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Augusto Nunes

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Suspeitos do Centrão é que mandam no Brasil

O governo é exercido, de fato, pela troica Rodrigo Maia, Davi Alcolumbre e Valdemar Costa Neto

Por José Nêumanne
Atualizado em 30 jul 2020, 19h44 - Publicado em 15 Maio 2019, 17h47

José Nêumanne (publicado no Estadão)

Nestes últimos dias, nossa insana República, proclamada num golpe militar por um marechal enfermo, tem dado exemplos em que cada um dos três Poderes atropela o princípio da autonomia, invadindo e deixando-se invadir, ao contrário do que previa o velho Montesquieu. Este ambiente de confusão e anarquia causa uma situação de anomia e desarmonia que debilita as instituições no que elas têm de mais relevante: as próprias prerrogativas.

O Executivo, sob comando de Jair Bolsonaro, tem sido a maior vítima desse estado anômalo de coisas, mas não deixou também de invadir seara alheia sem mostrar cerimônia nem pedir anuência do Legislativo ou do Judiciário. Ao dar, por exemplo, licença para matar a proprietários rurais a pretexto de evitarem invasões ilegais de suas terras, o chefe do governo transferiu para ruralista que se sentir agredido poderes de policial, dispensando-se de inquérito por homicídio, de promotor, declarando-se inimputável, de juiz, absolvendo-se, e de carrasco num país cujo ordenamento jurídico não prevê pena de morte.

Ao anunciar um pacote de flexibilização do porte de armas para 19 categorias profissionais, atendendo não a um clamor social, mas a reivindicações de campanha de uma elite com poder aquisitivo para adquiri-las, o mesmo Bolsonaro deu vazão a reclamações que podem levar a ações na Justiça.

Mas antes de tais processos serem julgados no ritmo de cágado de nossas ações judiciais, o Judiciário assumiu o papel de moderador, que era do imperador e na República se foi tornando uma espécie de herança fidalga para os togados de nosso Supremo Tribunal Federal (STF). A pretexto de suprir omissões do Congresso, o STF interfere em temas que não são de sua alçada, mas dos legisladores. Os 11 membros do “pretório excelso” chegam a absurdos extremos, como o de permitir o sacrifício de animais em rituais religiosos, em desumano desrespeito à vida dos irracionais. Com a devida vênia, a impiedosa decisão unânime renega os melhores instintos de quem se diz racional.

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Não se deve presumir desse exemplo que os legisladores não cometam o mesmo pecado. Nada disso. Fazem-no muitas vezes e em doses cavalares. Acabamos de ter fartos exemplos disso nos cinco meses e meio do exercício paralelo da nova administração federal e do início da atual legislatura. O citado ex-deputado Bolsonaro é legitimamente presidente da República, eleito por sufrágio de 57 milhões 796 mil e 986 votos no segundo turno. Parte dessa vitória deve ser atribuída à promessa que ele fez em campanha de reduzir o total de ministérios existentes. Tão logo foi empossado, encaminhou ao Congresso a Medida Provisória n.º 870/19 em cumprimento do compromisso.

A medida provisória (MP) foi adotada para evitar solução de continuidade nas trocas de governo que são frequentes nos regimes parlamentaristas. O Congresso constituinte no Brasil, que se encaminhava para a solução da chefia parlamentar de governo, teve de dar uma guinada de 180 graus para adaptar providências como essa ao presidencialismo, a que seu plenário foi levado a aderir por pressão do presidente de então, José Sarney. No presidencialismo de coalizão, adotado pela Carta de 1988, os presidentes passaram a legislar abusando das MPs, enquanto o Congresso, que pode aprová-las, rejeitá-las ou deixar que caduquem, recorre aos “jabutis”. Essa gíria define intromissões indevidas em seus textos.

Embora a Constituição não proíba tais truques, espera-se que presidentes e parlamentares consequentes obedeçam, no mínimo, à boa e velha lógica. Na democracia brasileira, em âmbito federal só o chefe do Executivo e os senadores são eleitos diretamente pelos cidadãos. Deputados federais são escolhidos pelo sistema proporcional, que possibilita distorções que ferem a aritmética e a representação legítima. Sua intromissão na gestão é nociva ao interesse público.

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Esgueirando-se por esses desvãos institucionais, parlamentares processados, denunciados, acusados e condenados por crimes de colarinho-branco em operações do Ministério Público, da Polícia Federal e da Justiça dão as cartas. Bolsonaro “dormiu no ponto” ao negligenciar a ação de legisladores que infringem leis que eles próprios aprovaram. Percebe-se a ação de uma quinta-coluna no Palácio do Planalto e em gabinetes de liderança do governo no Congresso. O chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, é suspeito de usar o mesmo caixa 2 que o ministro da Justiça, Sergio Moro, quer criminalizar. O senador Fernando Bezerra Coelho, descendente do primeiro capitão-mandatário da capitania de Pernambuco, ex-ministro de Dilma e denunciado por seis delatores da Odebrecht, é, na verdade, líder do Senado no governo.

Nada disso, contudo, elimina o absurdo da intromissão do Congresso ao desfazer não a vontade monocrática do presidente, mas o compromisso que ele assumiu com a cidadania para impedir o desmanche das operações de combate à corrupção e ao crime organizado. Ao devolver o Comitê de Controle das Atividades Financeiras (Coaf) da Justiça para a Economia, mesmo que não venha a ter o resultado esperado pelos artífices da manobra, e, sobretudo, ao impedir a colaboração entre a Receita e o Ministério Público na investigação de malversação do dinheiro público, o Legislativo não representa o cidadão. Mas o trai.

O governo é exercido, de fato, pela troica Rodrigo Maia, Davi Alcolumbre e Valdemar Costa Neto. O presidente da Câmara teve em outubro 74.232 votos (0,96% dos votos válidos) no Estado do Rio. O do Senado, que perdeu a eleição para governador do Amapá em 2018, conseguiu 131.695 (36,26% dos votos válidos) em 2014 para senador. Sem voto, Valdemar, condenado a sete anos de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no escândalo do mensalão petista, é a eminência parda do ominoso Centrão, que manda no País. Pode acreditar.

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