Por décadas, perdurou a ideia de que a renda do crescimento econômico se espalharia do topo para a base da pirâmide social em quantidade suficiente para abolir a pobreza. A história mostra que essa distribuição não ocorreu e sabe-se que a renda chegada aos pobres não seria suficiente para comprar no mercado os bens e serviços essenciais: educação, saúde, segurança. Dessa constatação surgiu a ideia do “keynesianismo social e produtivo”: renda mínima condicionada à produção para atender às necessidades, sobretudo educação. O Bolsa-Escola foi o mais reconhecido desses incentivos: pagar à mãe para que assegure a frequência dos filhos à escola. Previa-se que em poucas décadas a pobreza seria superada, não pela pequena renda, mas pelas consequências da educação, desde que a frequência ocorresse com aprendizado em escolas de qualidade. E que, paralelamente, fossem feitas as reformas adequadas para livrar o país da armadilha da baixa renda média.
Lamentavelmente, a estratégia do incentivo social e produtivo foi substituída pela visão da renda mínima para reduzir a penúria, mas não para erradicar a pobreza; e pela opção de ampliar o número de vagas no ensino superior, e não de implantar um sistema nacional de educação de base com qualidade. É como se, em vez de abolir a miséria, os governos tivessem preferido subsidiar a ineficiência econômica da escravidão, oferecendo alforria para alguns escravos viverem na casa-grande. O Brasil escolheu a assistência social para os pobres e subsídios fiscais para os ricos. O resultado é que, depois de duas décadas, o Brasil só tem o Bolsa Família para mitigar a penúria de 54 milhões de pessoas, mas infelizmente tudo indica que em 2045 ele ainda será necessário para 100 milhões. O fim do Bolsa Família hoje seria uma tragédia social, sua necessidade daqui a vinte anos será uma tragédia histórica.
“O Brasil precisa de uma estratégia para eliminar a necessidade de assistência no futuro”
O Brasil precisa manter a tática da mitigação da penúria no presente com a renda mínima do Bolsa Família, mas deve também implantar uma estratégia para eliminar a necessidade de assistência no futuro, salvo a idosos ou deficientes. Isso é possível com a adoção de incentivos sociais produtivos que empreguem as pessoas para a construção de moradia, água, esgoto, sobretudo para implantar um sistema escolar com máxima qualidade, garantindo frequência, assistência e aprendizado.
Sem isso, no lugar da construção de uma economia sólida, com renda alta e bem distribuída, e de uma sociedade com serviços públicos essenciais acessíveis para todos, o Brasil estará condenado a não escapar da armadilha da renda média baixa, nem da armadilha da renda mínima permanente: a primeira por causa da baixa produtividade, devido à falta de preparo da mão de obra; a segunda devido à dependência de assistência social para parte da população. As duas armadilhas se retroalimentando.
Pesquisa recente mostra que os brasileiros felizmente apoiam o Bolsa Família para diminuir a pobreza, mas já não acreditam na abolição do vergonhoso quadro, inclusive os líderes dos partidos progressistas. O Brasil parece viciado nos dois caminhos: acostumado com a assistência para os pobres e com os subsídios para os ricos, sem acreditar no propósito de economia eficiente e sociedade sem pobreza. Deseja-se aliviar a penúria, não abolir a pobreza.
Publicado em VEJA de 10 de janeiro de 2025, edição nº 2926
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