Datas: Ryan O’Neal, Juanita Castro e Gao Yaojie
O ator, a irmã de Fidel e a mulher que foi uma voz necessária na China

A vida do ator americano Ryan O’Neal daria um filme — ou vários, dado o vaivém de sua existência, feito de quedas e recuperações. Filho de uma atriz e de um roteirista de cinema, ele começou a vida adulta como lutador de boxe, um meio de extravasar sua permanente irritação. Em tempo de calma, caía-lhe bem um personagem romântico como o Oliver de Love Story, sucesso de 1970, um Romeu e Julieta moderno. Como pai, poderia ser o Moses Pray de Lua de Papel, de 1973, no qual contracenou com a filha Tatum. Ela, aliás, conquistou o Oscar de melhor atriz pelo trabalho, aos 10 anos de idade. Soaria mais adequado, contudo, o protagonismo em produções violentas, de pancadaria. O’Neal nunca escondeu a postura mercurial, que o levaria diversas vezes a ser detido, seja por violência, seja por envolvimento com drogas.
Não seria exagero dizer que, em Hollywood, seu desequilíbrio no cotidiano era tão famoso quanto a infinita capacidade de mudar de estilo diante das câmeras. Levado ao ostracismo — tê-lo por perto era encrenca na certa —, foi recuperado para a fama ao ser convidado pelo britânico Stanley Kubrick para estrelar Barry Lyndon, clássico de 1975. Nele, O’Neal incorpora um aventureiro inglês do século XVIII condenado ao degredo. Mas ele volta, fingindo-se aristocrata. Voltar era o que O’Neal fez desde sempre, em meio a dramas familiares. Admitiu, certa vez, ter assediado a própria filha Tatum — a quem não reconheceu, drogado e alcoolizado, ao sair do velório de uma ex-mulher. Com Farrah Fawcet, com quem conviveu 24 anos, meteu-se em brigas homéricas. Um filho, Griffin, dirigia a lancha que, em 1986, provocou a morte do primogênito de Francis Ford Coppola. Com Griffin, chegou a trocar tiros, ambos fadados ao eterno desencontro. O’Neal morreu em 8 de dezembro, aos 82 anos. Tinha uma leucemia, tratada durante muito tempo, mas morreu de câncer na próstata.
A irmã exilada

No início, ela ajudou com dinheiro que conseguiu amealhar nos Estados Unidos. Foi decisiva na construção de hospitais e escolas. Juntou-se aos barbudos. Contudo, pouco tempo depois da Revolução Cubana de 1959, Juanita Castro, irmã mais nova de Fidel, rompeu com o movimento. Dizia-se desgostosa com o andamento autoritário do que nascera como democrático. Irritou-se com a reforma agrária que alcançou inclusive terras da família. Em 1964, exilou-se em Miami. Ali começou a colaborar com a CIA. “Sofri mais do que o restante da população exilada, porque em nenhum lugar do Estreito da Flórida me dão trégua, e poucos são os que entendem o paradoxo da minha vida”, escreveu em seu livro de memórias. “Para quem ficou em Cuba, sou uma desertora porque saí e denunciei o regime. Para muitos em Miami, sou persona non grata, irmã de Fidel e Raúl.” Morreu em 4 de dezembro, aos 90 anos, mas a notícia só foi confirmada na semana passada.
Uma voz necessária

Nos anos 1990, no silêncio imposto pela ditadura da China, a ginecologista Gao Yaojie identificou a explosão do número de casos de aids nas regiões rurais do país. Depois de cruzar informações e ouvir milhares de envolvidos, ela descobriu a origem da contaminação: o vírus estava se espalhando em decorrência do descontrole dos centros de transfusão de sangue, que não faziam os testes necessários. Para o governo — em evidente postura negacionista —, apenas as relações sexuais levariam à contaminação. Em 2009, Yaojie foi forçada ao exílio, nos Estados Unidos. Suas denúncias, contudo, surtiram algum efeito — e a China tratou de modernizar seu sistema de saúde, movimento seguido por outros países. “A aids destruiu inúmeras famílias. Foi uma catástrofe provocada pelo homem. No entanto, as pessoas responsáveis por isso nunca foram responsabilizadas, nem proferiram uma única palavra de desculpas”, disse em 2016. Ela morreu em 10 de dezembro, aos 95 anos, em Nova York.
Publicado em VEJA de 15 de dezembro de 2023, edição nº 2872