Manifesto do PT suspende o massacre da concordância verbal
Intelectuais do PT seguem o conselho da coluna e reescrevem o besteirol que torturava o idioma
“Intelectuais do PT informam: o povo perderam“, avisou o título do artigo aqui publicado em 3 de março, sobre o manifesto, cujo primeiro signatário é Leonardo Boff, que implora ao chefe supremo que antecipe a entrada na disputa presidencial de 2018. “Por que Lula?”, pergunta a abertura do documento. E por que submeter o pobre português a tão selvagem sessão de torturas já no primeiro parágrafo?, retrucou esta coluna, que procurou socorrer a vítima inserindo na reprodução do trecho criminoso cinco correções entre parênteses e em negrito. Vale a pena ler de novo:
“É o compromisso com o Estado Democrático de Direito, com a defesa da soberania brasileira e de todos os direitos já conquistados pelo povo desse (Errado; o certo é ‘deste’) País, que (Alguém infiltrou uma vírgula bêbada entre ‘País’ e ‘que’) nos faz, através desse (É errado o uso de ‘através desse’; o certo é ‘por meio deste’) documento, solicitar ao ex-Presidente Luiz Inácio LULA da Silva que considere a possibilidade de, desde já, lançar a sua candidatura à Presidência da República no próximo ano (A candidatura deve ser lançada desde já ou no próximo ano?), como forma de garantir ao povo brasileiro a dignidade, o orgulho e a autonomia que perderam”. (Quem ‘perderam’? O povo? Então o certo seria ‘perder’).
Como o PT prometeu recomeçar a coleta de assinaturas nesta segunda-feira, dia 6, o texto aconselhou os redatores do besteirol a suspenderem a pancadaria imposta ao idioma em geral e à concordância verbal em particular. Foi o que ocorreu nesta terça-feira, demonstra a nova versão do parágrafo impiedoso. Com quatro dias de atraso, sumiram os erros denunciados pela coluna. Confiram:
“É o compromisso com o Estado Democrático de Direito, com a defesa da soberania brasileira e com os direitos já conquistados pelo povo deste País que nos faz solicitar ao ex-Presidente Luiz Inácio LULA da Silva que considere a possibilidade de lançar imediatamente sua pré-candidatura à Presidência da República, como forma de restituir ao povo brasileiro a autoestima e a autonomia perdidas”.
“Restituir ao povo brasileiro a autoestima e a autonomia perdidas” não deixa de ser uma redundância: só se restitui a alguém algo que esse alguém perdeu. Mas é bem menos indigente do que “garantir ao povo brasileiro a dignidade, o orgulho e a autonomia que perderam”. E recomenda silêncio os linguistas de jardim de infância que, durante quatro dias, rondaram a coluna recitando a cretinice resumida no comentário de um certo Afonso Celso Figueiredo: “No afã de desqualificar o PT e seus ‘intelectuais’ o autor dessa matéria atropela a língua portuguesa ignorando o que é SILEPSE de número”.
A professora Vania Maria do Nascimento Duarte explica em dilmês erudito o que é esse palavrão:
“Postula-se como característica marcante do termo “concordância”, o fato de o verbo concordar com o termo expresso (quase sempre com o substantivo). Contudo, em se tratando da concordância ideológica ou irregular, esta mesma concordância se efetiva com a ideia expressa – ocorrência linguística a qual se atribui à silepse, como pontuado anteriormente. Aparentemente, ela denota certa estranheza aos olhos do emissor, mas a verdade é que por pertencer a uma figura de linguagem, o não convencionalismo, sem sombra de dúvidas, revela sua palavra de ordem. Assim sendo, o sentido lógico, formal, cede lugar àquele referente ao instinto intencional do autor, cujo objetivo é nada mais nada menos que o de realçar a mensagem”.
Em língua de gente, a professora está dizendo que agora é certo escrever ou dizer o que sempre foi errado. Por exemplo: “a multidão vaiaram Dilma”. Ou “o bando do Petrolão agiram sob a chefia de Lula”. Ou, ainda, “a patrulha da linguística comprovam que os idiotas estão por toda parte”. Sem saber que os próprios redatores se renderam aos fatos, o companheiro Alexandre Spinelli acaba de desembarcar na área de comentários com o seguinte berreiro: É Silepse de Número! Vamos estudar a Língua Portuguesa, pelo amor de Deus ao invés de concordar com tudo que se lê! Viramos marionetes?”
Spinelli deveria ter colocado uma vírgula entre Deus e ao invés ─ e substituído ao invés de por em vez de. Além de endossar os erros do manifesto, ele ampliou as agressões à língua oficial do Brasil. É mais um filhote da raça dos sabujos de nascença.