dublês, Cruise fez escola e virou um exemplo (ou desafio) a ser alcançado. Kate Winslet quebrou o recorde dele ao prender a respiração por sete minutos e quinze segundos nas filmagens de Avatar: o Caminho da Água (2022). Recentemente, a inglesa Florence Pugh saltou de paraquedas do segundo maior prédio do mundo, na Malásia, para a cena de abertura do filme da Marvel Thunderbolts, motivando comparações com o astro de Missão: Impossível.

Quem vê cenas impactantes não sabe como são complicados seus bastidores. Para além da preparação física dos atores, que envolve treinos rigorosos, a logística de filmagem deve ser alinhada com operadores de câmera que saltam junto com os atores, drones precisos e muita ansiedade entre os diretores e executivos por trás do filme. A média de valor do seguro de uma produção de Hollywood varia entre 1% e 3% do orçamento. No pacote, estão segurados os talentos do longa: caso o diretor ou um ator sofra um acidente, toda a produção é interrompida. Estimativa da corretora americana Epic Insurance aponta que, ao colocar a estrela de um filme em cenas perigosas, o valor do seguro costuma dobrar ou até triplicar. Sendo assim, o novo Missão: Impossível, feito com estonteantes 400 milhões de dólares, gastou entre 8 e 12 milhões só com o seguro — se usasse dublês no lugar de Tom Cruise, seria mais barato, em torno de 4 milhões.
O aumento no orçamento foi um ponto levantado por Kevin Feige, chefão do estúdio Marvel, quando ele recebeu um e-mail de Florence Pugh implorando pela chance de pular de um prédio de quase 680 metros de altura. “Argumentei que seria ótimo para a divulgação do filme”, disse Florence, danadinha. De fato, a notícia de que ela dispensou dublês e fez o salto retratado em Thunderbolts viralizou nas redes sociais, chamando a atenção para o longa que, até o momento, fez 327 milhões de dólares em bilheteria. Já o fardo sobre os ombros de Tom Cruise é mais pesado: para sair no lucro, o oitavo Missão: Impossível precisa arrecadar mais de 800 milhões de dólares no mundo — e passar de 1 bilhão seria o ideal. A missão é difícil, mas não impossível. Os sete filmes anteriores (a saga começou em 1996) já provaram sua popularidade e somam 4,2 bilhões de dólares em bilheteria — isso, sem corrigir a inflação. A adrenalina garantida se mantém altíssima — e os lucros, ufa, também.
Publicado em VEJA de 23 de maio de 2025, edição nº 2945