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Balanço Social

Por Andréia Peres Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Um olhar diferente para as desigualdades do Brasil

Cortes de verbas dificultam enfrentamento aos feminicídios no Brasil

Casos brutais recentes chamam a atenção para a importância da prevenção e do enfrentamento. Brasil é hoje o 5º país que mais mata mulheres no mundo

Por Andréia Peres 9 dez 2025, 06h30 •
  • Nos últimos dias, diversos casos de feminicídio chocaram o país. No Brasil, a taxa de feminicídios é de 4,8 para 100 mil mulheres – a quinta maior no mundo, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS).

    Em entrevista exclusiva à coluna, a cientista política e mestre em Ciências Sociais Ana Carolina Querino, representante da ONU Mulheres no Brasil, fala sobre esse cenário, comenta os cortes generalizados na ajuda internacional, que estão desmantelando justamente as organizações essenciais para acabar com a violência contra mulheres e meninas, e defende a importância da prevenção. “Se a gente não discutir um novo modelo de expressão da masculinidade, esses números de violência não vão cair”, diz ela.

    Abaixo, os principais trechos da entrevista.

    Balanço Social – Neste ano, a campanha da ONU Mulheres pelo fim da violência contra mulheres e meninas tem foco em uma das formas de assédio que mais cresce: a violência digital. De que forma ela se expressa hoje?

    Ana Carolina Querino As tecnologias reproduzem desigualdades e violações de direitos humanos já estabelecidas. E isso é verdade também quando a gente olha para as expressões de violência contra mulheres e meninas. Temos a tecnologia sendo usada como um canal para aliciar vítimas de tráfico humano, como uma forma de disseminar muito rapidamente a violência e sendo também o mecanismo pelo qual a violência se expressa.

    Mais de 90% das deepfakes [fotos, vídeos ou áudios falsos criados com inteligência artificial] com imagens de mulheres são relacionadas a manipulação e a contextos sexuais. Temos ainda a difamação, que é uma outra forma muito comum de violência contra as mulheres, com foco, em geral, nas que estão em posições públicas, que defendem diretos humanos e também, de forma mais agravada, nas negras, trans ou com deficiência. Isso sem contar o stalking on-line [vigilância/rastreamento, para monitorar as atividades de alguém] e a disseminação de fotos de mulheres e meninas nuas e de comunidades que instigam o ódio e a misoginia contra as mulheres.

    Há ainda aqueles grupos que colocam como condição para as meninas pertencerem que se automutilem ou que adotem determinadas práticas violentas. Temos, portanto, uma ampla gama de expressões de violência que afetam as mulheres e as meninas de forma diferenciada.

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    Balanço Social Hoje, menos de 40% dos países têm leis que protegem mulheres contra o assédio ou a perseguição on-line. Cerca de 1,8 bilhão de mulheres não têm proteção contra a violência digital. Que tipo de proteção precisamos criar no Brasil?

    Ana Carolina QuerinoDefendemos que exista algum mecanismo para fortalecer as capacidades das mulheres, das meninas e de organizações que defendem os direitos das mulheres de promover maior segurança on-line, para que saibam como é, o que facilita ou não a disseminação desse tipo de violência e para terem acesso aos serviços de saúde mental. A gente sabe que, mesmo quando essa violência ainda não se concretiza na vida real, as vítimas de violência on-line sofrem os seus efeitos psicológicos.

    É importante conscientizar sobre as expressões de violência nos meios digitais, como se proteger e quais são os mecanismos para apagar esses conteúdos, além de atuar na prevenção.

    Também precisamos trabalhar com os meninos modelos positivos de masculinidade, para acabar com esses fóruns misóginos, as “machosferas” disseminadas por aí. Senão, vamos sempre recair nessas situações.

    Muitos jovens estão cometendo violência e discriminação on-line e não têm consciência de que o que estão fazendo é crime, já enquadrado na legislação penal existente. Esse é um conteúdo que deve ser discutido nas escolas, mas também em casa.

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    Acreditamos que também é importante que haja um mecanismo de responsabilização das empresas, que tenham artigos [na lei] recomendando e orientando quais são as ações que essas empresas precisam tomar.

    Uma ação isolada em determinado campo não é suficiente para acabar com essa violência. É necessário envolver diferentes frentes.

