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Augusto Nunes

Por Coluna
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‘Pela honra do mandatário’, um artigo de Mario Vargas Llosa

PUBLICADO NO ESTADÃO DESTE DOMINGO MARIO VARGAS LLOSA O presidente do Equador, Rafael Correa, ganhou uma importante batalha legal contra a liberdade de imprensa em seu país, e deu mais um passo para transformar o seu governo em um regime autoritário. A Corte Nacional de Justiça, a máxima instância da magistratura, condenou o jornal El […]

Por Augusto Nunes
Atualizado em 31 jul 2020, 09h23 - Publicado em 6 mar 2012, 11h10

PUBLICADO NO ESTADÃO DESTE DOMINGO

MARIO VARGAS LLOSA

O presidente do Equador, Rafael Correa, ganhou uma importante batalha legal contra a liberdade de imprensa em seu país, e deu mais um passo para transformar o seu governo em um regime autoritário. A Corte Nacional de Justiça, a máxima instância da magistratura, condenou o jornal El Universo, decano da imprensa equatoriana com mais de 90 anos de existência, por injúrias ao presidente, com uma sentença extremamente severa: US$ 40 milhões e 3 anos de cadeia para os principais responsáveis do diário, os irmãos Carlos, César e Nicolás Pérez. (Correa depois “perdoou” a multa e pediu a anulação da sentença.)

O processo se iniciou há pouco menos de um ano, em razão de um artigo do jornalista Emilio Palacio, que, comentando a atuação de Correa numa confusa rebelião da polícia, em setembro de 2010, na qual acabou envolvido, afirmava: “O ditador deveria lembrar, por fim, e isto é muito importante, que com o indulto, no futuro, um novo presidente, talvez inimigo seu, poderia levá-lo perante um tribunal penal por ter ordenado que se disparasse e sem aviso prévio contra um hospital cheio de civis e gente inocente”. Correa considerou a frase lesiva à sua honra.

Comemorando a decisão do Tribunal, enquanto seus partidários queimavam na rua exemplares do diário incriminado, o chefe de Estado do Equador disse que, com a sentença, haviam sido alcançados três objetivos: “provar que El Universo mentiu e é possível julgar, não os palhaços, mas os donos do circo, além de mostrar que cidadãos podem reagir aos abusos da imprensa”.

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Ele não disse se estava satisfeito por sua honra ter sido reparada, e por uma razão muito simples: porque agora, precisamente, essa honra ─ aliás do seu nome e do seu governo ─ está sendo desprestigiada internacionalmente por uma operação judicial que toda a imprensa livre do mundo, as organizações de jornalistas, dos direitos humanos e partidos e governos democráticos consideram um atropelo cínico e exorbitante da liberdade de expressão. Levando em conta que esse atropelo não é o primeiro nem será o último, essa operação traz com consequências trágicas para o seu país.

Nem é preciso dizer que a sentença da Corte Nacional de Justiça do Equador coloca uma espada de Dâmocles sobre todos os meios de comunicação e os adversários do governo, advertindo-os de que qualquer crítica ao poder poderá acarretar represálias.

A intimidação e a ameaça de instalar a autocensura no mundo da informação, obrigando jornalistas e formadores de opinião a se tornarem censores de si mesmos e a escrever olhando furtivamente ao seu redor, é um método que todos os ditadores modernos praticam.

O exemplo mais conspícuo na América Latina, depois do caso óbvio de Cuba, é o do comandante Hugo Chávez, da Venezuela, seguido por sua aluna exemplar, a argentina Cristina Kirchner ─ mais hipócrita, mas mais efetiva do que o da anacrônica censura prévia ou o mero fechamento policial de meios de comunicação indomesticáveis.

O desaparecimento de um jornalismo livre e sua substituição por uma mídia neutralizada e incapaz de exercer a crítica é o sonho, também, das pseudodemocracias demagógicas e devastadas pelo populismo.

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Na verdade, quando começou a se destacar, em abril de 2005, em plena crise constitucional, Correa, economista católico, com títulos pelas Universidade de Lovaina e de Illinois e uma brilhante carreira acadêmica, inspirou muitas esperanças. Aparentemente movido por sentimentos generosos e idealistas, acreditava-se que fortaleceria as instituições democráticas, a justiça social e a modernização do Equador.

Foi exatamente o contrário. Intoxicado pelo poder e pela obsessão continuísta, peão dos delírios socialistas e bolivarianos do comandante Chávez, Correa, com suas políticas de curto prazo, irresponsabilidade fiscal e corrupção multiplicada, empobreceu e confundiu a sociedade equatoriana, irritando-a e exasperando-a. Por isso, sua impopularidade foi crescendo de maneira sistemática nos últimos tempos.

Esse é o contexto que explica os golpes desesperados contra a liberdade de expressão nos últimos meses.

Dito isso, ninguém pode negar que o jornalismo, tanto no Equador quanto no restante da América Latina, está longe de ser sempre um exemplo de probidade, moderação e objetividade. Evidentemente, às vezes sucumbe ao sensacionalismo, ao exagero, à injúria e ao libelo, e por outro lado, um sistema judicial probo e independente deveria amparar os cidadãos contra esses excessos. Mas a decapitação não é o remédio mais adequado contra a dor de cabeça.

A sanção a El Universo pela Corte Nacional escandaliza, entre outras coisas, por sua desproporção com a suposta ofensa e o caráter exorbitante com que se destaca. É a melhor demonstração de que sua finalidade não é corrigir os erros de que tenha sido vítima uma pessoa. É um ato político, que pretende acabar de vez com todos os pilares da democracia.

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De todo modo, foi uma vitória de Pirro de Rafael Correa. O caso serviu para mostrar, por um lado, como são pouco confiáveis os tribunais equatorianos em matéria de justiça, mancomunados como estão com os que controlam o poder político, e, por outro, a coragem e a coerência dos donos e dos jornalistas do Universo e dos inúmeros colegas equatorianos que se solidarizaram com eles. Os desenfreados esforços do governo para dividi-los e quebrá-los foram inúteis. Todos se uniram à sua luta: empresários, jornalistas, funcionários e gráficos, defendendo com magnífica coerência sua posição independente. Por seu lado, Correa converte-se num vulto indefinido, meio esmaecido, entre o tumulto dos pequenos caudilhos e dos “politicastros” que fazem parte da pior tradição da América Latina. / TRADUÇÃO ANNA CAPOVILLA

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