“Mulheres aprendem a não se mostrarem seguras e determinadas”
Segundo a psicóloga Catherine Steiner-Adair, no Brasil para evento da 'Graded School', ainda há muitos desafios educionais para fazer das meninas, líderes
Enquanto realizava seu doutorado em Harvard, a psicóloga americana Catherine Steiner-Adair trabalhou como consultora em um dos mais renomados colégios internos dos Estados Unidos. Ela conta que, apesar de estudarem em uma das melhores escolas do país, a maioria das adolescentes com quem conversou não parecia muito confiante. “Elas não diziam que estavam tristes porque tiraram notas baixas ou porque suas colegas estavam sendo más com elas. Elas falavam que estavam tristes porque eram gordas demais”, diz.
Pensando nisso, a pesquisadora decidiu investigar como fatores culturais influenciavam a imagem que aquelas meninas construíam de si mesmas. Assim nasceu seu mais recente livro, Full of Ourselves: A Wellness Program to Advance Girl Power, Health, and Leadership (Cheio de si: Um Programa de Bem-estar para Desenvolver o Poder, Saúde e Liderança Femininas, ainda sem edição no Brasil), um guia para transformar jovens mulheres em grandes líderes e aumentar sua autoestima, protegendo-as de distúrbios alimentares. Na ocasião do Dia Internacional da Mulher, a psicóloga veio ao Brasil para falar sobre este e outros trabalhos na Conferência Sócio Emocional, evento promovido pelo colégio Graded School que ocorre em São Paulo a partir desta quinta-feira (9 a 11 de março).
O sucesso feminino ainda está relacionado à aparência
“Criticar nossos corpos foi a maneira que encontraram de dizer ‘se você não tem determinada aparência, nunca chamaremos você de bem-sucedida’”, afirma Catherine. Um dos seus trabalho é voltado principalmente a ensinar jovens mulheres a desconstruir o padrão de beleza que deve ser seguido, uma forma de prevenir o desenvolvimento de doenças como anorexia e bulimia.
Segundo dados do Instituto Nacional de Saúde Mental dos Estados Unidos (NIMH, na sigla em inglês) 70 milhões de pessoas sofrem de algum tipo de transtorno alimentar no mundo. “Entre 85% e 90% das pessoas afetadas são mulheres”, diz a psicóloga. “E o fato de que uma doença tão difícil de tratar e que possui uma das maiores taxas de mortalidade afeta mais um sexo do que o outro mostra que fatores culturais estão envolvidos.” O desafio, para ela, era compreender como desconstruir as mensagens culturais que estavam levando essas meninas a desenvolver tais transtornos.
Segundo Catherine, o primeiro passo seria fazer essas jovens aceitarem seus corpos como eles realmente são, sem fazer com que elas desejem ter um corpo que é impossível de ser atingido.
“O corpo é uma fonte de poder, mas também uma fonte de abuso. E o corpo da mulher é ainda mais violado, desrespeitado, menosprezado”, afirma. De acordo com ela, na maioria das culturas com as quais entrou em contato, as meninas são educadas para se preocupar excessivamente com sua aparência física.
Formando grandes líderes
A psicóloga também percebeu que, quando crianças, as mulheres tendem a dizer mais o que pensam e se autorizam a fazer o que têm vontade. Conforme crescem, aprendem a esconder suas opiniões e desculpar-se com mais frequência. “Meninas usam muito mais expressões como ‘eu não sei’, ‘pode ser’ ou ‘tanto faz’ do que meninos”, diz. “Elas também perguntam mais sobre a opinião dos outros, como se dissessem ‘eu posso mudar o que eu penso’. Mulheres aprendem a não se mostrarem seguras e determinadas.” A pesquisadora exemplifica afirmando que, quando uma menina fala com determinação ou diz que é boa em algum esporte, ela é chamada de “mandona” ou “convencida”, enquanto meninos são estimulados a reconhecer suas habilidades e serem mais seguros na hora de agir ou falar. “O garoto poderia falar exatamente a mesma coisa que uma garota, ele não seria chamados de ‘mandão’ ou ‘rude'”, diz Catherine.
Isso também influencia no estímulo que essas jovens recebem para desenvolver habilidades ligadas à liderança. Um dos objetivos do livro de Catherine é ajudar as jovens a resistir às pressões culturais e perseguir seus objetivos. Um levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostrou que, atualmente, as mulheres trabalham 7,5 horas semanais a mais do que os homens no Brasil. Ainda assim, recebem salários 30% menores, segundo dados do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), e ocupam apenas 5% dos cargos de liderança nas empresas brasileiras, de acordo com a pesquisa International Business Report (IBR) de 2016.
A chave para solucionar essas e outras questões de gênero, segundo Catherine, está na educação – e não só das meninas, mas também dos meninos. “Temos que educar garotas e garotos para que respeitem as mulheres”, afirma. Para ela, é essencial ensinar os homens desde jovens que “tratar as mulheres com respeito é responsabilidade deles”. “Direitos das mulheres são direitos humanos. E todos os humanos devem começar a se importar com eles, pois todos nos beneficiamos quando estamos todos no mesmo nível de respeito.”