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A era espacial S.A.: o capital privado entra com força no setor

A nova fase da exploração do cosmo exigirá um investimento financeiro sem precedente que só a livre-iniciativa poderá proporcionar

Por Sergio Figueiredo Atualizado em 8 jan 2021, 09h14 - Publicado em 8 jan 2021, 06h00

Vinte e um de junho de 2004, aparentemente uma data qualquer nos livros de história, merecia mais destaque. Naquele dia, a nave tripulada SpaceShipOne cruzou Kármán, a linha imaginária a 100 quilômetros de altitude que separa a atmosfera do espaço. O que fez do voo um feito digno de nota é que a espaçonave em questão foi a primeira fabricada e financiada por um empresário, o bilionário cofundador da Microsoft, Paul Allen. Menos de dezesseis anos depois, em 30 de maio de 2020, a SpaceX, de Elon Musk, outro notável bilionário, iria mais longe transportando para a Estação Espacial Internacional dois astronautas da Nasa em um veículo inteiramente comercial, do foguete à cápsula. Seja na baixa órbita da Terra, na Lua ou em Marte, a SpaceShip e a SpaceX são exemplos práticos de como o espaço será explorado pela iniciativa privada. Essa é a face do futuro, que começou a ser moldado sessenta anos atrás.

A década de 60, do amor livre e da contracultura, se iniciou com os Estados Unidos perdendo o bonde da história: foi a União Soviética que lançou o primeiro satélite, em 1957, e que pôs o primeiro homem em órbita, em 1961, mas foram os americanos que chegaram antes à Lua, graças ao capital humano, financeiro, tecnológico e industrial da iniciativa privada. A Nasa, à época, tinha 35 000 funcionários contratados, número insignificante perto dos quase 400 000 terceirizados em fábricas, laboratórios e escritórios por todo o país. Todos estes, porém, eram prestadores de serviços, não gestores do negócio. O monopólio era da agência espacial americana.

A nova era da exploração espacial, entretanto, será diferente, não só por haver interesse do capital privado em múltiplas oportunidades, mas também porque recursos governamentais são finitos. Segundo cálculos da Euroconsult, o investimento estatal global no setor, em 2019, foi de 20 bilhões de dólares, tendo os Estados Unidos contribuído com 71% do total, seguidos por China com 13%, União Europeia com 9% e outras nações com o restante. Mesmo que a consultoria projete crescimento de aportes nesta década, o montante não ultrapassaria a casa de 30 bilhões de dólares anuais (cerca de 160 bilhões de reais). Estima-se que a iniciativa privada tenha um poder de investimento cinco vezes maior do que esse.

Tal ajuda torna-se mais necessária diante da agenda para os próximos anos. Em julho de 2020, a Casa Branca divulgou um relatório com as principais diretrizes nacionais para a nova era de desenvolvimento e exploração do espaço. Além de ressaltar a importância do programa Artemis, que pretende levar o homem ao Polo Sul da Lua até 2024, o governo quer estabelecer uma colônia em Marte ainda na década de 2030. No mesmo documento, a fim de atingir esses objetivos, o governo americano admite a necessidade de trabalhar com nações parceiras e, principalmente, com a iniciativa privada — não apenas como fornecedora, mas como controladora de negócios. No entanto, afora transportar pessoas e carga, o que mais despertaria o interesse das empresas?

A lista é extensa e inclui, entre outras atividades, destruição e reciclagem de detritos espaciais, fabricação e instalação de estações orbitais e hábitats em outros planetas, mineração de asteroides e extração de água na Lua a fim de gerar hidrogênio para foguetes e oxigênio para manutenção de vida. Existe também uma gama de outros empreendimentos possíveis em parceria com a Nasa, como o transporte de astronautas a longa distância por meio de naves que estão sendo desenvolvidas pela Blue Origin, de Jeff Bezos, presidente da Amazon, e pela própria SpaceX, cujos foguetes reutilizáveis têm estimativa de custo operacional de um terço do valor gasto pela agência estatal.

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Na verdade, quando se analisam todos os projetos em andamento, não há nenhum que não possa ser entregue à iniciativa privada ou feito no modelo parceria público-privada. Os últimos contratos puramente governamentais são do Sistema de Lançamento Espacial (o foguete superpesado do programa Artemis) e o da Estação Internacional, previsto para ser encerrado no biênio 2024-2025. Na outra ponta, analistas do setor estimam existir pelo menos vinte empresas com capital e tecnologia para assumir algum tipo de negócio relacionado à exploração do cosmo. Além das já citadas, aparecem a Axiom Space (Estação Internacional), Northrop Grumman e Sierra Nevada (transporte de carga autônomo), a japonesa ispace (robôs e hábitats lunares) e até mesmo a Virgin Galactic, do bilionário britânico Richard Branson, voltada para o turismo.

Branson tem em sua holding a SpaceShip Company, fabricante da SpaceShipTwo, evolução da nave lançada em 2004. A versão definitiva está passando pelos últimos testes antes de levar o primeiro grupo de turistas ao espaço. As passagens podem ser adquiridas por 250 000 dólares cada uma. A lista de espera é grande, pois centenas já foram vendidas. A viagem inaugural foi marcada para 2021 e Branson estará a bordo. Até que provem o contrário, o capitalismo chegou ao espaço, não como turista, mas para ficar.

Publicado em VEJA de 13 de janeiro de 2021, edição nº 2720

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