    Balanço Social O que falta para erradicarmos ou pelo menos diminuirmos a violência contra a mulher? Onde estamos errando?

    Ana Carolina Querino – Não é uma questão de erro. Há vários fatores que a gente pode levantar. Primeiro, que não é fácil acabar com uma violência que é tão estruturante na nossa sociedade. As nossas relações e as relações de poder que existem entre homens e mulheres são muito violentas. Temos também um contexto de redução de financiamento. Segundo relatório que a ONU Mulheres lançou agora [relatório intitulado Em risco e subfinanciadas] mais de um terço das organizações [34%] suspenderam ou encerraram programas voltados para o fim da violência contra mulheres e meninas e mais de 40% reduziram ou fecharam serviços essenciais [como abrigos, assistência jurídica, apoio psicossocial e cuidados de saúde] devido a lacunas de financiamento. Isso tudo vai se somando.

    Outro fator crucial é a mudança das normas sociais. Se a gente não discutir um novo modelo de expressão de masculinidade, esses números de violência não vão cair.

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    As crises hoje são multifacetadas. Não é uma atrás da outra. É tudo ao mesmo tempo, agora. Essas situações são mais propícias à expressão de violência. Quando há crise econômica ou climática, um desastre ambiental, esses números aumentam. Quando houve a pandemia de covid-19, falamos da pandemia invisível, que era a pandemia da violência, que aumentou dramaticamente. E isso vem acompanhado da redução dos serviços oferecidos às mulheres vítimas de violência.

    Outro ponto é a questão da qualidade dos dados. Nem sempre o que acontece é o aumento dos feminicídios. Muitas vezes, há o aumento do registro como feminicídio. É importante ficarmos atentas se houve um aumento de fato da violência ou se mais mulheres estão denunciando.

    Balanço Social A que você atribui essa redução do financiamento?

    Ana Carolina Querino – Há pelo menos 15 anos a gente tem observado isso. Hoje, apenas em torno de 4% do financiamento para o desenvolvimento vão para projetos que têm perspectiva de gênero e menos de 1% é destinado para projetos que trabalham com os direitos das mulheres. Isso é algo bastante crítico e uma tendência geral. Os países estão priorizando recursos para segurança interna e externa. Com as guerras e conflitos que estão surgindo, os países estão se armando. E quando a gente fala de investimento público e privado o quadro não muda muito. Então, tem sido cada vez mais difícil.

    Balanço Social A Lei Maria da Penha completou 19 anos neste ano. Mesmo com uma lei, que é referência no mundo, não avançamos tanto quanto deveríamos. O que acontece?

    Ana Carolina QuerinoSe não há um mecanismo mais robusto para que a lei seja efetivada na sua completude, é difícil ter uma resposta eficaz. Dependemos da capacidade das organizações de trabalhar no controle social, de ir atrás, de cobrar a implementação, o orçamento…Há hoje uma guerra de narrativas, um processo de desinformação, em que as mensagens antidireitos são rapidamente propagadas. Quando você fala de direitos das mulheres, cai na história de ser “abortista” ou em “ideologia de gênero”. Fica muito difícil ter uma conversa séria, baseada em evidências e em conceitos acordados internacionalmente.

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    Hoje, a gente tem a própria Maria da Penha, que está com medida protetiva novamente, muito em função desses processos de desinformação em relação ao histórico da violência que ela sofreu e a lei que leva o nome dela. É muito complexo de a gente conseguir dar conta.

    Balanço Social O que avançamos nos últimos anos?

    Ana Carolina Querino Avançamos muito no sentido de que esse é um tema de consenso. As mulheres também estão muito mais conscientes. Muitas campanhas foram realizadas nos últimos anos sobre as diversas formas de violência, violência psicológica, patrimonial…Esses conceitos que eram pouco conhecidos e falados estão mais presentes e as mulheres também estão mais atentas, inclusive em relação à rede de enfrentamento à violência. Não sofrem mais caladas e não ficam mais inertes em relação a situações de violência.

    * Jornalista e diretora da Cross Content Comunicação. Há mais de três décadas escreve sobre temas como educação, direitos da infância e da adolescência, direitos da mulher e terceiro setor. Com mais de uma dezena de prêmios nacionais e internacionais, já publicou diversos livros sobre educação, trabalho infantil, violência contra a mulher e direitos humanos. Siga a colunista no Instagram.

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