‘Mais que Amigos’: o amor gay ganha novo (e arejado) enfoque nas telas
Filme mostra a atração entre pessoas do mesmo sexo como ela é — com muito humor
Encontros com homens no aplicativo Grindr são rotina para Bobby Leiber (Billy Eichner). Travado e sem muita conversa, o solteirão na casa dos 40 anos não enxerga perspectiva para além desse tipo de interação fortuita quando o assunto são relacionamentos. Nessa rede à la Tinder, a regra é clara: mensagens curtas e grossas às vezes são menos importantes do que o “menu” de fotos sensuais. Só que nem isso é garantia de êxito: em uma ocasião, Bobby faz das tripas coração para mandar uma imagem quente ao paquera — e acaba bloqueado. A certa altura, porém, as experiências erráticas do protagonista do filme Mais que Amigos (Bros, Estados Unidos, 2022), já em cartaz no país, dão lugar a uma típica comédia romântica. Bobby conhece o bombadão Aaron (Luke Macfarlane) em uma balada, acha que não faz o tipo do rapaz, mas os dois vão de uma amizade improvável ao romance — mostrando que casais gays também podem experimentar, sim, paixões temperadas com riso e felicidade.
O trunfo que torna Mais que Amigos saboroso é a opção por não encaixar um casal gay dentro das convenções de uma relação hétero. Em vez disso, o filme se propõe a traduzir a complexidade do meio que retrata: expõe como até mesmo a própria comunidade LGBTQIA+ é heterogênea, com cada letra da sigla possuindo suas idiossincrasias. Bobby, além de contar as peripécias de sua vida em um podcast, foi escolhido como curador do primeiro museu da diversidade sexual de Nova York, e o que não faltam são papos hilários com os amigos sobre as exposições no local — como os mistérios que envolvem a sexualidade de Abraham Lincoln.
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Na mesma toada, produções recentes estão investindo em uma nova abordagem desse universo. Já houve época em que filmes e séries enfatizavam o drama da aids ou, mais recentemente, exibiam uma visão francamente família (e careta) do casamento homossexual. Agora, surge uma safra de histórias mais arejadas e realistas, que mostram o amor gay como ele é — com direito à alegria e a finais felizes. No filme Fire Island: Orgulho & Sedução, disponível no Star+, a história clássica de Jane Austen ganha uma versão dos dias atuais, com dois protagonistas de ascendência asiática que vão com os amigos para um ilha, topam com novos amores — e alguns clichês no caminho. Já Uncoupled, série da Netflix estrelada por Neil Patrick Harris, é uma espécie de Sex and the City gay: após tomar um fora do marido, um homem quarentão precisa reaprender a ser solteiro após dezessete anos fora do jogo.
Ao se somar à lista, Mais que Amigos prova que o humor é o ativo mais valioso dessas produções. Dotado de personalidade ácida, Bobby encara situações comuns na comunidade com sarcasmo e visão crítica. Em um primeiro momento, a relação com o másculo advogado Aaron é marcada por um velho embate existencial gay. Mesmo sendo encorajado a se reprimir desde pequeno, ele nunca aceitou “ficar no armário”, enquanto Aaron, por medo da homofobia, sempre preferiu se esconder sob o manto da discrição. Ao menos nas telas, o dilema da aceitação parece superado.
Publicado em VEJA de 12 de outubro de 2022, edição nº 2810
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