Alguns anos atrás, um jornal brasileiro se referiu a Portugal usando a alcunha de “terrinha”, para a ofensa de muitos além-mar. Correram notas na imprensa local para explicar que o apelido, comum entre brasileiros, era afetuoso – e não marca de deboche. O país, de fato, tem extensão semelhante à de Pernambuco. Mas sua história mostra que tamanho não é documento. Ou talvez seja exatamente por ser diminuta que a nação se dedicou a feitos tão grandiosos.
Penso nisso porque, no próximo 10 de junho, celebra-se o Dia de Portugal. A bem da verdade, Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas. O nome triplo resume um dos traços mais marcantes da brava gente lusitana: o de se lançar mundo afora em busca de novos horizontes, como se sua belíssima costa fosse um cais.
De lá partiram, entre tantos navegantes ilustres, o poeta Luís de Camões, pai da língua portuguesa – que, por causa desse espírito, é o quarto idioma mais falado do mundo, por cerca de 260 milhões de pessoas. Destas, apenas cerca de 10 milhões estão em Portugal. O resto, nas tais comunidades celebradas pela data, Brasil incluído com grande peso.
Há cinco séculos, o vaivém transatlântico é incessante. As ondas que levam para lá ou para cá são infladas, ao menos em parte, pelos ventos da economia. Hoje, eles sopram para Portugal, que se tornou também um importante porto de chegada. Em 2023, foi visitado por mais de 18 milhões de estrangeiros. Se a cifra, quase o dobro de sua população, parece grande por si só, considere que, no mesmo período, o Brasil recebeu um terço desse número.
O turismo é só uma das razões que colocam Portugal na proa da Europa. Como outras nações do sul do continente, duramente atingidas pela crise da década passada, tem atraído não só visitantes, mas também investimentos. Ao lado de Grécia e Espanha, cresceu mais do que o dobro da média da zona do euro, conforme registrou o The New York Times.
Dá para entender por que quem chega à “terrinha” quer ficar. O clima é bom, e o povo é hospitaleiro. Há uma boa rede hoteleira, a partir da qual é possível visitar seu patrimônio histórico ou explorar suas belas praias e paisagens. Sem falar na gastronomia, famosa no mundo todo e que, o visitante logo vê, vai bem além do bacalhau e dos doces. Suas ruas charmosas e esquinas pitorescas podem ser percorridas sem medo. Difícil não se apaixonar.
É certo que nem sempre foi assim. Muitos foram os que deixaram para trás um país empobrecido. Meu pai entre eles. O jovem Valentim saiu de Pomares do Jarmelo aos 16 anos com a meta de só voltar se prosperasse. Regressou, ao lado dos filhos, com seu carro embarcado em um navio para, lá chegando, ir visitar quem tinha ficado. Eu mesma repeti a viagem, levando também seus netos. Sempre que posso, volto.
Alcançar um bom porto é o que deseja todo viajante. Mas, para traçar rotas seguras, muitos ficaram pelo caminho. Em um de seus poemas, Fernando Pessoa associa o sal do mar às lágrimas dos que, lá em Portugal, ficaram esperando. “Valeu a pena?”, pergunta ele. E responde, com seus versos mais famosos: “Tudo vale a pena/ Se a alma não é pequena”.
Enorme é a alma de Portugal. Que possamos, como brasileiros, celebrar o 10 de junho com a consciência de que, em diferentes medidas, ela faz parte de nossa história.