Rubens Ricupero: A arte da diplomacia é construir saídas honrosas
Autor de diversos livros, ele acaba de publicar “A diplomacia na construção do Brasil”

O convidado do Roda Viva desta segunda-feira foi Rubens Ricupero. Como diplomata, ministro de Estado e conselheiro de presidentes da República, ele foi testemunha ou protagonista de capítulos especialmente relevantes da história recente do Brasil. Autor de diversos livros, acaba de publicar “A diplomacia na construção do Brasil”, a mais completa reconstituição da trajetória da diplomacia brasileira entre 1750 e 2016. Confira trechos da entrevista:
“Caso tivesse que escolher apenas um momento para reviver seria, sem dúvida, a participação na implantação do Plano Real. Se busco dizer que minha vida foi justificada de alguma forma, foi sobretudo pela batalha para lançar aquela moeda e convencer a população de que ela daria certo. O Brasil já havia passado por sete planos econômicos fracassados e persuadir o povo a aceitar mais um exigia um trabalho quase de catequese. Talvez por isso o Itamar começou a me chamar de Sacerdote do Real”.
“Os Estados Unidos não executaram, mas com certeza foram os mandantes do golpe de 1964. Ainda falta escrever um livro sobre a participação dos americanos neste episódio”.
“A Dilma tem uma responsabilidade muito grande na crise econômica. Na época em que era ministro, o Antonio Palocci fez uma proposta muito interessante para diminuir o déficit do governo sem muitos sacrifícios. O crescimento da economia continuaria, mas num ritmo menor. A Dilma considerou a proposta rudimentar. Logo depois o Palocci caiu e ela e o Guido Mantega enveredaram por um caminho que acabou com a economia”.
“A prova da nossa insignificância é que o Donald Trump, que escreve uns 5 tweets por dia, não escreveu nenhum sobre o Brasil. Isso no fundo é bom, porque quando escreve acaba sendo sobre algo negativo para o país. Ele não lembrou do Brasil nem na época em que ele era candidato a candidato”.
“A diferença do Brasil para países como a Índia, a Rússia e o Paquistão é que temos uma imprensa moderna e investigativa e um conjunto pequeno de juízes e procuradores dispostos a fazer o seu trabalho”.
“A maior diferença entre o Lula e a Dilma é que ela não tinha o carisma do protagonista. A política externa do Lula se baseou muito na pessoa dele. O Lula não falava outras línguas, mas não se importava de usar a assessoria do Itamaraty. A Dilma se incomodava muito com isso”.
“A área que o governo Temer poderia se sair melhor hoje era com relação ao meio ambiente. As questões que mais repercutem no mundo são as ambientais, as sociais, de minorias. Se houvesse algo positivo acontecendo, o Itamaraty poderia usar isso para dizer que, embora existissem problemas em outros setores, nesses estávamos fazendo um excelente trabalho. Mas é justamente o oposto”.
“O problema não é ser político, é ser qualificado. A maioria dos nossos políticos não tem qualificação nenhuma. Eles são muito provincianos”.
“O segredo da diplomacia é construir saídas honrosas. Para Nicolás Maduro, seria desistir do projeto de perpetuação no poder e arquitetar com a oposição uma maneira constitucional para a transferência do cargo”.
“Se esse sistema político que existe hoje no país não terminar com uma auto-reforma, acabará com uma ruptura. Mas vejo uma ruptura mais parecida com a Revolução de 30 do que com um golpe militar”.
“A proibição das coligações em eleições proporcionais deveria valer para o ano que vem. Não vejo motivos para isso não acontecer. É uma vergonha. O que os parlamentares fizeram é permitir que no ano que vem eles continuem pecando”.
“A maior ameaça a curto prazo é a questão dos Estados Unidos com a Coreia do Norte e o Irã. Curiosamente, com relação à China e à Rússia Trump está sendo bastante moderado. A longo prazo, sem dúvida é o aquecimento global. E nem tão longo assim, porque já sentindo os efeitos, principalmente no Nordeste”.
“Faz sentido o Brasil ter um regime em que todos os brasileiros com 18 anos precisam se apresentar para o serviço militar? Seria muito melhor ter Forças Armadas menores e com armas de última geração. Uma Força compacta, bem treinada, com capacidade de deslocamento. Mas este é o mesmo problema que existe no Itamaraty. Ninguém quer cortar na carne. Eles não querem diminuir o número de embaixadores e as Forças Armadas não querem diminuir o de oficiais”.
“Mesmo com a morosidade da reforma política, não tenho dúvida de que a Lava Jato fará o país sair melhor em matéria de corrupção”.
A bancada de entrevistadores reuniu os jornalistas Duda Teixeira (VEJA), Adriana Ferraz (Estadão), Flávio Freire (Globo), Monica Gugliano (Valor) e Patrícia Campos Mello (Folha). Com desenhos em tempo real do cartunista Paulo Caruso, o programa foi transmitido pela TV Cultura.