As recentes descobertas sobre como viviam os dinossauros
O avanço tecnológico e novas técnicas na exploração de fósseis levam a ciência a descobrir espécies e até a desvendar o seu comportamento social
Em 1842, o biólogo britânico Richard Owen publicou um artigo sobre os recentes achados de dentes e outros ossos pertencentes a répteis pré-históricos. Owen juntou em um só grupo três animais distintos que possuíam semelhanças anatômicas e criou uma nova subordem, batizada por ele de Dinosauria, ou “lagartos terríveis”, em grego. Desde então, os dinossauros cativaram diferentes gerações de cientistas, caíram no gosto do público, especialmente o infantil, ganharam as telas do cinema e, de certa forma, tornaram-se as criaturas mais admiradas do reino animal. Mesmo assim, foi apenas recentemente que os paleontólogos descobriram características marcantes desses seres notáveis. Com o avanço tecnológico e o surgimento de novas técnicas de prospecção de fósseis, o mundo ingressa agora, 178 anos depois da descoberta de Owen, em uma nova era dos dinossauros.
Os especialistas têm aprendido mais sobre dinossauros agora do que nos dois séculos anteriores. A média de novas espécies desvendadas anualmente alcançou a fantástica marca de cinquenta, número impensável até pouco tempo atrás, e ninguém é capaz de dizer ao certo o que existe abaixo da superfície do planeta, oculto por 66 milhões de anos — algo fantástico pode estar por vir. Uma das descobertas recentes é um novo tipo de tiranossauro, encontrado em fevereiro no Canadá. Com 2,4 metros de altura, ele é menor do que o rex clássico, que tinha quase o dobro desse tamanho, mas era igualmente assassino, o que levou os pesquisadores a chamá-lo de “ceifador da morte.” O novo tiranossauro é apenas mais um entre inúmeros achados no campo da paleontologia.
A abundância de novos fósseis combinada com equipamentos adequados permite aos cientistas entender como os dinossauros realmente foram. Sua aparência, comportamento e até mesmo o som que emitiam têm sido decifrados quase que milagrosamente. “A paleontologia deixou de ser uma atividade especulativa e passou a ser pautada pela metodologia científica, com testes e observações”, diz Luiz Anelli, paleontólogo e autor do livro O Guia Completo dos Dinossauros do Brasil.
Diversos recursos têm sido aplicados na pesquisas. Scanners médicos, aceleradores de partículas e análises químicas possibilitam aos paleontólogos separar virtualmente a rocha fossilizada do osso e, assim, enxergar os detalhes anatômicos dos animais, estipular a cor de seus ovos e reconstituir a sua aparência. A tomografia computadorizada, comum em hospitais, é outra tecnologia que encontrou vocação no estudo de dinossauros. É o caso do Hospital O’Bleness de Ohio, nos EUA, que tem feito imagens tomográficas de répteis e aves para reconstruir e interpretar a anatomia de animais extintos. Outro exemplo é a microtomografia. Com os pedaços do crânio fossilizado de uma espécie, monta-se o cérebro do animal em 3D, o que permite descobrir a sua dieta e até a capacidade auditiva.
Avanços na tecnologia 3D, combinados com softwares sofisticados de computadores, também permitem que, a partir dos fósseis, os cientistas reconstituam músculos, ligamentos e tendões dos animais. Assim, é possível saber, ou ao menos projetar, a velocidade que um dinossauro poderia percorrer ou o peso que teria capacidade de carregar. Com a ajuda de computadores de última geração, as equipes foram capazes de criar modelos robóticos que reproduzem as características de um dinossauro, o que os levou a descobrir se determinada espécie levantava voo a partir do chão ou planava acima da árvores. Não vai demorar muito para que as características mais íntimas dos gigantes sejam enfim desnudadas.
O mais fantástico, porém, está ligado à análise do cérebro dos grandes répteis. A partir do estudo minucioso da cabeça e do formato da boca, ouvidos e narinas, os cientistas asseguraram que é possível elucidar habilidades sensoriais e até mesmo o comportamento social dos animais. Descobriu-se recentemente que algumas espécies apresentavam estruturas hierárquicas sólidas, enquanto outras exigiam o cortejo de um indivíduo para que houvesse acasalamento — exatamente como fazem os humanos.
Os recentes estudos provaram que os dinossauros eram animais muito mais complexos do que se imaginava. Eles não se resumiam apenas a lagartos gigantes que estavam permanentemente sedentos por sangue ou enormes herbívoros pescoçudos que comiam sem parar. Isso pode até ser verdade para algumas espécies, mas seria simplório descrever os dinossauros dessa maneira. Acima de tudo, conforme notou a ciência avançada, eram seres sociais, inteligentes, possivelmente recobertos de penas lustrosas e coloridas. Alguns eram pequenos e inofensivos, mas outros de fato consistiam na mais fantástica máquina mortífera concebida pela natureza. De todo modo, eram inegavelmente encantadores.
Em uma perspectiva histórica, o Homo sapiens está muito longe de repetir o domínio que os dinossauros tiveram sobre a Terra. Eles reinaram absolutos durante 150 milhões de anos, enquanto os humanos estão por aqui há meros 300 000. Há também uma corrente de cientistas que acredita que os dinossauros ainda estão entre nós. Como as aves são parentes desses répteis, faz sentido admitir que elas, de certa forma, carregam um pouco daquele passado extraordinário. Com o avanço da ciência, a era gloriosa dos dinossauros será revivida, de um jeito ou de outro.
Publicado em VEJA de 7 de outubro de 2020, edição nº 2707