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Sonhar com Leões: Filme com Denise Fraga ousa ao falar sobre eutanásia

Atriz interpreta uma paciente terminal em busca de um fim digno

Por Raquel Carneiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 12 set 2025, 19h42 - Publicado em 12 set 2025, 06h00

Gilda ama viver. Infelizmente, o diagnóstico de um câncer na medula espinhal a coloca diante de uma sentença penosa: ela tem cerca de um ano de vida. Antes disso, a mulher de 50 anos de idade vai sofrer dores excruciantes e a perda progressiva dos movimentos do corpo. Ela decide se antecipar à doença por conta própria e dar fim ao sofrimento — mas sem sucesso. A brasileira que mora em Lisboa contrata então uma empresa portuguesa de nome irônico, a Joy Transition International, especializada em bem-estar para pacientes terminais. Por baixo dos panos, o empreendimento ajuda seus filiados a antecipar a morte de forma indolor — ou ao menos é isso o que ela promete. No filme Sonhar com Leões (Portugal/Espanha/Brasil, 2024), que acaba de chegar aos cinemas, o drama e o humor se intercalam sem trocar de marcha sob a condução tarimbada de Denise Fraga no protagonismo. Escrito e dirigido pelo cineasta greco-português Paolo Marinou-Blanco, o longa cáustico vem arrebanhando elogios na mesma medida em que levanta críticas vorazes por onde passa — ele foi exibido em festivais peculiares, da Estônia à Arábia Saudita, e mais recentemente em Gramado, no Rio Grande do Sul. Do evento brasileiro, foi o único filme em competição a sair sem nenhum troféu: levou apenas uma menção honrosa pela participação. A esnobada não foi por falta de qualidade da produção.

ESNOBADAS - O Quarto ao Lado: filme e atrizes miraram o Oscar, em vão, com temática controversa
ESNOBADAS - O Quarto ao Lado: filme e atrizes miraram o Oscar, em vão, com temática controversa (Sony Pictures/.)

O fim da vida é um tema espinhoso. Mais ainda é a antecipação voluntária da morte. De vez em quando, o cinema se propõe a colocar a mão nesse vespeiro, com retratos corajosos de pessoas reais e fictícias que, diante de sofrimentos imensuráveis, buscam a possibilidade de um fim digno e indolor por meio da eutanásia — quando o paciente morre com a ação de um profissional —, ou a morte assistida — o paciente aplica em si mesmo a dose fatal com supervisão médica. Raramente esses filmes furam a bolha dos ditos cinéfilos, ou conquistam grandes bilheterias e prêmios. Uma prova de que o tabu está longe de ser quebrado.

O longa mais recente sobre o tema a ganhar repercussão foi O Quarto ao Lado, de Pedro Almodóvar, sobre uma mulher com uma doença terminal que busca nos cantos obscuros da internet uma forma de morrer nos Estados Unidos — a produção lançada no ano passado mirou o Oscar, mas ficou sem nenhuma indicação. O país foi também cenário de um clássico disfarçado do assunto: Menina de Ouro, de Clint Eastwood, que em 2004 usou o boxe como atrativo dramático para, no fim, questionar quais são os limites éticos de prolongar a vida de uma pessoa que perdeu totalmente a autonomia de se movimentar e falar. Alcançando um público mais amplo, Como Eu Era Antes de Você, baseado no best-seller da autora pop Jojo Moyes, trouxe para as telas em 2016 o romance entre um rapaz tetraplégico e sua cuidadora extrovertida e cheia de vida. Mesmo diante da nova paixão, ele insiste no desejo de pôr fim ao sofrimento físico.

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CLÁSSICO - Menina de Ouro: boxe é pano de fundo para falar de eutanásia
CLÁSSICO - Menina de Ouro: boxe é pano de fundo para falar de eutanásia (PHOTOS12/AFP)

Assim como esses filmes, Sonhar com Leões — cujo título é inspirado no protagonista do livro O Velho e o Mar, de Ernest Hemingway, que sonha com leões como uma representação da perda da juventude — pode ser visto por alguns como um libelo pró-eutanásia. Mas o longa, na verdade, defende que a motivação para esse ato extremo não pode estar ligada à mera infelicidade com a vida ou à depressão. O direito de decidir deve ser um último recurso, defende o filme, diante da dor e do sofrimento físico às vésperas da morte inevitável. “A eutanásia é um tema muito controverso, mas necessário. A gente deve conversar sobre isso”, disse Denise Fraga a VEJA (leia a entrevista na página 82).

