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O pesadelo dura 4 minutos – Estudo mostra que este é o tempo máximo de duração de um arrastão num restaurante de São Paulo

BRANCA NUNES Quatro minutos correspondem a metade do tempo que a luz solar demora para chegar à Terra. É o tempo que um adulto leva para andar três quadras, ou para ir da Estação da Luz à estação Paulista do metrô de São Paulo. Quatro minutos bastam para ferver meio litro de água, preparar um […]

Por Augusto Nunes Atualizado em 31 jul 2020, 05h17 - Publicado em 30 set 2013, 17h03

BRANCA NUNES

Quatro minutos correspondem a metade do tempo que a luz solar demora para chegar à Terra. É o tempo que um adulto leva para andar três quadras, ou para ir da Estação da Luz à estação Paulista do metrô de São Paulo. Quatro minutos bastam para ferver meio litro de água, preparar um ovo poché ou uma pipoca de microondas. E é esse também o tempo máximo de duração de um arrastão num bar, restaurante ou casa noturna de São Paulo.

“Os criminosos descobriram que este é um limite seguro entre a entrada e saída do local antes da chegada da polícia”, explica Ricardo Chilelli, diretor-presidente da RCI First – Security and Intelligence Advising, empresa especializada em análise e gestão de risco que atua em 18 países, entre eles o Brasil. A conclusão foi extraída da análise de 122 arrastões ocorridos na capital paulista.

Em 27 de maio de 2012, por exemplo, os criminosos levaram 3 minutos para roubar os clientes da Pizzaria Bráz, em Higienópolis. Em 30 de maio de 2013, a ação no restaurante Ruella durou menos de 5 minutos. E foi assim no kaminari (4 minutos), no Empório Alto de Pinheiros (1 minuto e 30 segundos), na Pizzaria Emiglia (4 minutos) e, no dia 15 de setembro, um domingo, no restaurante Astolpho. Exatos 4 minutos. A polícia demorou o dobro para chegar ao local.

“Passei o modelo, a cor e a placa do veículo para a polícia enquanto o arrastão ainda estava acontecendo”, conta Hélio Saraiva Júnior, dono do Astolpho. Ele percebeu o que se passava logo depois de chegar em casa, ao checar pela última vez antes de dormir o sistema de segurança, usando um programa que permite acessar pelo celular as câmeras de vigilância do restaurante. “A polícia disse em todas as entrevistas que vai investigar por que as viaturas demoraram tanto para aparecer, mas até agora ninguém me ligou. O poder público é omisso”.

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O arrastão no Astolpho exibiu outras características que, segundo o estudo da RCI, obedecem a um padrão nesse tipo de crime. Na escolha do alvo, os criminosos evitam locais com iluminação externa e pública abundante, muitas câmeras do lado de fora e sem rotas de fuga facilmente acessíveis. Paredes envidraçadas, serviço de valet, segurança na porta, outros restaurantes e bares nas proximidades e mesas na calçada são outros fatores que costumam afugentar os criminosos. Mas mesmo estabelecimentos com tais características já sofreram ataques. Quase todos, por exemplo, oferecem serviço de valet. O Astolpho tem portas e paredes de vidro, o Ruella é provido de câmeras externas e há mesas na calçada do Empório.

Vítima de um arrastão em 2011 na Pizzaria Emiglia, no Jardim Paulistano, o comerciante Rogério Inati passou a escolher os restaurantes com base nesses detalhes. “Hoje só vou a lugares envidraçados”, diz. “Um amigo que é dono de restaurante me contou que os criminosos evitam lugares expostos”. A mãe e a irmã de Inati, também presentes no dia do assalto, são mais radicais: “Elas ficaram realmente traumatizadas e agora só frequentam restaurantes dentro de shoppings”.

No dia do arrastão, Inati e a família ocupavam uma mesa perto da porta de entrada ─ lugar que, segundo o estudo da RCI, não escapou dos assaltantes em 93% dos arrastões. “Como os criminosos têm pouco tempo para agir, abordaram no máximo 15 mesas em 92% dos casos”, informa Chilelli. “As vítimas invariavelmente estavam sentadas próximo à entrada, perto do caixa, ou no caminho entre a entrada e o caixa”.

O levantamento também constatou que 88% dos arrastões foram cometidos por grupos de três criminosos – um cuidou do caixa, outro abordou os clientes e o terceiro permaneceu num veículo do lado de fora. Em 75% dos casos, os bandidos não pareceram preocupados com as câmeras internas nem procuraram esconder o rosto e agiram depois das 21h. Em 89%, uma moto deu apoio logístico com o monitoramento das ruas mais próximas.

Em praticamente todos os arrastões os bandidos levaram pacotes de cigarro, dinheiro, computadores e tablets dos estabelecimentos. Dos clientes, foram roubados carteiras, bolsas pequenas, notebooks, celulares, joias, relógios, alianças e dinheiro.

