Uma tragédia peruana, o sonho de um gol e um presente no avião
No céu russo, fiz um novo amigo e conheci a bonita história do narrador Daniel Peredo, a voz que levou o Peru à Copa depois de 36 anos
MOSCOU – Despertador, malas, táxi, raio-x, avião, conexão, horas de espera, outro avião… a rotina de aeroportos é desgastante e uma das maiores dificuldades durante uma cobertura de Copa do Mundo, mas também pode ser divertida e emocionante. Nas últimas três semanas, conheci pelos ares pessoas de diversas nacionalidades. No ultimo voo, um grupo de alemães tirou onda com o 7 a 1, mas admitiu que não gostaria de enfrentar o Brasil logo nas oitavas de final. Em outro, mexicanos me relataram a emoção de atravessar o continente e assistir à sua equipe derrubar os atuais campeões. Falamos de pirâmides, nachos, tequila, política, Chapolin…e, claro, futebol. Dias depois, conheci um simpático torcedor peruano que não só me contou boas histórias como me deu um presente ao saber que eu era jornalista: um livro sobre uma bonita e ao mesmo tempo trágica história de amor.
Tabela completa de jogos da Copa do Mundo 2018
“Peredo Total”, da editora Debate, é um compilado de textos e entrevistas de Daniel Peredo, o principal narrador do futebol peruano, que morreu no início deste ano, aos 48 anos, ao sofrer um infarto fulminante enquanto jogava futebol. “Peredo era um ídolo nacional, foi a voz que nos levou ao Mundial depois de 36 anos. Sua perda abalou a todos os peruanos”, me contou o engenheiro Christian Requejo, de 25 anos, citando a histórica classificação do Peru. Ele me mostrou vídeos e fotos que fez da arquibancada do Estádio Nacional de Lima, na vitória sobre a Nova Zelândia, na repescagem, a última narração de Peredo em uma partida da seleção peruana. “Ver o Peru no Mundial foi o momento mais feliz da minha vida”, contou.
Folheando o livro com textos do jornalista, que passou pelos jornais El Bocón e El Comércio e pela revista Once, antes de consagrar como narrador, ficou claro o amor de Peredo pela seleção peruana. Rumo a Moscou, me identifiquei imediatamente com uma das frases do primeiro capítulo: “O futebol, generoso, me permitiu viajar, conhecer pessoas, me emocionar e sofrer…” Em seguida, em texto de 1993, Peredo fala do sofrimento de uma derrota para a Colômbia, com show de Freddy Rincón. Me lembrei que tinha o contato do ex-jogador colombiano, um dos meus ídolos da infância, tirei uma foto da página e lhe enviei. Rincón respondeu imediatamente e me agradeceu pela boa recordação.
Meu novo amigo peruano me contou sobre a alegria de ter chegado ao Mundial e da frustração de ter sido eliminado, mesmo jogando bem, após duas derrotas para Dinamarca e França. E rumo a Sochi, onde o Peru enfrenta nesta terça a Austrália, às 11h (de Brasília), me contou seu maior sonho. “A única coisa que quero agora é que o Peru marque um gol. Só queremos viver essa alegria numa Copa do Mundo”, contou Christian. Pela primeira vez em muitos anos, a narração desta alegria não será de Peredo, mas sua história será sempre recordada no país. Confira, abaixo, o relato do narrador na histórica vitória sobre a Nova Zelândia.