No acampamento ao redor dos escombros, clima é de incerteza
Em meio ao sumiço das lideranças do movimento que liderava a ocupação irregular do prédio, desabrigados contam com a solidariedade dos paulistanos
Por Marcella Centofanti
Atualizado em 3 Maio 2018, 09h12 - Publicado em 2 Maio 2018, 14h21
O cheiro de queimado chega à entrada do Sesc 24 de Maio, localizado no Centro de São Paulo. “É de lá, ó”, aponta o segurança em direção a uma fumaça que exala do Largo do Paissandu, no fim da rua. Quanto mais se avança em direção ao gás fumegante, a dois quarteirões dali, maior o odor. A fumaça vem de uma pilha de mais de 10 metros de escombros do que era o Edifício Wilton Paes de Almeida. O prédio pegou fogo e desmoronou na madrugada de terça-feira, deixando desabrigadas 150 famílias que o ocupavam irregularmente.
A área está isolada por cordões. Somente bombeiros, policiais, jornalistas e funcionários da prefeitura e de ONGs têm acesso. Na calçada, curiosos se aproximam quanto podem, na tentativa de ver com os próprios olhos e a câmera do celular o cenário da tragédia que abalou os brasileiros que acordaram no feriado do Dia do Trabalho.
Sobreviventes do incêndio espremem-se ao redor da Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos. Trata-se de um templo católico de fachada amarela, e não a centenária Igreja Evangélica Luterana, que foi atingida pelas chamas e veio abaixo.
Acampados em barracas doadas por voluntários, colchões, cobertores e papelão, as pessoas fazem o que chamam de resistência. “A prefeitura quer nos mandar para abrigos. Eu não sou moradora de rua. Tinha uma casa com geladeira, fogão, cama, televisão e guarda-roupa. O que vou fazer num albergue, separada do meu marido e da minha neta?”, pergunta a vendedora ambulante Fabiana Ribeiro, de 38 anos, que morava no 1º andar do prédio com o marido de 24 anos, a filha de 17 e a neta de 2. Para ela, a prefeitura quer enviar os desabrigados para albergues para se livrar do problema. “Nunca mais vão fazer nada pela gente.”
Continua após a publicidade
Doações não param de chegar. Pessoas trazem roupas, cobertores, produtos de higiene pessoal, comida e agua. Uma mulher que trouxe roupas usadas pergunta de que eles precisam. “De tudo”, reponde Fabiana. “Eu saí com a roupa do corpo. Nem os documentos peguei.” A filantropa pega na mão da desabrigada e diz: “Sinto muito por você”.
A ausência dos movimentos sem-teto
Um tema de controvérsia é o sumiço dos líderes do Movimento de Luta Social por Moradia (MLSM), responsáveis pela ocupação irregular do prédio. Segundo moradores, o movimento arrecadava mensalmente uma taxa para a manutenção do imóvel. Cada família pagava de 220 a 300 reais por mês, destinados a limpeza, luz e água. Quem fazia a cobrança era uma espécie de síndica, a quem se referem como Dona Nil. Ela não é vista entre os moradores desde o acidente, assim como a pessoa apontada como presidente do movimento, identificado como Ananias.
Quem conhece o paradeiro de Ananias não quer revelar. “Para que você quer saber disso?”, perguntam à reportagem. Já moradores têm medo de represália e evitam entrevistas quando o tema é a liderança do movimento. “Vá perguntar isso pra lá”, desconversam, apontando qualquer lado. “Só quem ajuda a gente é a população. A prefeitura não quer saber e as lideranças sumiram”, diz a vendedora Fabiana Ribeiro, que ocupa uma barraca com o marido. A filha e a neta de 2 anos foram para a casa de uma pessoa desconhecida que ofereceu abrigo à criança e à mãe adolescente enquanto um teto não vem.
*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.
PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis CLIQUE AQUI.