Mulheres ainda têm baixa representatividade na política
Apenas 16% dos vereadores do país são mulheres e mais da metade das cidades brasileiras não tem nenhuma mulher negra na Câmara Municipal
Fiz várias matérias sobre mulheres na política e uma delas, em especial, me marcou. Ao entrevistar uma secretária de Assistência Social do município de São Paulo sobre discriminação, ela me contou que, ao se apresentar como secretária, ouvia quase sempre uma pergunta: “secretária de quem?”.
O episódio aconteceu nos anos 90. Felizmente, hoje não há mais tamanho estranhamento com a ascensão feminina na política, mas a baixa representatividade continua, sim, chamando a atenção.
Neste ano, teremos eleições municipais e os dados são “alarmantes”, segundo o Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea). Levantamento feito pela organização em relação aos números das últimas eleições municipais (2020) apontam que as mulheres representam apenas 16% dos vereadores do país. Somente 13% dos municípios brasileiros têm uma mulher como prefeita e nenhuma capital é comandada por mulher.
Quando se faz o recorte racial, a situação é ainda pior. Mulheres negras são 6% do total de vereadores e estão em 4% das prefeituras do país, o menor grupo nesse cargo; 53% das cidades brasileiras não têm nenhuma mulher negra na Câmara Municipal.
As mulheres são a maioria do eleitorado (52,6%) no Brasil e seu voto tem sido considerado decisivo nas eleições. Campanha coordenada pelo Cfemea e pela Rede de Desenvolvimento Humano (Redeh) para o pleito eleitoral de 2022, denominada “Meu voto vale muito”, chamou a atenção para a necessidade de superar a baixa representatividade das mulheres na política, contribuindo para uma democracia mais representativa.
“As candidaturas das mulheres ainda são subfinanciadas”, critica Isabel Freitas, assessora técnica do Cfemea, em entrevista a esta coluna. “Foi aprovado um fundo eleitoral bilionário para as eleições municipais deste ano e ele precisa ser democratizado”, afirma. Segundo ela, é necessário que haja justiça na distribuição desses recursos. Ou seja, eles também devem contemplar as mulheres, especialmente as negras, e populações quilombola, indígena, LGBTQIAP+, entre outras.
Além de recursos, para aumentar a representatividade das mulheres na política, a especialista acredita que os partidos precisam dar às candidatas as ferramentas necessárias para que elas tenham sucesso nas eleições, como tempo de TV e de rádio e materiais de divulgação de qualidade.
Em tempos de fake news e de ataques gratuitos, Isabel também considera importante que os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) façam campanhas de conscientização e informação sobre violência política, abrindo possibilidades para que as mulheres e outros grupos historicamente marginalizados dos processos de representatividade eleitoral possam denunciar esses casos. “Essas candidaturas precisam saber onde denunciar, além de ter a garantia de investigação, rápida apuração e responsabilização de quem pratica esse tipo de violência”, diz.
Em 24 de fevereiro de 2024, o voto feminino completou 92 anos. Quase um século depois, a luta continua.
* Jornalista e diretora da Cross Content Comunicação. Há mais de três décadas escreve sobre temas como educação, direitos da infância e da adolescência, direitos da mulher e terceiro setor. Com mais de uma dezena de prêmios nacionais e internacionais, já publicou diversos livros sobre educação, trabalho infantil, violência contra a mulher e direitos humanos.