‘O Chamado 4’: a improvável mensagem a favor da ciência do filme de terror
Sequência da série de filmes japoneses surpreende com alegoria pandêmica, tom caótico e diversão estúpida

Mais de 25 anos após sua primeira aparição no cinema, Samara (ou Sadako, no japonês), a garota aterrorizante e morta que sai do poço da franquia O Chamado continua em alta na lista de fitas VHS (ou cassete) mais assistidas no universo fictício da história — e a saga parece longe do fim. São, ao total, treze longas-metragens sobre a personagem — nove japoneses, três americanos e um coreano—, todos protagonizados por personagens perspicazes, mas que de tão curiosos sempre se entregam a assistir à fita bizarra que leva seus espectadores à morte após 7 dias. O Chamado 4: Samara Ressurge, por sua vez, vem da série japonesa de filmes A Invocação, iniciada em 2012, que leva a cabeluda para o mundo da internet, onde tudo viraliza rapidamente como uma doença altamente infecciosa.
Desta vez, a protagonista é Ayaka Ichijo (Fuka Koshiba), acadêmica cujo QI de 200 é constantemente citado. Com todos os estereótipos de uma super-intelectual fictícia — com tiques e fobia social inclusos —, ela se dedica a empregar o método científico em sua investigação sobre o vídeo amaldiçoado, que agora ganha uma variante. Não mais uma semana, o período de incubação do “vírus-Samara” passa a tomar apenas 24 horas. As visões causadas por ele também mudam e agora assumem a forma dos entes queridos do infectado — o que proporciona que qualquer pessoa se vista com o vestido branco e a peruca da assombração. Como a sinopse evidencia, o filme está muito mais próximo da ficção científica (e da comédia) do que do horror, e, ao dispensar a ideia de uma cura completa para a maldição, se torna uma inusitada alegoria sobre vacinação e, mais surpreendentemente ainda, doses de reforço.
A inesperada mensagem cientificamente correta — no limite do possível — do filme, porém, não o exime das falhas esperadas de um projeto como esse. Samara Ressurge é filmado como um comercial de pasta de dente e editado com transições que parecem saídas de alguma versão antiga do programa Movie Maker. A linguagem dramatúrgica é emprestada dos doramas — novelas marcadas por atuações cartunescas e romances juvenis. Aliada à narrativa, ela compõe uma visão desarticulada e contraditória, que sabota qualquer temor do público ou construção de personagem — assim como os efeitos especiais antiquados que movem as madeixas de Samara. Não há primor técnico qualquer, tampouco, felizmente, há tempo para presunções de seriedade ou importância.

O Chamado 4, logo, faz o que parecia impossível e consegue ser, simultaneamente, pura estupidez e um reflexo da realidade pós-pandêmica, imerso em uma sensibilidade infantil que o torna ora charmoso e divertido, ora inacreditavelmente brega. Ninguém pediu por esta sequência, mas quando os créditos rolam ao som de J-Pop chiclete e erros de gravação, é impossível negar o deleite causado pela mistura dos sensos de profunda perplexidade e ridículo.