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Nada é mais preocupante para Chilelli do que a progressiva substituição de pistolas e revólveres por fuzis e submetralhadoras. “Isso mostra que algumas quadrilhas estão migrando de outros crimes, como arrastões a condomínios de luxo e assalto a caixas eletrônicos para os arrastões a bares e restaurantes”, explica o especialista.

Entre as dicas de segurança, Chilelli sugere que sejam feitos acordos de cooperação entre restaurantes e bares próximos: instalação de “botões de pânico” – espécie de alarme que avisa os vizinhos sobre os assaltos, facilitando a chamada da polícia – e a contratação de “seguranças velados”, incumbidos de monitorar estabelecimentos comerciais à distância.

Saraiva Júnior optou por contratar um segurança particular que disponha de uma moto potente. “Acho que vou conseguir pelo menos reaver alguns itens roubados”, acredita o empresário, que atua no ramo há 31 anos e já teve 27 casas em São Paulo. “Mas é uma afronta ter que pagar para ter segurança privada”, ressalva.

Alguns donos de bares e restaurantes da Rua Jannarelli, no Morumbi, foram além da segurança privada: contrataram agentes de segurança pública. Há mais de três anos, cada proprietário paga cerca de R$ 1.400 mensais para contar com a proteção de policiais militares, além de R$ 300 a R$ 1.500 para policiais civis. “No dia em que sofremos o segundo arrastão, dois policiais civis entraram aqui 15 minutos depois da saída dos bandidos oferecendo o serviço”, contou um dono de restaurante da região. “Desde então, só os estabelecimentos que não colaboram com a ‘caixinha” são assaltados”.

Procurada pela reportagem, a PM afirmou que levará a denúncia ao conhecimento da corregedoria do órgão. “Se os policiais prestam esse tipo de serviço durante a folga, é transgressão. Se for no horário de serviço, é crime”, afirmou o capitão Eder Antonio de Araújo, porta-voz do centro de comunicação social da instituição.

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Há menos de três meses, a PM desencadeou a Operação São Lourenço. Assim denominada em homenagem ao padroeiro dos donos de bares e restaurantes, a ação pretende coibir esse tipo de crime com o reforço do policiamento em três bairros: Itaim, Moema e Jardins.

Embora garanta que esse tipo de ocorrência esteja “próximo do zero” desde o começo dessa operação, a PM não sabe “precisar os números”. Uma das causas da carência de estatísticas confiáveis é a maneira de catalogar tais crimes. “Pelos nossos registros e tratamento técnico legal, trata-se de ocorrência de roubo a estabelecimento comercial”, explica o coronel Leonardo Torres Ribeiro, do Comando de Policiamento da Capital (Copom). “O emprego do termo arrastão tem promovido um alarde na população, que muitas vezes não tem a dimensão divulgada”, imagina o coronel. “Quanto menos se fala, menos acontece”.

Com isso, os arrastões são enfiados no mesmo balaio que abriga qualquer tipo de assalto a bares e restaurantes, estejam ou não em horário de atendimento a clientes. Outro fator que acaba maquiando dados: nem todas as vítimas se deslocam até a delegacia para fazer o Boletim de Ocorrência. Essas distorções ajudam a entender porque, embora a polícia continue agarrada a zeros imaginários, a população concorde com o diagnóstico feito por Hélio Saraiva Júnior ao ver na tela do celular as cenas daquele 15 de setembro: o Estado é omisso.


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Dicas para os comerciantes

► Fazer acordos de cooperação entre bares e restaurantes nas proximidades: instalação de “botões de pânico” – espécie de alarme que avisa os vizinhos sobre os assaltos, facilitando a chamada da polícia – e a contratação de “seguranças velados”, responsáveis por monitorar os estabelecimentos à distância

► Reivindicar iluminação pública

► Disponibilizar iluminação abundante na fachada

► Optar por portas, janelas e paredes de vidro

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► Colocar câmeras de segurança externas ostensivas

► Instalar o caixa longe da porta de entrada

► Ter o número mínimo de pacotes de cigarro e a menor quantia em dinheiro disponível no caixa

Dicas para os clientes

► Preferir estabelecimentos com bastante movimento na rua, próximos a outros bares e restaurantes, longe de grandes avenidas e com serviço de valet (mesmo que não forem utilizar)

► Sentar longe da porta, do caixa e do trajeto entre os dois

► Mulheres devem colocar bolsas e mochilas embaixo da mesa e, se possível, carregar carteiras ou bolsas menores sem objetos de valor para deixar à vista. Preferir bijuterias a joias

► Homens devem carregar carteiras falsas com pouco ou nenhum dinheiro e cartões sem validade

Como agir durante um arrastão

► Deixar as duas mãos sobre a mesa ou em local visível

► Não fazer movimentos bruscos

► Jamais olhar os criminosos nos olhos

► Nunca iniciar uma conversa com os bandidos

► Responder de maneira sucinta o que for perguntado

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