O soco que abalou a literatura: Vargas Llosa leva segredo para o túmulo
Até hoje se especula, em vão, sobre as razões da famosa agressão do autor peruano ao colega Gabriel García Márquez

Numa noite de fevereiro de 1976, um cinema badalado na Cidade do México estava lotado para a estreia do filme Os Sobreviventes dos Andes, de René Cardona. No meio da multidão, o colombiano Gabriel García Márquez avistou o colega peruano Mario Vargas Llosa. Com seus modos calientes, fez um gesto de abraçar o até então amigo — mas foi surpreendido por um cruzado de direita que o deixou por vários dias com o olho roxo. Ao morrer neste domingo 13, aos 89 anos, Vargas Llosa cumpriu sua parte numa promessa mútua feita por ambos os envolvidos no imbróglio: levou para o túmulo a razão misteriosa do soco mais famoso da história da literatura.
A saída de cena do autor de Conversa na Catedral (1969) e A Festa do Bode (2000) fez voltar à tona um episódio que mobilizou — em vão — a investigação de biógrafos, jornalistas e admiradores desde o fatídico nocaute. Artífice de monumentos do realismo mágico como Cem Anos de Solidão, Gabo morreu em 2014 sem descumprir, igualmente, sua parte. O que se sabe, de concreto, é que os dois ganhadores do Nobel e maiores nomes do chamado boom da literatura latino-americana nos anos 1960 e 70 nunca mais reataram a amizade após o escândalo, apesar de inúmeras tentativas — incluindo uma operação “deixa disso” empreendida por amigos em comum em 2007, na ocasião dos 80 anos de García Márquez.
Como era público e notório, a política era um campo divisivo para os dois mestres das letras. Gabo rezava pela cartilha comunista à moda antiga e tinha afeição por ditadores como Fidel Castro, de Cuba, e Daniel Ortega, da Nicarágua. Vargas Llosa até se empolgou com o regime cubano na juventude, mas logo se converteu em um liberal de quatro costados — foi inclusive o candidato da direita nas eleições presidenciais do Peru em 1990, quando perdeu para Alberto Fujimori. A despeito dessas diferenças, é improvável que as paixões ideológicas tenham sido a causa do soco. É mais certo que Vargas Llosa tenha se enfurecido por um motivo mais prosaico e pessoal.
A especulação mais verossímil nesse sentido aponta a então esposa de Vargas Llosa, Patricia, como o verdadeiro pomo da discórdia entre os dois. Notório mulherengo, o peruano estaria à época rompido com ela por uma traição –e Patricia teria sido acolhida por Gabo e sua mulher, Mercedes, que eram amigos do casal. A partir daí, as narrativas variam um bocado, da versão que diz que Llosa se sentiu traído por García Márquez e esposa aconselharem Patricia a pedir o divórcio à hipótese — nunca confirmada — de que Gabo teria dado uma cantada na mulher alheia. Com a morte do homem que desferiu o soco, o mistério continuará a fascinar os fãs da boa literatura — e das fofocas.
Acompanhe notícias e dicas culturais nos blogs a seguir:
- Tela Plana para novidades da TV e do streaming
- O Som e a Fúria sobre artistas e lançamentos musicais
- Em Cartaz traz dicas de filmes no cinema e no streaming
- Livros para notícias sobre literatura e mercado editorial