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Detecção das ondas gravitacionais abre uma nova janela para conhecer o Universo

Para os cientistas, o registro do fenômeno é uma das descobertas científicas mais importantes do século e seu estudo pode trazer novas – e inesperadas – revelações sobre o funcionamento do cosmo

Por Rita Loiola Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 9 Maio 2016, 14h45 - Publicado em 11 fev 2016, 20h05

Cem anos depois que Albert Einstein previu a existência de ondas gravitacionais, os cientistas finalmente conseguiram detectá-las. Essas minúsculas distorções no espaço-tempo – aquilo que os físicos descrevem metaforicamente como o tecido do universo, o ambiente dinâmico onde todos os acontecimentos transcorrem – eram a única parte da Teoria da Relatividade Geral de Einstein que ainda não havia sido confirmada pela ciência. A detecção direta desse fenômeno, de acordo com os pesquisadores, abre uma nova janela para conhecer o Universo, inaugurando outra forma de compreendê-lo.

“Esta é uma das maiores descobertas do século. O estudo das ondas gravitacionais será capaz de revelar coisas sobre o cosmo que nem podemos imaginar”, afirmou ao site de VEJA o astrofísico brasileiro Odylio Aguiar, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e um dos autores do estudo que descreve o processo de detecção, publicado nesta quinta-feira no periódico científico Physical Review Letters.

Segundo o cientista, o anúncio histórico feito em uma coletiva de imprensa em Washington, nos Estados Unidos, é tão ou mais importante que a descoberta do Bóson de Higgs para a física e irá abrir caminhos para desbravar de forma inédita o Universo. “É como se estivéssemos na época de Galileu (1564-1642), quando ele aperfeiçoou o telescópio e conseguiu olhar para novos fenômenos no cosmo – dessas observações veio a ideia de que a Terra girava em torno do Sol. Encontrar as ondas gravitacionais também inaugura uma nova era de descobertas para a ciência.”

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Pequenas ondulações – Em linhas gerais, as ondas gravitacionais são minúsculas distorções no campo gravitacional do Universo, provocadas por grandes eventos cósmicos (como a explosão de estrelas ou fusão de buracos negros). Esses eventos são tão violentos que conseguem provocar ondulações quase imperceptíveis no espaço-tempo, como se fossem ‘ecos’ do fenômeno.

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Quando Einstein anunciou a Teoria da Relatividade Geral, em 1915, ele reescreveu as regras do Universo que haviam sido ditadas por Newton, dois séculos antes. Segundo ele, matéria e energia distorcem a geometria do cosmo, da mesma forma que uma pessoa pesada faz um colchão ceder, ao dormir. O efeito no colchão seria como os efeitos da gravidade. Distúrbios no cosmos fariam o espaço-tempo, esse fluido tecido do Universo, esticar ou enrugar, da mesma forma que o tecido do colchão ondula sob os movimentos do sono – seriam essas as ondas gravitacionais.

Apesar de previstas, um longo percurso foi necessário para sua detecção. Nos anos 1970, os cientistas Russel Hulse e Joseph Taylor Jr. demostraram pela primeira vez a sua existência. Em 1974, eles descobriram um sistema binário formado por um pulsar (pequenas estrelas de nêutrons formadas após a explosão de estrelas supermassivas) orbitando uma estrela de nêutrons. Ao longo dos anos, os pesquisadores perceberam que a órbita do pulsar diminuía e ele se aproximava da estrela de nêutrons. Isso acontecia por causa da perda de energia em forma de ondas gravitacionais. Por esse trabalho, ganharam o Nobel de Física em 1993.

Mais de 1.000 cientistas – Contudo, para detectar diretamente essas ondas, foi necessária uma colaboração de mais de 1.000 cientistas em universidades espalhadas pelos Estados Unidos e em outros 14 países – incluindo o Brasil. Esses pesquisadores trabalham com os dados oferecidos pelo Observatório Interferométrico de Ondas Gravitacionais (LIGO), que tem detectores em Livingston (Louisiana) e em Hanford (Washington), nos Estados Unidos. Eles foram concebidos, construídos e são operados pelos institutos de Tecnologia da Califórnia (Caltech) e Massachusetts (MIT) e servem apenas para a detecção das ondas.

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Esses instrumentos, com braços em forma de “L” de cerca de quatro quilômetros de extensão, foram feitos para captar oscilações muito mais sutis que a luz – eles poderiam registrar distorções viajando no espaço com o tamanho de um milésimo do diâmetro de um núcleo atômico.

Em 14 de setembro de 2015, esses aparelhos detectaram sinais que duraram 0,2 segundo. A frente da onda chegou primeiro no instrumento da Louisiana e, 7,3 milésimos de segundo depois, em Washington. Durante cinco meses, os cientistas fizeram cálculos, reviram modelos e simulações para ter certeza de que não se tratava de ruídos ou qualquer outra interferência. Concluíram que se tratava do sinal do último 0,2 segundo da colisão de dois buracos negros com massa de 29 e 36 vezes a do Sol, que giraram um ao redor do outro até se fundirem em um único buraco negro.

Os dados indicam que o fenômeno cataclísmico aconteceu há aproximadamente 1,3 bilhão de anos-luz de distância (cada ano-luz equivale a 9,46 trilhões de quilômetros). Esse sistema liberou ondas gravitacionais com energia equivalente a cerca de três vezes a massa do Sol – é bastante, em termos astronômicos. Foram essas ondulações que o LIGO detectou.

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Essas pequeníssimas distorções, detectadas diretamente, comprovam, de uma só vez, a existência das ondas gravitacionais, dos buracos negros e a fusão deles (em um fenômeno chamado pelos físicos de “coalescência”).

Caminho certo – “Tudo isso aconteceu, coincidentemente, cem anos depois da apresentação da Teoria da Relatividade Geral de Einstein. É fantástico porque, além da comprovação da última previsão do físico, essas ondas trazem informações dos confins do Universo e podem revelar muitas coisas sobre os fenômenos que acontecem em sua imensidão”, disse o astrofísico Gustavo Rojas, pesquisador da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). “Além disso, é uma confirmação de que o método científico realmente funciona. Podemos não saber muita coisa sobre o Universo que nos rodeia, mas essa descoberta revela que estamos no caminho certo. É muito difícil ter um evento comparável a esse na ciência.”

Nobel – Em uma declaração à BBC, o físico britânico Stephen Hawking disse que a capacidade de detectar as ondas abre a porta para uma nova forma de olhar o Universo. “A descoberta tem o potencial para revolucionar a astronomia”, afirmou. “Além de provar a Teoria da Relatividade Geral, podemos esperar ver buracos negros ao longo da história do Universo. Poderíamos inclusive ver os vestígios do universo primordial, durante o Big Bang, graças às ondas gravitacionais”, disse.

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Segundo a comunidade científica, essa detecção provavelmente vai render a seus autores um prêmio Nobel de Física neste ou no próximo ano.

Confira os vídeos feitos pelos cientistas simulando o efeito (exagerado) das ondas gravitacionais no Universo e mostrando como seria a fusão dos buracos negros:

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