Ao partir de Portugal, Sonhar com Leões se mescla à visão um pouco mais avançada sobre o tema na Europa. Oito países do continente possuem legislações que, sob diversos requisitos, possibilitam procedimentos de antecipação da morte — mas todos ainda enfrentam algum tipo de resistência. O Parlamento português aprovou a legalização da morte assistida em 2021, mas até agora não houve a regulamentação que permitirá à lei entrar em vigor. Essa demora foi uma das inspirações de Paolo Marinou-Blanco, que viu seu pai definhar por meses em um hospital até a morte, em 2023. Sem a habilidade de falar, ele conseguia apenas cantarolar um famoso verso brasileiro: “Eu vou pra Maracangalha, eu vou” — canção do baiano Dorival Caymmi que integra a trilha do filme.

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ROMANCE POP - Como Eu Era Antes de Você: escolha entre o amor e a morte
ROMANCE POP - Como Eu Era Antes de Você: escolha entre o amor e a morte (Alex Bailey/Warner Bros/MGM Pictures/.)

Na Joy Transition International, Gilda conhece o jovem Amadeu, papel do português João Nunes Monteiro, que revela ter um tumor inoperável no cérebro. Funcionário de uma agência funerária — onde ele literalmente bate papo com os mortos, um dos pontos cômicos do roteiro —, Amadeu sofre de insônia e depressão. O personagem foi inspirado nas agruras do próprio diretor Marinou-Blanco — que certo dia escutou um audiobook com técnicas para encerrar a vida e, curiosamente, conseguiu dormir e curar sua insônia. Teve ali uma epifania: escolher a vida é uma prioridade, mas não deveria ser uma condenação para quem não tem escapatória. Eis uma questão delicada, mas que o cinema não se furta a debater.

“Falar de morte traz vida”

Denise Fraga conversou com VEJA sobre o filme e a finitude da vida.

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TRAGICÔMICA - A atriz: tema controverso, mas necessário
TRAGICÔMICA - A atriz: tema controverso, mas necessário (Leo Martins/Agência O Globo/.)

Sonhar com Leões é uma tragicomédia sobre a morte. Como encontrar o tom entre humor e drama? Esse terreno é um lugar muito precioso para transitar. Sempre digo que um roteiro não precisa ter um final feliz, mas precisa dar vontade de viver. E acho que o filme faz isso.

Teve receio ao abraçar a missão de fazer rir com tema tão duro? Nunca gostei da graça pela graça. O rir vem da história e da inteligência de quem a recebe. Do que você compreende. Sinto um empobrecimento subjetivo no Brasil nos últimos anos em relação à percepção de metáforas e de ironias sutis. O Paolo (diretor) fez algo muito ousado e original ao falar de eutanásia por meio da comédia.

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Como se preparou para o papel? Eu li muito, pesquisei a respeito e abracei a causa do diretor. A Gilda é uma personagem rica, uma mulher diferente de mim, sarcástica, cortante. Ela gosta tanto da vida que quer morrer, pois se for para viver daquele jeito ela não quer.

Qual a sua opinião sobre a eutanásia? Sou a favor, sempre fui. Ao me debruçar sobre o assunto, vi quão complexo e delicado ele é. É um tema controverso, mas muito necessário.

Por que há ainda um tabu para falar sobre morte? Quem tem medo do assunto talvez já tenha dentro de si algum pedaço morto. Falar de morte traz vida. A gente entende que se trata de um ciclo. Perdi minha mãe recentemente. Na época das filmagens, ela estava no hospital. Foi bom refletir sobre isso.

Publicado em VEJA de 12 de setembro de 2025, edição nº 2961

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