Embate entre favoritos à presidência da Câmara ganha força nos bastidores
Em uma disputa subterrânea, eles costuram alianças e fazem acenos simultaneamente ao governo e à oposição
O deputado federal Marcos Pereira fez uma festa em Brasília para comemorar seu aniversário. Esse tipo de evento serve para aferir a dimensão da importância e o nível de influência de determinados personagens. E foi o que aconteceu. Na quarta-feira 10, a nata do Congresso Nacional passou pelas tendas montadas numa casa emprestada ao aniversariante por um empresário amigo. Pelo lado do governo, marcaram presença nada menos que onze ministros, entre eles, Fernando Haddad (Fazenda), Alexandre Padilha (Relações Institucionais), Ricardo Lewandowski (Justiça) e Jorge Messias (Advocacia-Geral da União), além do vice-presidente, Geraldo Alckmin. Do Judiciário, compareceram os ministros do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes e Dias Toffoli. Lula não foi, mas enviou uma mensagem parabenizando o parlamentar. O anfitrião, como se sabe, é pré-candidato à presidência da Câmara, eleição que envolve grandes interesses e vai refletir de alguma forma em praticamente tudo o que for debatido no Legislativo de agora em diante.
Não por acaso, todos os demais pré-candidatos também marcaram presença na festa, circulando em meio a petistas, bolsonaristas, socialistas, católicos, evangélicos, enfim, representantes de todos os espectros políticos. O quórum, alto e qualificado, não deixou dúvida sobre o prestígio do aniversariante, atual presidente do Republicanos, partido que tem 43 deputados e quatro senadores e ocupa um ministério no governo Lula. Naquele dia, a Câmara havia decidido manter a prisão do deputado Chiquinho Brazão, acusado de envolvimento no assassinato da vereadora Marielle Franco. O assunto, claro, dominou as rodas de conversa. Em várias delas, parlamentares analisavam os reflexos do resultado da votação na pré-candidatura do deputado Elmar Nascimento (União Brasil-BA). Apontado hoje como favorito, ele defendeu a libertação de Brazão. A derrota teria mostrado que a força do parlamentar é menor do que se imaginava — diagnóstico, aliás, que se espalhou como intriga e deu origem a uma crise política.
Elmar é um político habilidoso, tem excelentes relações com boa parte dos deputados, mas muito do seu favoritismo é creditado à proximidade com Arthur Lira, o atual presidente da Câmara. Para alguns, a derrota do parlamentar baiano no caso Brazão foi uma derrota do próprio Lira, que não gostou nada dessa associação e disse que ela foi “plantada” pelo ministro das Relações Institucionais, a quem chamou de “incompetente”. Desde o início do governo Lula, Lira e Padilha travam uma queda de braço. O deputado suspeita que o ministro tenta minar seu poder. O ministro suspeita que o deputado quer o lugar dele. Com a aproximação das eleições na Câmara, a troca de acusações se intensificou, apesar de o governo já ter afirmado e reafirmado que não pretende interferir nem tomar partido contra ou a favor de nenhum dos postulantes ao cargo. Ninguém, evidentemente, acredita nisso.
Além de Elmar e Marcos Pereira, há dois outros pré-candidatos ao posto: os deputados Antonio Brito (PSD-BA) e Isnaldo Bulhões (MDB-AL). A disputa para valer, no entanto, hoje parece restrita aos dois primeiros. Bispo licenciado da Igreja Universal, Pereira conta com uma discreta simpatia do governo. Elmar, por ser considerado um fiel aliado de Arthur Lira, é visto pelo Planalto com mais ressalvas. Ambos são ex-aliados de Jair Bolsonaro. Ambos agora buscam apoio do Planalto. No início do governo, o candidato do União Brasil chegou a ser confirmado para compor a equipe ministerial. O deputado, como dizem em Brasília, já tinha até comprado o terno da posse, quando foi “desconvidado”. Ele sabe de onde partiu o veto, mas garante que não guarda mágoas. Pereira, por sua vez, tem recebido certos sinais. Em fevereiro, foi convidado a acompanhar Lula no avião presidencial em uma viagem a São Paulo, uma deferência concedida pelo mandatário a poucos.
Embates políticos, especialmente os mais importantes, quase sempre são permeados por intrigas. Nos últimos dias, circulou no Congresso a informação de que os dois principais postulantes estariam em rota de colisão devido aos acenos que Pereira tem feito ao governo, e vice-versa. Elmar se apressou em afastar os rumores. Segundo ele, por serem aliados e amigos, os dois já teriam combinado uma estratégia para evitar um enfrentamento direto. Quem conseguir montar o maior arco de alianças será candidato único. Isso evitaria um confronto “sangrento”. Elmar conta que, além do União Brasil, tem hoje o apoio de sete partidos, que somariam cerca de 200 deputados dos 513. Indagado por VEJA, Marcos Pereira disse desconhecer esse acordo. “Meu nome estará na eleição como candidato à presidência da Câmara. Se for necessário ter disputa, vamos para a disputa”, afirmou.
Publicado em VEJA de 19 de abril de 2024, edição nº 2889