O bloco da hipocrisia
Se queremos mesmo vencer a pandemia, e sair da longuíssima Quarta-feira de Cinzas a que fomos submetidos, o respeito às regras é fundamental

Sim, apesar dos números ainda altos de casos e mortes em decorrência da Covid-19, é possível dizer que a pandemia caminha para o início do fim — há uma clara tendência de queda de ambos os índices no país. Mas ainda não é hora de sair por aí comemorando antecipadamente. No Carnaval de 2022, esse que não aconteceu, com desfiles adiados para abril, o país ofereceu cenas constrangedoras. Nas grandes cidades houve aglomerações, festas fechadas e blocos na rua, apesar da proibição explícita. No Rio de Janeiro, milhares de pessoas se reuniram para desfilar na Região Central e na Zona Portuária da cidade. Segundo a fiscalização do município, oito grupos muito animados foram dispersados. “Esses blocos, em essência, nascem do improviso”, defendeu o secretário municipal de Ordem Pública, Breno Canevalle. “As pessoas vão se aglomerando, o Carnaval está no DNA do carioca.” Talvez esteja mesmo, mas seria melhor que uma outra parcela desse mesmo DNA se impusesse: a da solidariedade, da empatia e do jogo de cintura. A cena da foliã de máscara cirúrgica no braço é constrangedora, passando uma mensagem desafinada em relação ao momento. Se queremos mesmo vencer a pandemia, e sair da longuíssima Quarta-feira de Cinzas a que fomos submetidos, o respeito às regras é fundamental. Soa hipócrita, para dizer o mínimo, um dia defender a manutenção do necessário rigor contra o vírus, criticando quem não usa máscaras em shoppings, e no outro postar fotos da farra ao lado de dezenas de pessoas. Nem tudo é Carnaval.
Publicado em VEJA de 9 de março de 2022, edição nº 2779