‘Ainda Estou Aqui’ ganha mais um prêmio inédito para o cinema brasileiro
Walter Salles e Fernanda Torres também saíram vencedores, enquanto ‘Senna’ foi premiado como melhor criação de TV

Ainda Estou Aqui tornou-se o primeiro longa-metragem brasileiro a ganhar o Prêmio Platino de melhor filme na noite deste domingo, 27, em Madri, na Espanha. O vencedor do Oscar de produção internacional também levou os troféus de direção para Walter Salles e atuação feminina para Fernanda Torres. No total, o Brasil concorria a onze prêmios, um recorde. Levou quatro. Além dos três para Ainda Estou Aqui, Senna foi escolhida a melhor criação de minissérie ou série de TV. O Platino é a maior premiação para cinema e televisão ibero-americanos. “É muito importante que nós latino-americanos e ibero-americanos trabalhemos em bloco porque nosso cinema e nossa televisão são muito maiores do que as pessoas dos Estados Unidos, por exemplo, pensam. Esse é um prêmio para todos os países latino-americanos, não só para o Brasil, porque nós todos trabalhamos muito para ganhar prêmios como este”, disse o produtor Rodrigo Teixeira ao receber o prêmio de melhor filme. Ainda Estou Aqui concorria com os filmes espanhóis El 47 e La Infiltrada, o argentino El Jockey e o português Grand Tour.
Walter Salles se tornou o primeiro brasileiro a levar o Platino de direção, por Ainda Estou Aqui — ele concorria com Arantxa Echevarría, de La Infiltrada; Luis Ortega, de El Jockey; e Pedro Almodóvar, com O Quarto ao Lado. O cineasta não estava em Madri, e o troféu foi recebido por Teixeira, que leu um discurso enviado por Salles. “É uma honra receber esse prêmio em uma categoria onde tem tanta admiração pelos diretores indicados. Obrigado aos Prêmios Platino por nos lembrar que o cinema latino-americano é a nossa casa. Gostaria de dedicar esse prêmio ao mestre que nos deixou há pouco, Carlos Diegues. Em um momento de fragilização da nossa democracia no mundo e em um tempo em que se tenta borrar a nossa memória coletiva, pensadores como Carlos Diegues nos lembram o quanto o cinema é fundamental para combater o esquecimento.”
Já Fernanda Torres tornou-se a terceira brasileira a levar o Platino de atriz, depois de Sonia Braga (Aquarius) e Carol Duarte (A Vida Invisível). Fernanda também não estava em Madri, mas mandou um discurso lido pela atriz Valentina Herszage, que interpreta Vera no filme. “Sou fruto da cultura ibero-americana. A Península Ibérica é minha segunda casa. Esse reconhecimento reforça em mim o orgulho de fazer parte de uma força cultural que no cinema pariu artistas da dimensão de Luis Buñuel, Pedro Almodóvar, Alejandro Iñarritu, Alfonso Cuarón, Ricardo Darín, Norma Aleandro, Penélope Cruz, Javier Bardem e Marisa Paredes, de Glauber Rocha a Fernanda Montenegro”, dizia a mensagem. “Esse é um filme de uma família feito por uma família de artistas e fico feliz de recebê-lo pelas mãos de Valentina Herszage, minha filha na ficção, que representa não só a mim aqui nesta noite, mas também ao Selton, à Luiza, à Barbara, ao Guilherme e à Cora. Sem eles, minha Eunice jamais existiria. Agradeço profundamente ao Walter Salles, meu irmão, meu amigo e parceiro de tantas décadas, a honra de ter habitado a pele desta mulher. Walter é o coração desse filme raro, tão humano e delicado, sobre a brutalidade da ditadura militar do Brasil, uma das tantas que se espalharam pelas Américas durante a Guerra Fria. Através da Eunice Paiva, revisitei o horror da ditadura que conheci em criança. Essa grande brasileira, advogada, democrata e defensora dos direitos humanos nos ensina no momento presente a resistir com alegria e civilidade sem nos dobrarmos ao autoritarismo. Em nome da Família Paiva, de Marcelo Paiva e de todos aqueles que defenderam e defendem a arte e a democracia, eu repito: ditadura, nunca mais!”
A minissérie da Netflix Senna ganhou o Platino de melhor criação de minissérie ou série de TV. “Esta noite de muitos brasileiros indicados é um símbolo da força e da resistência do cinema brasileiro”, disse Luiz Bolognesi ao receber o prêmio, que ele divide com Vicente Amorim, Fernando Coimbra e Patricia Andrade. Cem Anos de Solidão foi eleita a melhor minissérie ou série de TV, categoria em que as brasileiras Senna e Cidade de Deus – A Luta Não Para concorriam. Gabriel Leone e Alexandre Rodrigues perderam o Platino de ator de minissérie ou série de TV para Claudio Cataño, da colombiana Cem Anos de Solidão. O Platino de atriz de minissérie ou série de TV foi para Candela Peña, de O Caso Asunta. A brasileira Andréia Horta concorria por Cidade de Deus – A Luta Não Para.

