Digital Completo: Assine a partir de R$ 9,90
Imagem Blog

Cristovam Buarque

Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO

A estrada da civilização

É preciso lembrar de Francisco, que preferia pontes a muros

Por Cristovam Buarque Atualizado em 16 Maio 2025, 14h20 - Publicado em 16 Maio 2025, 06h00

Durante a missa de corpo presente do papa Francisco, Giovanni Batista Re, o cardeal decano do Vaticano, lembrou uma frase do pontífice argentino, para quem era “preciso construir pontes, não muros”. Não demorou para que a frase fosse interpretada como recado a Donald Trump, ali na primeira frente do velório. A homilia de Re, a rigor, aplicava-se a todos os presentes, porque a democracia pode ter cunho nacional, mas o humanismo é universal. Reafirme-se: a política anti-imigrantes não é exclusividade de Trump. Em 2011, Barack Obama disse não haver presidente dos Estados Unidos “que possa governar pensando no mundo todo; seu dever é com os americanos”. Alguns agem com menos alarde, até constrangidos, mas essa é a regra. Os europeus não constroem muros porque têm o Mediterrâneo para barrar os indesejáveis e aprisionar os sobreviventes de naufrágios.

Se não é o caso de barrar quem vem de fora, em países de menor fluxo migratório, dá-se outra modalidade de preconceito, contra os que não têm o passaporte do dinheiro ou cartão de crédito. No Brasil, quase todo condomínio tem um porteiro que age como “guarda de fronteira doméstico”, esperando o visto de autorização dado por algum morador. Cada portaria de prédio é um serviço de imigração e cada morador de apartamento, um “pequeno Trump” protegendo discretamente seu patrimônio.

“O eleitor usa a democracia para realizar os desejos imediatos, e não pensar no futuro da humanidade”

No futuro, é muito provável que despontem outras famílias de pessoas fadadas à diáspora, como os exilados ambientais. As novas gerações, para sobreviver com dignidade, precisarão de um meio ambiente equilibrado. No entanto, tudo indica um amanhã inviável, a depender do que cantam as autoridades de hoje. Ao incentivar o uso de combustíveis fósseis, de urgência, porque a energia limpa é mais trabalhosa, fecham os olhos aos danos que podem ser provocados. Dão de ombros para a elevação dos mares, a atmosfera poluída, a natureza devastada. Querem o voto do eleitor ali ao lado, o sujeito que pensa apenas na gasolina mais barata no posto. Pensam no aqui e agora, e ponto. São como “Trumps discretos”. Se puderem resolver o problema da hora, que se lixem os riscos de futuro, para nossos filhos e os filhos de nossos filhos.

O eleitor usa a democracia, sem a qual não existiríamos, para realizar os desejos imediatos — pessoais, familiares, de um país, mas não do planeta, a longo prazo. A maioria não vota para eleger humanistas solidários com o imigrante, seja o geográfico, que vem do exterior, seja o social, que vem da periferia, nem o “imigrante geracional”, que ainda nem nasceu.

Continua após a publicidade

Por isso, a principal tarefa dos humanistas deve ser a educação dos eleitores, de modo a superar a visão de que o “mundo é a soma de países”, e passem a ver “cada país como um pedaço do mundo”. É a única saída viável para o fortalecimento das democracias, em permanente controle do consumo e atenção aos limites da sustentabilidade. O humanismo, no presente, é isso, independentemente do pendor ideológico. Um caminho é evitar a eleição de quem anda na contramão, sejam Trumps, sejam outros que estavam na missa em Roma. O novo papa, Leão XIV, felizmente bebe das mesmas ideias de Francisco, como o incentivo a pontes, no avesso dos muros.

Publicado em VEJA de 16 de maio de 2025, edição nº 2944

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*
Apenas 9,90/mês*
OFERTA RELÂMPAGO

Revista em Casa + Digital Completo

Receba 4 revistas de Veja no mês, além de todos os benefícios do plano Digital Completo (cada revista sai por menos de R$ 9)
A partir de 35,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$118,80, equivalente a R$ 9,90/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.