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Caçador de Mitos

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Uma visão politicamente incorreta da história, ciência e economia
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Bolsa Família: como uma ideia da direita se tornou a principal bandeira da esquerda brasileira

Por Leandro Narloch
Atualizado em 31 jul 2020, 01h28 - Publicado em 6 Maio 2015, 13h52

 

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Tucanos dizem que quem criou os programas de transferência de renda foi FHC; petistas insistem que nada a existia no Brasil antes de Lula. Os dois partidos escondem a verdadeira origem dos programas de renda mínima. A ideia que se tornou a grande bandeira da esquerda nasceu com Friedrich von Hayek e Milton Friedman – dois ganhadores do Nobel de Economia rejeitados pela própria esquerda como os “os pais do neoliberalismo”.

A história é desconhecida, mas não se trata de um segredo. Até Eduardo Suplicy admite a influência neoliberal. No livro Renda de Cidadania, Suplicy afirma que ele próprio se inspirou em estudos de economistas neoclássicos que conheceu na década de 60, durante o mestrado em economia na Michigan State University. Entre várias fontes de inspiração, como Karl Marx e Jesus, Suplicy menciona Hayek e Friedman. Ele inclui no final do livro até mesmo uma entrevista com Milton Friedman, realizada em 2000.

“Ser contra a renda mínima só porque Friedman a defendeu é semelhante a ser contra o imposto de renda só porque países capitalistas o aplicam”, escreveu Suplicy.

A proposta de Friedman está no livro Capitalismo e Liberdade, de 1962. Ele sugere que, em vez de impor regulações que distorcem o mercado, como leis de salário mínimo e controles de preços, o governo deveria criar um “imposto de renda negativo”.  Quem ganha menos que o piso de recolhimento do imposto de renda deveria pagar um valor negativo (ou seja, receber um subsídio) proporcional ao valor que falta para chegar ao piso.

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No Brasil de hoje, a mordida do imposto começa com 7,5% sobre o que excede o salário de R$ 1900. Na proposta de Friedman, quem tivesse o salário de R$ 1200 ganharia 7,5% de R$ 700, ou R$ 52,50.

“As vantagens são claras”, escreveu Friedman. “A prática explicita o custo que impõe à sociedade. Opera fora do mercado. Como qualquer outra medida para mitigar a pobreza, reduz o incentivo para que os pobres ajudem a si próprios, mas não o elimina inteiramente.”

Os argumentos de Hayek são mais teóricos, relacionados a sua visão de liberdade humana. Hayek vê a propriedade privada e o livre mercado como as principais armas contra a coerção e a submissão. Nesse raciocínio, quem não tem propriedades ou renda fica vulnerável à coerção e ao abuso de poder. “A garantia de uma renda mínima para todos, ou uma espécie de piso abaixo do qual ninguém precisa descer, mesmo quando incapaz de se sustentar por si mesmo, parece constituir uma proteção perfeitamente legítima contra um risco comum a todos”, afirmou o austríaco.

Como uma ideia liberal se tornou bandeira da esquerda?

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A história ganha coerência se voltarmos trinta anos. Nos anos 80, com o Muro de Berlim ainda em pé, os militantes da esquerda defendiam reformas estruturais – luta de classes, reforma agrária, fazendas de produção coletiva. Já os conservadores diziam que o avanço do capitalismo livre das unhas do governo era o melhor sistema para os pobres no longo prazo. O que, então, fazer com a miséria no curto prazo? Atenuá-la com programas focados em atenuar a pobreza.

Não é à toa que a maioria dos programas de transferência de renda surgiu logo depois da queda do Muro de Berlim, quando ficou bem ridículo falar em luta de classes. A expressão “redução da pobreza” ganhou as passarelas enquanto “revolução do proletariado” ficou encostada no armário. Na América Latina, dezessete países criaram programas desse tipo entre 1990 e 2010.

A ironia mais saborosa dessa história é sobre o pioneiro dos programas de transferência na América Latina. O Subsidio Único Familiar, implantado em 1981 pelo governo chileno, dava dinheiro a mães pobres que mantivessem o filho na escola.

Pois é. O ditador Augusto Pinochet foi o primeiro a implantar o programa que, décadas depois, daria origem ao Bolsa Família.

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