Não se faz protesto sem fazer política
Atos do domingo nunca tiveram a intenção de atrair Lula, mas conseguiram levar presidenciáveis de centro ao mesmo palanque
Na véspera dos protestos contrários ao governo do presidente Jair Bolsonaro, ocorridos ontem em várias capitais, um líder envolvido diretamente na articulação explicava à coluna o motivo de alguns partidos aproveitarem a convocação de movimentos suprapartidários, o Movimento Brasil Livre (MDB) e o Vem Pra Rua. Ele discorria sobre como seria “complicado” imaginar um ato conjunto de todos os partidos de oposição sem que um lado gritasse “Volta, Lula” e o outro gritasse “Lula, nunca mais”.
Parte da oposição cogitava chamar um protesto no dia 19, mas prevaleceu a ideia de embarcar no que já estava previsto para domingo. “É um protesto de oposição ao Bolsonaro, não da oposição”, emendou o líder. As imagens deixam claro que não foi nem de perto um protesto do tamanho do 7 de setembro de Bolsonaro. Disso ninguém discorda. Mas nem poderia ser diferente. Não teve a mesma estrutura, o mesmo financiamento, a mesma mobilização. Mas, mais do que isso, falou mais alto o que estava por trás do protesto. Para fazer um ato com tamanho, seria necessário fazer política. E não se fez.
Nada de vermelho, é cor de petista. Nada de amarelo, é cor de bolsonarista. Não é para ter campanha a favor de candidato, mas pode ter campanha contra candidato. Afinal, pode falar “nem Bolsonaro, nem Lula”. Mas não pode ter “Volta, Lula”, embora seja o adversário mais forte colocado até agora contra Bolsonaro. Retiraram as duas pontas do espectro político e fizeram um ato em favor do centro. Que até agora se sai mal no voto.
Claro, se tem um partido com bastante experiência em levar gente para a rua é o PT. Se Lula estivesse lá, teria mais gente? Bem possível. A questão é que mesmo que tudo fosse diferente, Lula não iria. Assim como não foi ao tradicional Grito dos Excluídos, ocorrido no mesmo dia dos atos bolsonaristas. Simplesmente, não é interessante para quem lidera pesquisas de intenção de voto para a corrida presidencial de 2022 dividir um palanque com possíveis adversários na eleição neste momento.
Mas os atos deste domingo, embora menores, conseguiram pelo menos uma coisa que não deve ser desprezada. Mesmo que de última hora, MBL e Vem Pra Rua levaram Ciro Gomes (PDT), João Doria (PSDB), Luiz Henrique Mandetta (DEM), Alessandro Vieira (Cidadania) e Simone Tebet (MDB) no mesmo palanque. Todos possíveis candidatos em 2022.