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Sem renovar bandeiras, PT luta para recuperar hegemonia na Grande São Paulo

A reconquista um reduto histórico, de um simbolismo quase sentimental, é prioridade na eleição deste ano para o partido

Por Valmar Hupsel Filho 14 set 2024, 08h00

Foi no Grande ABC, no entorno metropolitano da capital paulista, que Lula subiu pela primeira vez em palanques improvisados nos anos 1970 para, como líder operário, desafiar a ditadura e pavimentar a criação de um dos maiores partidos políticos do país. O PT, ancorado em um eleitorado urbano e alavancado pelo movimento sindical em ascensão, ganhou musculatura e, com apenas oito anos de existência, conquistou em 1988 prefeituras importantes como São Paulo e São Bernardo do Campo. O auge da hegemonia, no início dos anos 2000, coincidiu com a alta popularidade dos governos petistas e gerou o que se chamou de “cinturão vermelho”. Nos anos seguintes, no entanto, alvejado pelo mensalão, Lava-Jato e impeachment de Dilma, mas também pela ascensão da direita e, principalmente, pela mudança do perfil da classe trabalhadora, o partido entrou em decadência na região, onde hoje administra apenas duas prefeituras.

A reconquista de um reduto histórico, de um simbolismo quase sentimental, é prioridade na eleição deste ano não só para o PT, mas para Lula. Além de Mauá e Diadema, onde há candidatos à reeleição, o partido lançou nomes para vinte prefeituras no entorno da capital. A empreitada não será simples, muito pelo contrário. Em nenhum município, nem mesmo naqueles que governa, o petismo está em vantagem. Em cidades estratégicas como Guarulhos, Osasco e São Caetano do Sul, o candidato petista está a mais de 20 pontos do líder, segundo pesquisas de intenção de votos feitas a um mês da eleição, e corre o risco de nem ir ao segundo turno.

“FAZ O L” - Alencar Santana (de vermelho): tática em Guarulhos se apoia em Lula
“FAZ O L” - Alencar Santana (de vermelho): tática em Guarulhos se apoia em Lula (Reprodução/Instagram)

A investida petista na região está amparada em nomes da velha guarda, como o ex-prefeito de Osasco Emidio de Souza, amigo do presidente, que governou a cidade por dois mandatos no auge do domínio petista, ou José de Filippi Júnior, ex-tesoureiro das campanhas de Lula e Dilma, que tenta o quinto mandato à frente de Diadema. Também está no páreo Jair Meneguelli, nome histórico do sindicalismo — sucedeu a Lula no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e foi o primeiro presidente da CUT —, que disputa com muita dificuldade o comando de São Caetano do Sul, a única das grandes cidades do ABC que o PT nunca comandou. A aposta em nomes conhecidos, segundo o secretário-geral do PT no estado, Luiz Cláudio Marcolino, veio após diagnóstico de que há anseio por experiência administrativa após a onda de antipolítica nas eleições recentes. “Estamos trabalhando muito a questão da experiência e a relação com o governo federal”, afirma.

As dificuldades do PT, em sua maioria, são frutos da própria descaracterização do partido ao longo dos anos. Entre os problemas estão o afastamento da sigla do eleitorado, a baixa renovação de seus quadros — o que pode afastar o eleitor jovem —, a permanência da sigla na defesa de pautas que se descolaram do dia a dia das pessoas, a mudança no perfil dos trabalhadores, com a consequente perda de força dos sindicatos, e a ascensão da religião evangélica e da direita. “O que aconteceu com a social-democracia na Europa está acontecendo com o PT”, compara o cientista político Alberto Carlos Almeida, autor do livro A Cabeça do Eleitor. O presidente do partido em São Paulo, Kiko Celeguim — que foi prefeito de Franco da Rocha nos anos de ouro, entre 2013 e 2020 —, concorda. “As mudanças das relações de trabalho refletem na capacidade política dos partidos, principalmente daqueles que se dispõem a organizar a classe trabalhadora”, entende.

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Apesar da má situação nas pesquisas, o PT aposta em duas crenças inabaláveis de seus adeptos. Uma é a de que é um “partido de chegada”, que cresce nos últimos dias de campanha. A outra é o poder de Lula. O presidente já gravou vídeos para candidatos e sua imagem tem sido explorada exaustivamente nas ruas, nas redes sociais e na TV. Há a expectativa de que o presidente vá ao menos a Diadema e São Bernardo do Campo, que ele já visitou neste ano e onde as disputas estão acirradas. Há ainda a ideia de convidar a primeira-dama Janja da Silva para ajudar nas campanhas em Santo André e Embu das Artes, onde o PT tem mulheres na disputa.

A reconquista da Grande São Paulo vai além do apelo simbólico. A região é o maior aglomerado urbano do país, com 21 milhões de pessoas. Em 2022, Lula foi o mais votado na capital e na maior parte das maiores cidades. Vencer as eleições municipais pode elevar as chances para 2026, quando o presidente deverá tentar a reeleição e haverá disputas para governadores, deputados e senadores. A dura tentativa até aqui de reconquistar o lugar onde nasceu pode ser boa oportunidade para o PT fazer uma reflexão sobre sua trajetória — e sobre todos (e não poucos) os erros que cometeu.

Publicado em VEJA de 13 de setembro de 2024, edição nº 2910

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