Recorde de indicações
Os Prêmios Platino nem sempre foram muito inclusivos quando se trata do cinema falado em português. O Brasil, por exemplo, tinha sido indicado ao Platino de melhor filme apenas duas vezes antes de Ainda Estou Aqui: com Aquarius em 2017 e A Vida Invisível em 2020. Em 2025, o país teve 11 indicações: melhor filme, direção e atriz (Fernanda Torres), animação (Arca de Noé), minissérie ou série de TV (Senna e Cidade de Deus – A Luta Não Para), criação de minissérie ou série de TV (Senna), atriz de minissérie ou série de TV (Andréia Horta, por Cidade de Deus – A Luta Não Para), ator de minissérie ou série de TV (Gabriel Leone por Senna e Alexandre Rodrigues por Cidade de Deus – A Luta Não Para) e ator coadjuvante de minissérie ou série de TV (Hugo Bonèmer por Senna).
“Ter um recorde de indicações em um ano de projetos tão competitivos é um momento de grande orgulho”, disse Fabiano Gullane, produtor de Senna e Arca de Noé em parceria com seu irmão, Caio. “É um projeto criado no Brasil, produzido no Brasil, com apoio da família Senna, cujo destino era o mundo. Tomamos a decisão com a Netflix de que os líderes criativos fossem brasileiros, o que só comprova que o talento, a capacidade, a experiência estão lá. Se a gente tem condições de igualdade em termos de orçamento, de estatura de produção, o Brasil pode fazer um dos melhores audiovisuais do mundo.”

Aly Muritiba, diretor de Cidade de Deus – A Luta Não Para, destacou o bom momento do audiovisual brasileiro. “Estou muito feliz com o momento do cinema brasileiro, não só pelo sucesso que ele tem alcançado, principalmente tendo em conta o que aconteceu com Ainda Estou Aqui, mas porque é um cinema diverso que está chegando às salas e está sendo visto”, disse. Ele usou o título de um filme de 1983, que reestreou recentemente, para nomear esse momento: Onda Nova. “E acho que vem mais, porque Kleber está com filme em Cannes, Gabriel Mascaro ganhou prêmio em Berlim, há uma série de realizadores com filmes novos especial, então de fato acho que a gente está começando um novo ciclo.”
Vencedores do Prêmio Platino 2025
Melhor filme
Ainda Estou Aqui, de Walter Salles
Direção
Walter Salles por Ainda Estou Aqui
Atriz
Fernanda Torres por Ainda Estou Aqui
Ator
Eduard Fernández por Marco, La Verdad Inventada
Atriz coadjuvante
Clara Segura por El 47
Ator coadjuvante
Daniel Fanego por El Jockey
Roteiro
Arantxa Echevarría e Amèlia Mora por La Infiltrada
Documentário
El Eco, de Tatiana Huezo
Animação
Mariposas Negras, de David Baute
Filme de estreia
El Ladrón de Perros, de Vinko Tomicic
Comédia
Buscando a Coque, de César F. Calvillo e Teresa Bellón
Prêmio ao Cinema e Valores Educacionais
Memorias de um Cuerpo que Arde, de Antonella Sudasassi Furniss
Trilha sonora original
Alberto Iglesias por O Quarto ao Lado
Direção de fotografia
Edu Grau por O Quarto ao Lado
Direção de arte
Eugenio Caballero e Carlos Y. Jacques por Pedro Páramo
Direção de som
Alejandro Castillo, Antonin Dalmasso, Eva Valiño e Diana Sagrista por Segundo Prêmio
Direção de montagem
Victoria Lammers por La Infiltrada
Minissérie ou série de TV
Cem Anos de Solidão
Criação de minissérie ou série de TV
Vicente Amorim, Luiz Bolognesi, Patricia Andrade e Fernando Coimbra por Senna
Atriz de minissérie ou série de TV
Candela Peña por O Caso Asunta
Ator de minissérie ou série de TV
Claudio Cataño por Cem Anos de Solidão
Atriz coadjuvante de minissérie ou série de TV
Carmen Maura, por Terra de Mulheres
Ator coadjuvante de minissérie e série de TV
Jairo Camargo, por Cem Anos de Solidão