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VEJA na Antártica: o navio polar e a viagem até o extremo sul

Às vésperas da reinauguração da Estação Antártica Comandante Ferraz, do Brasil, a reportagem participou de expedição à Península Antártica

Por Jennifer Ann Thomas Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 13 jan 2020, 10h50 - Publicado em 13 jan 2020, 10h03

No dia 6 de janeiro, às 16h05, foi registrado no Livro Histórico do Navio Polar Almirante Maximiano a saída da embarcação do porto de Punta Arenas, no Chile, em direção à Estação Antártica Comandante Ferraz, que será reinaugurada no próximo dia 14, na Península Antártica. Entre aquela data e o dia 11, o Tio Max – como é carinhosamente chamado pela tripulação – abrigou os 109 integrantes de uma das expedições que fazem parte da 38ª Operação Antártica, entre civis (como os jornalistas) e militares, responsáveis por toda a logística de transporte e segurança. Muito mais do que um meio de transporte, o Tio Max é a base para 40% das pesquisas científicas realizadas pelo Programa Antártico Brasileiro (Proantar) e é a principal plataforma de oceanografia. 

Seja de farda ou calça jeans, a rotina segue os parâmetros militares. Todos os dias às 7h é realizado o toque de Alvorada – para os leigos, uma espécie de despertador coletivo. Depois de anunciar o “Bom dia, Tio Max!”, uma música faz a transição para a voz de um locutor que lê as principais notícias do dia. Em alto-mar, completamente desconectados, qualquer informação é válida para se ter alguma noção sobre o que está acontecendo no Brasil e no mundo. 

No primeiro dia, a trilha sonora escolhida para embalar o início da aventura foi a música Descobridor dos Sete Mares, de Tim Maia. Coincidência, será? Para um marujo de primeira viagem, a recepção pode fazer todo o sentido: “Pois bem, cheguei/ Quero ficar bem à vontade/ Na verdade eu sou assim/ Descobridor dos sete mares/ Navegar eu quero”. 

Depois de um dia de navegação, a paisagem começou a mudar. O navio percorreu os canais austrais na região da Patagônia Chilena. A embarcação contornou o Parque Nacional Alberto de Agostini, onde sentiu as primeiras ondas do Oceano Pacífico, e seguiu em direção ao Ushuaia. Nos quilômetros finais antes da terra conhecida como “o fim do mundo”, por ser a cidade mais ao sul do planeta, montanhas com geleiras, picos nevados e pequenos pedaços de gelo passaram a compor o horizonte. Gaivotas voaram ao redor em busca de peixes no mar e focas apareceram e desapareceram em rápidos mergulhos à distância. 

Ao mesmo tempo em que a ansiedade predominou para que o trajeto fosse percorrido o mais rápido possível e que se chegasse logo à Antártica, o grande objetivo da expedição, a proximidade com o Estreito de Drake começou a se tornar cada vez mais um motivo de preocupação. A região é conhecida por ter o pior mar do mundo, onde as águas do Pacífico e do Atlântico se encontram e formam ondas gigantes. Na nossa chegada ao fim dos canais chilenos, no dia 7, o comandante do navio, o capitão de Mar e Guerra João Candido Marques Dias, decidiu esperar 24 horas na cidade de Puerto Williams, no Chile. As previsões indicaram que, caso seguíssemos, enfrentaríamos ondas com mais de 5 metros. Ao fim das primeiras 24 horas, a decisão foi por aguardar, de novo, por mais 6 horas. 

Infraestrutura e apoio à ciência

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O navio tem quatro laboratórios e dezessete equipamentos de pesquisa, como um guincho com capacidade para coletar amostras de água e de sedimentos do fundo do mar a até 8 mil metros (na região Antártica, a média de profundidade é de 4 500 metros), instrumentos que medem a profundidade do oceano e sistemas para analisar as correntes marítimas. A depender da equipe embarcada, a trajetória segue o lema: “navegando e pesquisando”. 

Para o biólogo Luiz Henrique Rosa, coordenador do projeto MycoAntar, que estuda a microbiologia antártica na Universidade Federal de Minas Gerais, onde mantém o maior acervo de fungos antárticos no Brasil, o Max foi e é fundamental para a microbiologia. Em expedições à Antártica desde 2006, Rosa e uma colega foram os primeiros a montar e usar os laboratórios do navio, entre 2009 e 2010.

“O Max é um excelente apoio à pesquisa. A oceanografia abrange projetos de diversas áreas, como climatologia e geologia. Coletei amostras dos extremos por onde o Max tem a capacidade para navegar. Ao trabalhar com neve, por exemplo, não há como levar a amostra para o Brasil. Coletei e processei diretamente no Max”, explicou. Rosa manteve uma rotina ativa na embarcação: navegava, descia em um ponto, coletava amostras e as processava antes de chegar ao Brasil. O pesquisador trabalhou com amostras de neve, gelo, plantas, solo, sedimento marinho, entre outros materiais. 

Além do apoio às pesquisas, a cada navegação é feito o mapeamento da rota para a cartografia Antártica, região que ainda carece de coleta de dados. Os resultados são compartilhados com a comunidade científica internacional para que, constantemente, a carta náutica – o mapa da região – seja atualizada com informações mais precisas. As principais áreas de pesquisa no Tio Max são de meteorologia, oceanografia, geologia e geofísica. 

A tripulação embarcou no navio em outubro de 2019 e desembarcará apenas em abril deste ano – no total, serão sete meses em dedicação exclusiva à vida no mar. Para manter uma rotina saudável, o navio tem duas salas com aparelhos de ginástica, uma pequena biblioteca, sala com televisão, barbearia e um cyber café (com internet limitada) com dois computadores. Apesar de ser uma embarcação militar, o Tio Max não é um navio com armamento. Se estivesse em uma guerra, sua função seria a de um navio hospital. Ele tem autonomia para 50 dias no mar e navega apenas em gelo estratificado. Ou seja, não é um quebra-gelo. 

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Para fazer qualquer pesquisa, os cientistas precisam esperar até que o navio esteja a 200 milhas da costa do Chile. Trata-se de uma questão de reciprocidade. O Brasil cobra que navios com outras bandeiras tenham um oficial brasileiro embarcado para fazer pesquisas em águas brasileiras. Portanto, os militares agem da mesma forma quando estão no mar chileno. 

O “centro nervoso” do navio fica no Passadiço. É a sala de comando que reúne todos os sistemas operacionais, com exceção da parte de máquinas. Radares, navegação eletrônica, posicionamento dinâmico, monitoramento e a constante atenção para a necessidade de novos comandos que melhorem a coordenação do navio. 

Enquanto isso, o centro de controle de máquinas é o coração. Se ele parar, a embarcação também para. Os maquinários produzem energia, ar comprimido para os tanques de mergulho e água doce para o abastecimento interno. São três geradores de energia, sendo que cada um poderia atender uma cidade de 4 000 a 5 000 habitantes.

Também há três dessalinizadores de água por osmose reversa. Todavia, os equipamentos são para temperaturas entre 25ºC a 26ºC, enquanto a água na região Antártica oscila entre 0ºc e -1ºC. Por isso, é necessário esquentar a água antes da dessalinização. A produção diária gira em torno de 35 a 40 toneladas de água, enquanto o consumo da embarcação é de 10 a 13 toneladas por dia.

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