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Claudio Lottenberg

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Mestre e doutor em Oftalmologia pela Escola Paulista de Medicina (Unifesp), é presidente institucional do Instituto Coalizão Saúde e do conselho do Hospital Albert Einstein

Quão perto está a medicina de realizar um transplante de olho inteiro?

Apesar dos avanços fascinantes nas últimas décadas, esse continua sendo um desafio extremamente complexo

Por Claudio Lottenberg
Atualizado em 7 Maio 2025, 10h07 - Publicado em 7 Maio 2025, 10h05

Será que um dia conseguiremos realizar o transplante de um olho inteiro, preservando plenamente suas funções? A questão é pertinente porque, apesar dos avanços fascinantes da medicina nas últimas décadas — muitos deles impensáveis até pouco tempo atrás — esse continua sendo um desafio extremamente complexo.

Para tentar responder à pergunta, vale primeiro relembrar um caso que recebeu bastante atenção na mídia internacional há alguns anos. Aaron James é um veterano norte-americano que trabalhava como eletricista. Em 2021 ele encostou o rosto num fio de alta tensão e recebeu uma descarga elétrica de mais de 7 mil volts. Aaron sobreviveu, mas perdeu um olho, nariz, lábios, dentes e parte da bochecha.

Dois anos depois, em 2023, ele foi submetido à primeira cirurgia de transplante de face e de olho inteiro. O procedimento experimental, realizado no Langone Health, hospital vinculado à Universidade de Nova York (NYU), envolveu 140 profissionais, durou mais de 20 horas e foi um sucesso. O rosto de Aaron foi reconstruído usando parte do rosto de um doador, incluindo seu olho esquerdo inteiro.

Acontece que essa cirurgia tinha finalidade estética. A reconstrução facial de Aaron não lhe devolveu a visão do olho esquerdo, nem tinha a pretensão de fazê-lo – o que, evidentemente, não diminui a importância desse feito histórico. Muito pelo contrário.

O procedimento provou, por exemplo, que é possível ligar uma artéria da têmpora com a artéria oftálmica, que mantém a nutrição do olho. Isso é fundamental porque a retina só fica viva se estiver constantemente irrigada; além disso, o humor aquoso, isto é, o líquido rico em proteínas que envolve parte do olho humano e mantém seu vigor, também precisa de sangue para ser formado.

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A ligação arterial realizada pela equipe do Langone provou que dá para transplantar um olho inteiro e mantê-lo vivo no organismo receptor. Mesmo assim, esse olho ainda funcionará essencialmente como uma prótese.

A arquitetura do olho humano é muito complexa. O globo ocular é composto, resumidamente, por três camadas. A camada externa compreende a parte branca do olho (esclera) e, no seu centro, a córnea, isto é, aquele domo transparente que protege a íris (a parte colorida do olho) e a pupila (o “buraquinho” preto no centro do olho, que se contrai e expande de acordo com a luminosidade do ambiente).

Na camada média estão a íris e o corpo ciliar, estrutura que ajuda a produzir o humor aquoso e que dá suporte ao cristalino, isto é, à “lente” natural do olho, posicionada atrás da pupila. A luz entra pela pupila, é “focalizada” pelo cristalino e acaba projetada no “fundo” do olho, a camada interna, onde fica a retina, que é a parte que se comunica com o cérebro via nervo óptico.

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Isso significa que para transplantar um olho inteiro, mantendo (ou recuperando) a visão do paciente, não basta garantir que todas essas estruturas estejam preservadas e vascularizadas – o que já é um problema e tanto. É preciso também reconectar milhões de fibras que transportam informações do olho do paciente para o córtex visual, que fica no cérebro. Pense no nervo óptico como o mais complexo cabo de fibra óptica que você já viu – “fios” incontáveis e finíssimos reunidos em feixe num único condutor.

O desafio é enorme, mas isso não desanima as centenas de médicos e pesquisadores que trabalham para supera-lo. Aliás, na cirurgia de reconstrução facial de Aaron James, os médicos do NYU Langone injetaram células-tronco no nervo óptico do olho transplantado. Como esse novo nervo seria conectado ao pedaço remanescente do nervo óptico original do paciente, os médicos decidiram testar se as células-tronco podem ou não ajudar na regeneração do condutor.

É um bom exemplo de abordagem experimental que pode, em alguns anos, abrir portas para técnicas cirúrgicas inovadoras.

O transplante de olho inteiro é um quebra-cabeças que ainda nos intriga. Mas o mesmo poderia ser dito há algumas décadas de cirurgias como o transplante de córnea, hoje corriqueiras. A medicina nos dá provas ano após ano, século após século, de que a linha do impossível pode mudar de uma geração pra outra. Por isso, o investimento em pesquisa científica e tecnologia continuam sendo a nossa melhor aposta para atingir o que hoje parece fora do alcance.

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