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Um olhar diferente para as desigualdades do Brasil
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Seca extrema expõe os graves problemas de saneamento básico do país

A estiagem prolongada e a baixa no volume dos rios pioram a qualidade da água, afetando a saúde da população

Por Andréia Peres 1 out 2024, 09h00

Reportagem publicada pela VEJA há alguns dias chamou a atenção para as mazelas da seca prolongada, a maior dos últimos 60 anos, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). De acordo com a matéria, a secura afeta 25 dos 27 estados – só o Rio Grande do Sul e Santa Catarina escapam –, impactando a vida de quase 200 milhões de brasileiros.

O cenário de catástrofe ambiental descrito na reportagem é ainda pior se levarmos em conta a precariedade do saneamento básico. “Quando não temos o esgoto tratado, esse esgoto bruto vai para o mesmo rio onde se capta água para o consumo humano”, explica Luana Siewert Pretto, engenheira e presidente-executiva do Instituto Trata Brasil, OSC da área de saneamento básico, em entrevista à coluna. “Com um volume de água menor, a diluição desse esgoto bruto também é menor, aumentando a poluição.”

Segundo informações do  Painel Saneamento Brasil, do Instituto Trata Brasil, o país teve, em 2022 (último dado disponível), despesas superiores a R$ 87 milhões com hospitalização com doenças de veiculação hídrica, como diarreia, febre amarela, dengue, leptospirose, malária e esquistossomose. Ao todo, foram 191.418 internações por essas enfermidades. Mais de 56 mil dessas hospitalizações foram de crianças de 0 a 4 anos. Um número que deve, com certeza, aumentar quando a seca deste ano entrar nas estatísticas.

REGIÃO NORTE, UMA DAS MAIS CASTIGADAS PELA SECA, TEM APENAS 14% DE COLETA DE ESGOTO

“Nos lugares em que o saneamento não é bom, a situação acaba sendo ainda mais grave”, alerta Luana Pretto. A região Norte, por exemplo, uma das mais atingidas pela seca, tem apenas 14% de coleta de esgoto e 64% da população com acesso à água tratada. “As pessoas utilizam água de poço ou a própria água do rio, que vai ficando cada vez mais contaminada”, explica a especialista.

Para se ter uma ideia da gravidade da situação, em 2023, só no Amazonas, foram distribuídos para comunidades mais vulneráveis mais de 4,7 milhões de frascos de hipoclorito de sódio a 2,5% usado para tratamento da água. “Isso é um tratamento paliativo numa catástrofe”, avalia Luana. Também é uma boa medida da precariedade do saneamento básico, que castiga ainda mais a região.

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A especialista chama a atenção ainda para outro grave problema no Brasil: a perda de água. “De um lado, o rio está secando. De outro, perco quase 50% de toda a água que eu capto na região Norte por ineficiência do sistema de distribuição”, lamenta. “Temos tecnologia para consertar o vazamento na hora em que ele acontece, mas dependendo do lugar isso pode demorar dias ou mesmo meses.”

Segundo levantamento do Trata, com a redução da perda para 25%, percentual que o governo estabelece como meta até 2034, seria possível abastecer quase 5 milhões de pessoas na Amazônia Legal, mais do que o dobro da população de Belo Horizonte, em 2024.

No Brasil como um todo, a perda é de 37,8%. Nas regiões mais críticas, como Norte e Nordeste, o percentual é próximo dos 50% (46,9%, na região Norte, e 46,7%, na região Nordeste).

“Com essa recorrência cada vez maior das secas, alguma coisa tem que ser feita porque a gente não vai conseguir mais o volume de água que estávamos acostumados a captar. Uma maneira de resolver esse problema é reduzir as perdas”, analisa Luana.

Além disso, é necessário que sejam elaborados planos de mitigação em relação aos eventos climáticos extremos. “Na matriz de risco das concessionárias de saneamento básico ou dos governos, a questão das mudanças climáticas precisa estar presente”, avalia a especialista. “Vivemos uma época em que havia água abundante. Hoje, a realidade não é mais essa. Os eventos climáticos extremos vieram para ficar e é preciso incluí-los como risco nas operações das concessionárias de saneamento e ter alternativas para abastecimento humano”, afirma.

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Luana Pretto defende ainda que haja mais diálogo entre os setores em relação à água. “Como fica a regulação em relação ao volume a ser captado?”, questiona. Segundo ela, só a agricultura, por exemplo, capta 70% do volume da água dos rios. Esse é um tema que precisa ser discutido o quanto antes entre os diferentes setores (agricultura, indústria, abastecimento).

“O planeta já não espera para cobrar da próxima geração e está farto de acordos climáticos não cumpridos”, disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em discurso na abertura da 79ª Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York. “A Amazônia está atravessando a pior estiagem em 45 anos. Incêndios florestais se alastraram pelo país e já devoraram 5 milhões de hectares apenas no mês de agosto [..]. Já fizemos muito, mas sabemos que é preciso fazer mais”, afirmou o presidente.

Sem dúvida, é preciso fazer mais. Com eventos climáticos cada vez mais frequentes, saneamento básico é hoje outra urgência ambiental. “Cada fase do jogo vai ficando mais difícil”, compara Luana. “Vem a mudança climática e não resolvemos a fase anterior, que é a coleta e o tratamento de esgoto. O mínimo vai ficando cada vez mais difícil e a solução, cada vez mais complexa”, alerta.

* Jornalista e diretora da Cross Content Comunicação. Há mais de três décadas escreve sobre temas como educação, direitos da infância e da adolescência, direitos da mulher e terceiro setor. Com mais de uma dezena de prêmios nacionais e internacionais, já publicou diversos livros sobre educação, trabalho infantil, violência contra a mulher e direitos humanos.

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