Black Friday: Assine a partir de 1,49/semana
Continua após publicidade

Novo Índice Legisla Brasil: maioria dos deputados tem atuação frustrante

Em uma Câmara renovada, levantamento mostra que apenas quarenta dos 513 parlamentares receberam a avaliação máxima pelo trabalho

Por Bruno Caniato Atualizado em 4 jun 2024, 10h11 - Publicado em 3 nov 2023, 06h00

Quando a nova Câmara emergiu das urnas em 2022, o sentimento era de muita expectativa, uma vez que 40% da casa havia sido renovada pelos eleitores. Perto de terminar o primeiro ano da nova legislatura, no entanto, o desempenho dos parlamentares pode ser considerado frustrante: na média, o trabalho deles recebeu nota 3,6 — em uma escala de 0 a 10 —, segundo o Índice Legisla Brasil, que monitora a performance dos eleitos com base em critérios como apresentação de projetos (e sua relevância) e atuação no acompanhamento do poder público. Na soma das análises de dezesseis variáveis, apenas quarenta dos 513 deputados receberam cinco estrelas, a avaliação máxima pelo trabalho.

Se não bastasse a média geral ruim, outras performances ficaram ainda mais aquém do desejado. Em fiscalização do governo, por exemplo, a nota foi de 1,5 — um desempenho preocupante em uma das funções primordiais do Legislativo. Um pouco acima da média, mas ainda baixas, ficaram as avaliações das atuações na produção legislativa (3,9) e em mobilização, que leva em conta, por exemplo, a ocupação de postos na burocracia da Casa (4,2).

arte-legisla-Brasil-iPhone

Entre os destaques individuais negativos do ranking estão os deputados que tiveram participação irrisória na rotina da Casa, limitaram-se a assinar projetos elaborados por colegas e atuaram de maneira reativa às pautas em discussão. A lanterna ficou com Vinicius Gurgel (PL-AP), que exerce o seu quarto mandato. Desde fevereiro, o vice-líder do partido contabiliza apenas 66 dias de presença no plenário, mais de 1 milhão de reais gastos em verbas de gabinete e zero projeto apresentado. Outro nome que chama atenção é o de Eunício Oliveira (MDB-CE), que presidiu o Senado de 2017 a 2019. Na sua volta à Câmara, o emedebista não ocupa cargos em comissões e apresentou só um projeto de lei, destinado a ressuscitar programa de renegociação de dívidas rurais de 2006 — conhecido, veja só, como “Lei Eunício Oliveira”.

Na ponta oposta do ranking, os mais bem posicionados se destacam pelo desempenho satisfatório em todos os aspectos do trabalho legislativo. A deputada mais bem avaliada foi Laura Carneiro (PSD-RJ), parlamentar já no sexto mandato e vice-líder do segundo maior bloco. Ela obteve nota máxima em nove das dezesseis variáveis. Apresentou nada menos que 47 PLs e foi um dos três deputados que conseguiram ver uma proposta sua virar lei no atual mandato (a que transforma assédios sexual e moral em infrações ao Estatuto da Advocacia). Também foi bem em mobilização política ao participar de dez comissões durante a atual legislatura.

Continua após a publicidade
2D-ABRE—-img20230809213325418.jpg
A MELHOR - Laura Carneiro (PSD-RJ): no sexto mandato, a deputada foi bem na fiscalização e aprovação de projetos (Bruno Spada/Câmara dos Deputados)

O melhor indicador obtido pelos parlamentares é também um bom símbolo do perfil do atual mandato. Os deputados conseguiram 7,4 em alinhamento partidário, que avalia o comportamento de cada um em relação a seus partidos. O número reflete a organização da Câmara em grandes grupos partidários — existem atualmente dois superblocos, que reúnem 317 deputados. Também pesou a menor pulverização da instituição: as cadeiras estão distribuídas por dezenove legendas, enquanto na legislatura anterior eram trinta.

Considerando-se o comportamento dos partidos, chama atenção no levantamento o caso do PL, a maior bancada da Casa, com 98 parlamentares. A legenda tem doze deputados entre os quarenta que obtiveram cinco estrelas, mas tem também cinco dos dez piores. A sigla está praticamente isolada na oposição a Lula e vive divisão interna entre bolsonaristas e gente ligada ao antigo Centrão. O baixo índice de aprovação de projetos e a falta de coesão dentro derrubaram o PL para o nono lugar no ranking geral de partidos. O alto número de parlamentares bem avaliados se deve à natural maior movimentação de quem está contra o governo de plantão. “O PT tinha a mesma proporção de deputados cinco estrelas em 2022 que o PL tem hoje. Os parlamentares de oposição são, naturalmente, mais atuantes do que os governistas”, diz Luciana Elmais, cofundadora e diretora-executiva da Legisla Brasil.

