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A ideologia do descaso

O fim das escolas cívico-militares não resolve todos os problemas

Por Cristovam Buarque Atualizado em 21 jul 2023, 10h07 - Publicado em 21 jul 2023, 06h00

As escolas cívico-militares não surgiram apenas do desejo militarista de governo recente, elas respondem ao fracasso histórico da educação de base no Brasil. Apesar das deformações pedagógicas que carregam para a formação dos alunos, se apresentam como alternativa a um sistema escolar sem qualidade, ineficiente e injusto. Não seria uma proposta imaginada se o sistema tradicional oferecesse aulas no horário certo, sem paralisações, nem violências, com bom funcionamento, respeito e reconhecimento aos professores, manutenção eficiente, banheiros limpos, e os alunos sentindo aprender para o futuro. A militarização da gestão pode limitar o espírito crítico necessário em uma boa formação, mas o que se ouve de alguns dos pais é que nessas escolas “pelo menos nossos filhos têm aulas regularmente”.

A prática das últimas décadas — sem compromisso com a qualidade, às vezes irresponsável na adoção de metodologias da moda sem comprovação científica — quebrou princípios necessários à aprendizagem. Pontualidade e respeito não ensinam, mas sem eles não se aprende. A militarização da gestão é vista pela população como tentativa de corrigir o caos que impera no setor público. Foi adotada por desvio ideológico de governo militarista, mas surgiu porque as escolas brasileiras parecem caricatura de uma escolinha do professor Raimundo. Se as outras escolas estivessem funcionando bem, as chamadas cívico-militares não seriam aplaudidas.

“A militarização da gestão é vista pela população como tentativa de corrigir o caos do setor público”

O MEC deveria analisar onde erramos ao longo de décadas e por que perdemos a guerra da educação de base. Igno­rar a falência é um desvio tão ideológico quanto achar que as escolas cívico-militares resolveriam o problema. São duas vertentes da permanente ideologia de descaso à educação de qualidade: uma com viés militarista, outra civilista, ambas se recusando à ambição de educação com qualidade para todos, independentemente da renda. Ideologia obscurantista que não acredita no potencial brasileiro para ter educação de base com a máxima qualidade e ideologia segregacionista de que no Brasil não seria possível assegurar, aos filhos dos mais pobres, escolas com a mesma qualidade assegurada aos filhos dos mais ricos. Ideologia que federaliza o ensino superior, mas deixa a educação pública de base entregue aos municípios pobres e desiguais, mantendo a educação privada financiada pelas famílias, com subsídios da União.

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Acabar com a minúscula experiência federal cívico-militar pode barrar uma anomalia pedagógica, mas não vai melhorar a qualidade geral da caótica rede pública com mais de 150 000 escolas administradas por quase 6 000 municípios, nem reduzir a desigualdade conforme a renda do aluno. O MEC perdeu a oportunidade de analisar as razões do surgimento das escolas cívico-militares, de entender onde erraram quando estiveram antes no poder e deixou de apresentar sua proposta de reformas para o futuro: um novo e robusto sistema nacional de qualidade para todos. Pena que depois de quatro anos de ideologização do MEC, parece que esta é uma maldição que continua, substituindo a crença na disciplina militar pela tolerância com caos civil: o mesmo descaso com a falta de qualidade e com a aceitação da desigualdade.

Publicado em VEJA de 26 de julho de 2023, edição nº 2851

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