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Claudio Lottenberg

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Mestre e doutor em Oftalmologia pela Escola Paulista de Medicina (Unifesp), é presidente institucional do Instituto Coalizão Saúde e do conselho do Hospital Albert Einstein

Cuidar de todos e de si mesmo

Pesquisa mostra que parcela dos médicos não segue recomendações de saúde; importância está em legitimar os bons exemplos

Por Claudio Lottenberg
Atualizado em 26 out 2022, 10h23 - Publicado em 26 out 2022, 10h16

De forma geral, a pessoa que precisa de uma consulta médica vai a um hospital (ou usa a telemedicina), conversa com o médico, explica o que sente; o médico a examina, receita remédios, faz recomendações, pede exames; e fim. A pessoa vai embora (ou desliga o aplicativo) e vai seguir as recomendações dadas. Em nenhum momento (de novo, de forma geral) a pessoa sentiu qualquer dúvida sobre qual poderia ser o estado de saúde daquele médico com quem ela conversou. Uma pesquisa recente mostra que, em não poucos casos, o médico pode parecer bem – mas só parecer.

O levantamento em questão foi feito pela APM (Associação Paulista de Medicina), com um questionário online que foi respondido por 778 médicos em todo o Estado de São Paulo entre os dias 19 e 29 de agosto. Os dados sugerem que a saúde dos médicos paulistas vem encontrando dificuldades. Por exemplo, 26,99% (o que é pouco mais de um em cada quatro) dos entrevistados disseram que não praticam qualquer atividade física. Os mais ativos, que se dedicam a atividades cinco ou mais vezes por semana, somam pouco mais de 15% – e entre estes, quase sete em cada dez (68%) o fazem por até 30 minutos.

O sedentarismo na população brasileira adulta fica em torno de 15% (dado do Vigitel 2021, a pesquisa telefônica do Ministério da Saúde). Vem dos próprios médicos a recomendação para que se faça mais atividades físicas no dia a dia, mas o exemplo não é muito seguido internamente.

Mas antes que se faça qualquer mau juízo sobre os médicos que não seguem a própria recomendação, outro dado da pesquisa da APM ajuda a entender essa situação: quase um em cada quatro (24,29%) trabalha ao menos 60 horas por semana. Para aqueles que têm família e querem dedicar a ela algum tempo, sobra de fato pouco espaço para encaixar uma vida mais plena em atividades físicas. Apesar do debate atual em torno de formas e períodos de trabalho, para uma proporção grande dos médicos a ideia de semanas de quatro dias, ou jornadas de 35 ou mesmo de 30 horas são metas distantes. Uma proporção praticamente igual (24,94%) trabalha até 50 horas por semana, outra rotina bastante puxada.

Outros dados do levantamento dão alguns sinais da saúde mental dos médicos atualmente: 71,72% dizem sofrer de desânimo e impaciência; 20,05% experimentam a solidão; 26,61% sentem alterações na memória; e 30,72% afirmam ter dificuldade para se concentrar. Ao lados destes números vêm os de uso contínuo de medicamentos – e 18,64% dos entrevistados afirmaram fazer uso de antidepressivos, e outros 11,57%, de ansiolíticos ou tranquilizantes. Praticamente um em cada quatro (24,55%) usam remédios para controle da hipertensão. Ao longo do ano anterior à pesquisa, mais de quatro em cada dez (44,09%) afirmaram ter enfrentado distúrbios do sono; 21,72% afirmaram ter tido distúrbios psicológicos.

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Nem é preciso lembrar que os últimos 30 meses foram marcados pela pandemia de covid-19 – que atingiu em cheio os profissionais de saúde como um todo. No caso dos médicos entrevistados, quase metade (47,94%) teve a doença uma vez e 13,75% a contraíram duas vezes (e 58,61% tomaram quatro doses de imunizante).

Alguém poderia querer lembrar de uma ideia muito presente – e sem dúvida alguma válida – em nosso dia a dia é a de que o exemplo é um dos melhores (talvez o melhor, mas essa discussão fica para os especialistas) instrumentos para se ensinar e liderar. Há mesmo um provérbio – atribuído ao sábio chinês Confúcio (552 a.C. e 489 a.C.) – que diz: “A palavra ensina, mas o exemplo arrasta”. O que se supõe é que, daquele que pretende transmitir um conteúdo, o conheça pela experiência própria, pela prática. Quando isso não se verifica, provoca um certo espanto. Mas esse espanto só resiste até que se observe a rotina dos médicos: um em cada quatro deles (25,84%) leva até duas horas para chegar ao trabalho – em geral, estes moram a até 20 quilômetros de distância do local onde atendem. Alguns dados do levantamento são positivos: 77,76% dos médicos nunca fumaram – eis aí um muito bom exemplo a ser seguido. Outros 46,4% não fazem uso de medicamentos e 24,04% não tiveram sintomas de covid longa.

Médicos são pessoas como os pacientes que atendem em seus consultórios; como elas, têm saúde, de que precisam cuidar também. A atividade que exercem, no entanto, está entre as mais exigentes que existem, tendo de conviver com cargas altíssimas de estresse, e em muitos casos com condições precárias de trabalho. Isso foi ainda mais intenso nos momentos mais críticos da pandemia. A pesquisa serve como um sinal para os próprios médicos de que recomendações para cuidar da saúde valem para todos, eles inclusive. E o exemplo tem grande força. Como diz a frase atribuída ao filósofo e psicólogo americano William James (1842-1910): “Aja como se o que você faz fizesse diferença. Porque faz”.

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