Como os antigos egípcios retrataram a Via Láctea há 3 mil anos
Análise de sarcófagos revela pinturas funerárias com curvas onduladas que representam fenômenos celestes e decoram o corpo da deusa Nut, associada ao céu
Por Ligia Moraes
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1 Maio 2025, 15h30
A Via Láctea fotografada sobre o deserto ocidental do Egito. A faixa escura que atravessa o centro da imagem, conhecida como Great Rift, pode ter inspirado representações na arte funerária egípcia. Foto: Osama Fathi. (Osama Fathi/Reprodução)
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O céu noturno da antiguidade pode ter deixado sua marca em obras de arte egípcias milenares. Uma nova análise liderada pelo astrofísico Or Graur, da Universidade de Portsmouth, no Reino Unido, sugere que antigos artistas egípcios retrataram a Via Láctea — o “rio de estrelas” que corta o céu — em pinturas funerárias que datam de mais de 3 mil anos. Segundo o estudo, publicado no Journal of Astronomical History and Heritage, o traço característico da galáxia aparece como uma linha preta ondulada contornando o corpo da deusa Nut, a personificação do céu, em ao menos cinco representações distintas.
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Representação da deusa Nut no caixão de Nesitaudjatakhet, com uma linha ondulada decorada com estrelas contornando seu corpo — possível referência simbólica à Via Láctea (Odessa Archaeological Museum, OAM 52976/Mykola Tarasenko/Reprodução)
Onde a Via Láctea aparece na arte egípcia?
A figura mais emblemática foi encontrada na tampa externa do sarcófago de Nesitaudjatakhet, uma cantora devota dos deuses Mut e Amon-Rá que viveu entre 1077 e 943 a.C., durante a XXI dinastia. A pintura mostra Nut arqueada sobre o corpo do deus Geb, com o corpo coberto por estrelas — uma representação típica da deusa. No entanto, um elemento inusitado chama atenção: uma linha grossa e sinuosa, pintada de preto, contorna seu corpo dos pés à cabeça, com estrelas dispostas de ambos os lados. A curva se assemelha ao traço escuro conhecido comoGreat Rift, a faixa de poeira interestelar que divide a Via Láctea ao meio.
Graur identificou ao menos quatro outras representações similares: duas em tumbas de faraós do Vale dos Reis (Ramessés IV, VI e IX), uma na tumba de Seti I, e outra na tampa de um sarcófago da coleção do Museu Nacional do Tartaristão, na Rússia. Todas apresentam a mesma curva ondulada em meio a elementos celestes, o que reforça a hipótese de que o fenômeno observado no céu era, de fato, representado visualmente nas práticas funerárias egípcias.
Detalhe do teto da tumba de Ramessés VI, no Vale dos Reis, com a deusa Nut e uma linha ondulada dourada acima (Francis Dzikowski / Theban Mapping Project./Reprodução)
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A deusa Nut era a própria galáxia?
Embora a associação entre Nut e a Via Láctea já tenha sido sugerida por textos antigos, o novo estudo reforça que os egípcios viam a galáxia não como a própria deusa, mas como um fenômeno celeste que a atravessava. “Nut não é uma representação da Via Láctea. Em vez disso, a Via Láctea é apenas mais um elemento do céu que decora seu corpo — assim como o Sol e as estrelas”, afirma Graur no artigo.
Essa distinção é importante porque, segundo o autor, a presença da curva ondulada é extremamente rara: entre os mais de 550 elementos de sarcófagos analisados, apenas cinco trazem esse traço visual. Isso indica que a Via Láctea era um entre vários símbolos cosmológicos associados a Nut, e não sua personificação exclusiva.
Além de oferecer uma possível representação visual mais antiga da Via Láctea já identificada, o estudo mostra como os egípcios integravam elementos astronômicos reais às suas crenças religiosas e funerárias. Graur sugere que o nome egípcio da galáxia pode ter sido mr-nḫ3 — traduzido como “canal sinuoso” ou “caminho das águas em curva” — expressão que aparece em textos das pirâmides com descrições de travessias celestes do faraó após a morte.
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