E o que vem depois da eleição?
A popularidade de Bolsonaro será decisiva para a sucessão de 2022
O dado óbvio a olhar daqui por diante, definido o quadro municipal, serão as pesquisas de popularidade do presidente da República. Não há como imaginar a sucessão de 2022 sem esse eixo de organização do pensamento. E sem base orgânica, o chefe do governo depende disso mais do que o normal. A outra variável? Como os partidos resolverão o dilema entre a necessidade de fazer bancadas de deputados e a vontade de ter candidaturas à Presidência.
O sistema partidário brasileiro funciona de modo peculiar. Talvez seja caso único no mundo em que uma constelação de legendas, nenhuma com massa crítica para construir a sua hegemonia, migra da órbita de um personagem político para outro, e sempre submetidas à força gravitacional do poder. E depois das eleições submetem o poder à força gravitacional delas quando se reúnem no Congresso Nacional.
No campo governista, dos partidos que concordam no essencial com a agenda do Palácio do Planalto, é razoável supor que, se Jair Bolsonaro chegar a 2022 competitivo nas simulações eleitorais, terá alguma possibilidade de atrair boa parte das agremiações que se deram bem nacionalmente nesta eleição municipal, também e principalmente pelo acesso privilegiado de seus parlamentares ao Orçamento Geral da União.
Aliás, mesmo que o presidente esteja enfraquecido, essas legendas poderão aliar-se a ele para garantir as posições na máquina durante o período eleitoral e, conforme o andar da carruagem, cristianizá-lo na campanha. Não chegaria a ser novidade. Esse poder de barganha dos partidos anda meio relativizado desde que o horário eleitoral no rádio e TV não se mostra tão vital assim, mas continua sendo uma variável a considerar com seriedade. Inclusive porque cada partido que você atrai é menos um para engrossar as fileiras da concorrência.
“Se o presidente estiver competitivo, é razoável a chance de atrair os que se deram bem na disputa municipal”
A principal luta de Jair Bolsonaro nos ensaios para 2022, sabe-se, deve ser contra os que o apoiaram em 2018 mas preferem uma alternativa própria. E os segundos turnos municipais mostram que essa facção tem uma vantagem na disputa da pole position antibolsonarista. Tem mais facilidade para receber o voto maciço da esquerda do que quando precisa retribuir.
Para a esquerda, a equação apresenta mais variáveis em aberto. Diferentemente da miríade das legendas da direita, ela precisa se preocupar seriamente com o atingimento da cláusula de desempenho na eleição para a Câmara dos Deputados. E, também ao contrário do campo oposto, chegará a 2022 sem o controle da máquina federal e desidratada de máquinas na maior parte do país. Qual será então a melhor fórmula para ela?
Uma possibilidade é buscar desde logo a convergência para lançar candidaturas majoritárias competitivas e ancorar os diversos partidos nesses projetos mais robustos. Ou vai ser o cada um por si, como foi na maioria das disputas municipais? É uma dúvida cruel. E os números finais deste novembro eleitoral precisarão ser analisados com lupa por quem, daqui a dois anos, terá como principal desafio não cair para a Série B da política.
Publicado em VEJA de 2 de dezembro de 2020, edição nº 2715