Continua após a publicidade
2D-(2)—img20230620163340522.jpg
UM DOS PIORES - Eunício Oliveira (MDB-CE): ex-chefe do Senado tem atuação decepcionante na sua volta à Câmara (Bruno Spada/Câmara dos Deputados)

O trabalho dos atuais deputados na proposição dos projetos repete o mesmo erro de outras legislaturas: um grande esforço que acaba produzindo muita fumaça e pouco calor. Desde o início do ano, os parlamentares apresentaram 4 561 projetos, dos quais apenas 43 foram aprovados. Entre eles o de terça-feira 31, do deputado Kim Kataguiri (União-SP), que aumentou a punição para quem comete furtos e roubos — o furto de celular, por exemplo, poderá render até dez anos de cadeia. Dos onze projetos de lei que viraram norma jurídica na atual gestão — ou seja, foram sancionados e estão efetivamente valendo —, sete vieram do Executivo e apenas um do Judiciário.

Por várias circunstâncias, a avaliação de um trabalho parlamentar é sempre uma tarefa difícil. Uma das dificuldades é tirar o viés ideológico no olhar sobre o trabalho, um dos princípios que norteiam a atuação do Legisla Brasil. Para tentar fazer a análise de forma neutra, o grupo lançou mão de um grande número de indicadores objetivos analisados por 27 especialistas de diversas áreas e que resultou no índice criado pela entidade e por Olívia Carneiro, economista formada pela USP, com mestrado na Universidade de Chicago — e influencer com meio milhão de seguidores no TikTok. A ONG também faz hoje consultoria direta a mais de oitenta gabinetes parlamentares de dezenove partidos políticos, do PT ao Novo. Em julho, lançou o seu primeiro programa voltado ao desenvolvimento de lideranças partidárias e um guia on-line para subsidiar a atuação de vereadores, deputados e senadores.

Continua após a publicidade
2D-(3)-1689682718228.jpeg
META - Luciana Elmais, do Legisla Brasil: ideia é qualificar o Parlamento (./Reprodução)

Vale ressaltar que a decepcionante performance individual dos deputados não se confunde com a da instituição. Em pouco mais de nove meses, a Câmara aprovou projetos importantes como a reforma tributária, o arcabouço fiscal, a desoneração da folha de pagamento e programas sociais como o Bolsa Família, o Minha Casa, Minha Vida e o Mais Médicos. Toda essa pauta, no entanto, veio do Executivo e quase sempre foi tocada às custas de muita negociação política e, não raro, oferecimento de cargos e liberação de emendas. Para 2024, estão previstos quase 40 bilhões de reais para gastos indicados pelos parlamentares, o que significa um quarto do dinheiro para aplicação livre de que o governo dispõe no Orçamento. “Isso mostra uma tendência cada vez maior de aumento do poder do Parlamento e a retirada de prerrogativas que são tradicionalmente do Poder Executivo”, avalia o cientista político José Álvaro Moisés, da USP.

Embora as grandes votações mobilizem mais e ocupem tempo maior das agendas legislativas, é bom os deputados preocupa­rem-se com seus desempenhos individuais. Entre os 41 que foram avaliados como cinco estrelas na legislatura anterior, 36 conseguiram novo mandato — uma taxa de 88%, contra 57% de reeleitos no geral. Para o Legisla Brasil, isso sugere que o trabalho efetivo no Congresso gera bons frutos para a sociedade e para os parlamentares. “Existe um pensamento comum de que campanha eleitoral e pautas ideológicas geram mais votos do que a produtividade. As estatísticas comprovam que isso é um mito”, diz Luciana Elmais. Outra constatação: o ranking dos cinco estrelas inclui deputados de quinze partidos de diferentes posições ideológicas, o que indica que pode haver bons legisladores em todo o espectro político. As fotografias recentes da Câmara, em que pese alguma decepção, mostram bons caminhos a seguir. E o eleitor, ao contrário do passado recente, parece mais atento.

Publicado em VEJA de 3 de novembro de 2023, edição nº 2866

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (menos de R$10 por revista)

a partir de 39,96/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.