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“O poder público não aprendeu nada”

Mãe que vive até hoje o luto pela perda da filha no massacre que vitimou doze crianças em Realengo, em 2011, diz que barbáries como essa podem ser evitadas

Por Bruna Motta
15 mar 2019, 07h00 • Atualizado em 4 jun 2024, 15h37
  • No dia em que minha filha Luisa morreu, acordei com um sentimento estranho, ruim, e perguntei se ela tinha prova na escola. Com uma angústia inexplicável no peito, preferia que ela faltasse à aula. Luisa acabou indo. Era o mais razoável. Tinha 13 anos, e eu sempre a acompanhava à escola. Mas naquele dia, enquanto caminhávamos juntas, lembrei que tinha de resolver uma coisa rápido em casa. Ela seguiu, sorridente. Eu disse que a alcançaria. Logo fui a seu encontro e acabei esbarrando com um amigo, que perguntou: “Oi. Você não está sabendo?”. Não, não sabia de nada. “Um homem doido entrou na escola atirando”, ele contou. “Qual escola?”, perguntei. “A Tasso da Silveira.” Era a escola da Luisa desde pequena, uma casa para ela.

    Na mesma hora subi na moto desse amigo e fomos em direção ao colégio. Assustada, tracei vários cenários na cabeça, menos o de crianças mortas dentro de uma escola. Quem imaginaria isso no Brasil? Para mim, tiroteio assim era coisa que acontecia nos Estados Unidos, que a gente vê no cinema e na TV. Estava errada. O palco da insanidade dessa vez era a escola da minha filha, que perdeu a vida ainda no começo dela. Luisa e outras onze crianças morreram covardemente naquele 7 de abril de 2011.

    Transformei o aprendizado forçado que tive com minha própria dor em ofício. Hoje ajudo pais que também perderam os filhos de forma brutal

    Todo mundo sempre diz que a dor desse tipo de perda é física — e é mesmo. Dá um desespero, falta de ar. O que ajudou muito foi me unir a outros pais e formar a ONG Anjos de Realengo. No momento mais difícil não tivemos nenhum apoio das autoridades — psicólogos poderiam ter ajudado. Por isso decidimos brigar uns pelos outros. No início, éramos só os parentes das crianças mortas, mas foram chegando também familiares de sobreviventes da tragédia. Obtivemos algumas conquistas. Uma delas foi fazer do 7 de abril o dia nacional do combate ao bullying, o gatilho para a loucura do rapaz que matou a Luisa. Isso chamou atenção para o problema. Outra vitória foi conseguir a contratação de 3 000 porteiros para trabalhar nas escolas estaduais do Rio. Mas, para nossa tristeza, quatro anos depois todos foram demitidos.

    Quando Luisa partiu, eu me vi totalmente perdida, sem rumo. A força para continuar viva veio justamente de poder ajudar outras pessoas que levaram o mesmo tombo que eu. Minha filha morreu sem saber o porquê de estar morrendo. Quanto ao atirador, não consigo sentir nada, absolutamente nada. A dor do luto é tão grande que não me sobrou espaço para sentimentos vingativos. Sim, o assassino de Luisa fez um estrago na minha vida, mas trabalho para que pessoas doentes como ele tenham ajuda.

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    Percebo com tristeza que o poder público não aprendeu nada com o drama de Realengo. Se tivesse aprendido, haveria nas escolas gente mais treinada para garantir a segurança e notar nuances de comportamento que podem desaguar nesses casos. Pretendo visitar as mães que agora vivem a dor da morte de seus filhos, em São Paulo. Transformei o aprendizado forçado que tive com minha própria dor em ofício: hoje ajudo pais que perderam os filhos de forma brutal. De alguma maneira, sou a voz da Luisa, minha caçulinha que se foi tão cedo. Tenho outro filho, de 24 anos, mas a casa sem ela ficou vazia. E aquele aperto no peito nunca foi embora.

    Depoimento a Bruna Motta

    Publicado em VEJA de 20 de março de 2019, edição nº 2626

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