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Augusto Nunes

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A tchutchuca e o tigrão

Como disse Cervantes, “Todos os homens são como Deus os fez, mas alguns são ainda piores”

Por Deonísio da Silva
Atualizado em 4 jun 2024, 16h37 - Publicado em 7 abr 2019, 11h21

Deonísio da Silva

Eles se chamam de Vossa Excelência, mas o ministro Paulo Guedes, Doutor pela Universidade de Chicago e professor universitário, mereceu de alguns deles o tratamento de tchutchuca e de tigrão.

As palavras tchutchuca e tigrão entraram há pouco para a língua portuguesa. O Dicionário Aulete diz da primeira: “Moça ou mulher bonita, de corpo bem-feito, meiga e carinhosa: Vem tchutchuca linda / Senta aqui com seu pretinho / Vou te pegar no colo / E fazer muito carinho…” (Bonde do Tigrão, Tchutchuca). O lexicócrafo tomou, porém, o cuidado de não abonar o significado de mulher objeto que a palavra tem no dialeto do funk.  De tigrão diz o mesmo Aulete: “Homem jovem, másculo, forte, conquistador e um tanto violento”.

Mas por que os deputados estavam tão irritados? Por não terem o conhecimento que o ministro demonstrou sobre o tema em pauta? Não! Os motivos certamente são outros.

Nenhum deles está ali por imposição de ditadura nenhuma: foram eleitos pelo povo, de onde emana todo o poder. A Constituição assegura logo no Art. 1º, Parágrafo único: “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição“. O povo escolhe quem lhe apraz, seja canela ou sassafrás. Todavia parlamentares de alta qualificação e vida impoluta convivem com pares ignaros, sobre os quais pesam prontuários de bandidos, sendo, pois, necessário tomar cautelas e providências.

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Se o povo tivesse dispensado desta vez os representantes e exercido diretamente o poder, talvez o tratamento tivesse sido mais cortês. De resto, quem chamasse alguém de tchutchuca ou de tigrão para ofender não sairia de lombo liso, pois o brasileiro médio não leva desaforo para casa. Aliás, nem para o foro: prefere resolver nas vias de fato, eufemismo para o costume de dar porrada e resolver no braço.

Como se comportaria o povo diante de Suas Excelências quando se desse conta de que seus representantes se aposentam com salários de R$ 28 mil mensais em média e que um funcionário da Câmara Federal, ainda no primeiro mês de trabalho, ganha mais do que um professor doutor, um general, um almirante, um brigadeiro, um reitor, um dirigente universitário, um diretor de redação, um médico, um engenheiro etc.?

Partir para a ignorância, outro eufemismo para o método de tapas, socos e empurrões, não é uma boa opção. Ainda mais diante de um ministro que estudou numa universidade de prestígio cujo lema é a expressão em latim crescat scientia, vita excolatur. A tradução pode ser: cresça o conhecimento, a vida está melhorando. Por analogia, se a ignorância aumenta, a vida piora.

Defensor intransigente dos parlamentos, ainda quando integrado por deputados malcriados ou mal-educados, este professor e escritor acha que o ministro não poderia, entretanto, invocar a mãe e a avó de um de seus ofensores na réplica.

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A mãe do parlamentar apaixonou-se, casou-se e teve um filho com o pai dele sem saber a identidade do amado, que somente se revelou quem era quando saiu a anistia. E a avó, pobrezinha, que culpa tem? Portanto, tiremos as mães do meio!

Contudo, no calor da hora, seu ofensor teve sorte de não ouvir coisa ainda pior. Como disse Cervantes, “Todos os homens são como Deus os fez, mas alguns são ainda piores”.

*Deonísio da Silva
Diretor do Instituto da Palavra & Professor
Titular Visitante da Universidade Estácio de Sá
https://portal.estacio.br/instituto-da-palavra

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