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Viagem pelos bastidores da matemática – até para quem não é fã de números

Livro oferece um novo panorama das descobertas matemáticas por meio das contribuições de diversos povos e ilustres desconhecidos

Por Diogo Sponchiato Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 24 jun 2025, 20h39 - Publicado em 24 jun 2025, 13h19

Boa parte dos jornalistas – eu incluído no time – foge de números. Argumentamos que somos de humanas, um álibi para escapar das ciências exatas, de teorias e cálculos assustadoramente complexos e, claro, da hora de dividir a conta no bar. Brincadeiras à parte, despertar o interesse pela matemática entre quem não está habituado a estudá-la ou a usá-la muito além das operações simples no cotidiano pode ser uma tarefa desafiadora.

Então, que tal contar uma história sobre os números protagonizada por gente de carne, osso e problemas a superar – ilustres conhecidos e desconhecidos que, há mais de 2 000 anos, vêm quebrando a cabeça para decifrar a matemática por trás da vida, dos astros e das engenhosidades humanas? Eis a proposta de Kate Kitagawa e Timothy Revell em A Vida Secreta dos Números, que acaba de ser publicado pela Crítica.

Nessa obra que traz os bastidores da matemática desde priscas eras e civilizações – babilônios, maias, chineses… -, somos apresentados a um novo panorama das buscas e descobertas dessa área da ciência, rompendo o monopólio eurocêntrico do saber e percorrendo outros territórios e culturas da nossa esfera, onde mentes brilhantes também promoveram saltos de compreensão e inventividade, ainda que frequentemente negligenciados pela história tradicional (e ocidental).

(Uma correção: como aprendemos no livro, a Terra é, na verdade, um esferoide oblato, uma esfera achatada).

É assim que iremos deparar com os primeiros cálculos um tanto precisos sobre o movimento planetário e a duração de um ano na Terra, mérito dos maias; com as fontes primordiais do binarismo – ideia tão importante para o funcionamento dos computadores hoje – na China antiga; com babilônios e chineses desvendando o número pi (a relação entre a circunferência de um círculo e seu diâmetro = 3,14…); com a invenção do 0 (sim, o zero) pelos maias e sua posterior apropriação para fins matemáticos por um indiano no século XVII; com os gregos lapidando a geometria e vendo na matemática “uma forma divina de beleza e porta de entrada para a compreensão da razão da existência…”; com os algarismos árabes que deram origem aos números modernos; com as coordenadas e os gráficos cartesianos imaginados pelo autor de “Penso, logo existo”; com as calculadoras humanas americanas que ajudaram a mapear cometas e estrelas…

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(Capa: Crítica/Reprodução)

Mais do que símbolos, equações e teoremas (de Gougu a Fermat), Kitagawa e Rewel têm o mérito de oferecer o lado humano da moeda, isto é, um panteão de homens e mulheres (sim, grandes mulheres), de diversas origens e nações, que contribuíram para as imensas noções e realizações da matemática. “Os avanços vêm de uma combinação de brilhantismo individual e esforço coletivo”, dizem os autores a VEJA.

E, humanos, demasiado humanos como são, muitos desses personagens tiveram de enfrentar não só os números em si como também a concorrência, os preconceitos e as barreiras sociais. É por isso que Kitagawa e Rewel trazem também episódios como as disputas pelo posto de “pai do cálculo” entre o inglês Isaac Newton e o alemão Gottfried Leibniz. Tiram das sombras figuras como a francesa Émilie du Chatelet, cujo papel no desenvolvimento da lei da conservação de energia é solenemente ignorado até hoje. E retratam pessoas que furaram a bolha, o status quo e a discriminação – caso da primeira professora de matemática reconhecida, a russa Sophie Kowalevski, no século XIX, e do primeiro matemático negro a concluir um doutorado, o americano Elbert Cox, em 1925.

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A Vida Secreta dos Números é uma história da matemática e de matemáticos, tantos deles esquecidos ou menosprezados. E é por isso que agrada até gente que, como eu, não era tão fã de matemática. Com a palavra, seus autores.

Qual seria a descoberta mais fascinante que vocês fizeram durante a pesquisa para o livro?
Nosso livro não se propõe a destacar um único indivíduo. Em vez disso, compartilha as histórias de diversas pessoas que contribuíram para o desenvolvimento da matemática. Algumas dessas figuras são bem conhecidas em certas regiões, mas permanecem desconhecidas em outras. Nosso objetivo era dar a esses pioneiros o devido lugar na história. Gostamos muito de aprender sobre muitos matemáticos de fora da Europa, cujos trabalhos não havíamos encontrado anteriormente. Esperamos que os leitores achem suas histórias envolventes e que o livro ofereça uma perspectiva mais equilibrada sobre a história global da matemática.

Entre tantos personagens que mencionam em A Vida Secreta dos Números, qual ou quais escolheriam como símbolo dessa nova história da matemática?
A história de Sophie Kowalevski é relativamente conhecida, mas examinamos a credibilidade das biografias escritas sobre ela no início do século XX. O preconceito de gênero distorceu sua personalidade e ficamos surpresos ao descobrir como a história a deturpou. Também destacamos figuras menos conhecidas, como Ban Zhao, a primeira matemática conhecida na China, e duas italianas que quase se tornaram professoras de matemática antes de Sophie. Suas histórias de vida, repletas de lutas e sucessos, são atemporais e inspiradoras.

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No livro vocês expõem diversos problemas matemáticos colocados e resolvidos. Qual desafio esperam ver solucionado nos próximos anos?
Um exemplo que apresentamos em nosso livro é a conjectura dos primos gêmeos. É a ideia incrivelmente simples de que existem infinitos pares de números primos que diferem por apenas dois números — como 3 e 5 ou 11 e 13. Ela existe há pelo menos 150 anos e há muito tempo é considerada um grande problema não resolvido na teoria dos números. Por muito tempo, parecia algo completamente fora de alcance — ninguém tinha a mínima ideia de como começar a prová-la. Mas, em 2013, um matemático chinês chamado Yitang Zhang fez um avanço notável. Ele não provou a conjectura dos primos gêmeos de forma definitiva, mas demonstrou que existem infinitos pares de números primos separados por no máximo 70 milhões de pares. Isso pode parecer uma diferença enorme em comparação com dois, mas, antes de Zhang, nem sabíamos se havia algum limite finito entre esses pares.

Essas e outras conquistas são resultado de um trabalho coletivo, nem que ele se estenda no tempo, certo?
O que é realmente inspirador é o enorme projeto colaborativo — um esforço online chamado Polymath8 — formado para desenvolver o trabalho de Zhang. Foi assim que esse grupo de matemáticos conseguiu reduzir drasticamente a diferença formulada inicialmente. É um exemplo perfeito de como os avanços na matemática geralmente vêm de uma combinação de brilhantismo individual e esforço coletivo.

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