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Ciência avança para entender como os chimpanzés se comunicam

Pesquisadores da Alemanha e da França descobriram que eles usam sons específicos para se comunicar, como nós humanos

Por Alessandro Giannini Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 11h43 - Publicado em 12 jun 2022, 08h00

Koko (1971-2018) foi uma gorila eloquente ao longo de seus 46 anos. Na Gorilla Foundation, em São Francisco, nos Estados Unidos, ela aprendeu uma variação da língua de sinais americana. Entendia inglês e usava mais de 1 000 gestos para compartilhar seus sentimentos e pensamentos. Em 2001, recebeu uma visita ilustre, do ator Robin Williams (1951-2014), que aparentemente a tirou de um estado de luto — seu amigo e companheiro, o também gorila Michael, havia morrido um ano antes. Quando o comediante se suicidou, em 2014, ela ficou sabendo da notícia pela cuidadora, Penny Patterson. Logo depois, segundo a psicóloga animal, ela ficou cabisbaixa e chorosa, dizendo que estava triste. Embora não se comunicasse com sons, era inegável que tinha alguma capacidade cognitiva. Recentemente, um grupo de cientistas demonstrou que primatas têm o poder de falar entre si, usando estruturas muito simples, mas mais complexas do que se imaginava.

arte chipanzé

A espécie humana é a única conhecida por usar linguagem. Fazemos isso combinando livremente um conjunto limitado de sons em palavras e sequências hierárquicas, gerando infinitas novas frases carregadas de múltiplos significados. Só não se sabe a origem dessa prática. Um método para identificar esse elo perdido está na comparação com a produção vocal de outros animais, em especial os primatas, que costumam usar vocalizações únicas para se comunicar e raramente as combinam para formar sequências lógicas e organizadas a partir de um código. Pesquisadores do Instituto Max Planck de Leipzig, na Alemanha, e do Centro Nacional de Pesquisa Científica de Lyon, na França, analisaram 4 826 gravações de 46 chimpanzés adultos selvagens do Parque Nacional Taï, na Costa do Marfim, e identificaram que os animais produziram 390 sequências vocais únicas.

Na maioria das línguas, os humanos usam menos de cinquenta sons diferentes para criar palavras, combinando-as de forma estruturada e lógica. Já os primatas não humanos usam até 38 vocalizações diferentes para se comunicar, mas raramente as combinam umas com as outras. Na pesquisa, são classificadas como “chamados”, que podem ser gritos, grunhidos e outros barulhos. O que busca o estudo coliderado pelo pesquisador Cédric Girard-Buttoz, do Instituto Max Planck, é mostrar com mais detalhes e profundidade a estrutura e diversidade das sequências vocais produzidas por esses animais. “Observá-los em seu ambiente social e ecológico natural revela uma complexidade até então desconhecida na forma como eles se comunicam”, diz o pesquisador.

ELOQUENTE - Koko ao lado de seus cuidadores: a gorila entendia inglês -
ELOQUENTE - Koko ao lado de seus cuidadores: a gorila entendia inglês – (The Gorilla Foundation/.)

A análise evidenciou que os chimpanzés se comunicam usando centenas de sequências diferentes, combinando até dez tipos de vocalizações do seu repertório. Além disso, os pesquisadores mostram que os sons são combinados de modo a aparecer em posições específicas quando emitidos, seguindo regras de adjacência. É a primeira vez que esse tipo de diversidade em primatas não humanos é registrada. “Nossas descobertas destacam um sistema de comunicação vocal em chimpanzés que é muito mais complexo e estruturado do que se pensava anteriormente”, diz a coautora do estudo Tatiana Bortolato.

Ao analisar os chamados, os pesquisadores descobriram que foram emitidos em sequências de duas unidades (bigramas), que podiam ser incorporadas em sequências de três unidades (trigramas), além se ser recombinadas de diversas formas. Os sons foram investigados em termos de flexibilidade, ordenação e recombinação. “A capacidade de organizar unidades individuais em sequências estruturadas oferece um sistema potencialmente adequado para a geração de significado”, escreveram os pesquisadores. “A sintaxe é uma marca da linguagem humana e, para elucidar a origem dessa habilidade, é fundamental entender como as vocalizações dos primatas não humanos são estruturadas”, afirma Emiliano Zaccarella, outro líder do estudo. O próximo passo é investigar o que as sequências vocais complexas e estruturadas significam e se elas permitem que os chimpanzés aumentem a gama de temas sobre os quais se comunicam. É capaz de, com todas as suas limitações, o que dizem fazer muito sentido.

Publicado em VEJA de 15 de junho de 2022, edição nº 2793

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