Conheça o Código de Defesa do Consumidor Negro, lançado pela L’Oréal com dez normas de ‘efeito moral’
Companhia quer inspirar mercado de varejo a adotar como protocolo conjunto de regras, sem valor jurídico

Com apresentação do ator Lázaro Ramos, o Grupo L’Oréal no Brasil lançou, nesta terça-feira, 29, o Código de Defesa e Inclusão do Consumidor Negro, uma iniciativa inédita que traz dez normas para o enfrentamento do racismo no mercado de varejo. Embora os pontos incluídos não tenham valor jurídico, a ideia é que eles motivem ações e transformações em empresas do setor para além do que já é feito dentro da gigante do ramo da beleza. Desde janeiro, a L’Oréal adota as medidas como protocolo interno, numa forma de autorregulamentação antirracista. Durante o evento, no Shopping Leblon, um dos centros do consumo de luxo do Rio, Lázaro Ramos ressaltou que o código é um “chamado à construção de um mercado mais justo e equitativo”.
Ele leu depoimentos de consumidores negros que foram vítimas de racismo, muitas vezes silencioso e velado, em lojas. “A experiência de compra não pode ser mais um trauma. Não se pode aceitar mais essa realidade como normal, essas formas de atendimento como padrão”, afirmou o artista, acrescentando que é preciso “dar um basta”. Entre os pontos do código, transformado em livro e desenvolvido em colaboração com a Black Sisters in Law (que conecta advogadas negras no Brasil e no exterior), estão capacitação antirracista para funcionários e colaboradores; prontidão no atendimento; garantia de livre acesso e circulação; regras para revista e disponibilidade de produtos para pessoas negras.

As normas foram desenvolvidas a partir das respostas da pesquisa “Racismo no Varejo de Beleza de Luxo”, que identificou e nomeou 21 práticas racistas nas relações com o consumidor negro, como o olhar julgador e o tratamento com desdém. O levantamento foi encomendado pela empresa dentro do programa “Afroluxo”, criado pela companhia no ano passado para o combate ao racismo no mercado de luxo brasileiro. “Essa pesquisa rompe o silêncio do racismo dentro do mercado de luxo”, destaca Bianca Ferreira, head de Comunicação e Diversidade, Equidade e Inclusão da L’Oréal Luxo. “Não é necessário que essas normas virem lei, que tenham validade jurídica, para que sejam implementadas. Essas medidas estão ao alcance de qualquer empresa que deseje ser intencional no combate às práticas racistas”, explica ela. Logo na capa do livro, lê-se: “Uma obra sem efeito jurídico, mas com efeito moral”.
O CEO do Grupo L’Oréal no Brasil, Marcelo Zimet, e a diretora-geral da Divisão de Luxo da companhia, Marina Torres, abriram o evento. Em seguida, houve debate mediado por Lázaro Ramos que contou com a presença de Bianca Ferreira e também de Eduardo Paiva, diretor de Diversidade, Equidade e Inclusão do Grupo L’Oréal no Brasil; Nathalia Paiva, diretora-executiva do Movimento pela Equidade Racial (Mover); Dione Assis, fundadora da Black Sisters in Law; e de Mulambo, artista que ilustrou o código. Na plateia, chamava a atenção uma presença ilustre: a da escritora Conceição Evaristo. Para ela, o corpo negro e mestiço ainda é tratado como “exceção” e estética não pode ser desvinculada de política no Brasil. “Para além da discussão do mercado, tem o posicionamento político enquanto uma nação tão diversa como a nossa”, afirmou.
Confira as normas do código para estabelecimentos:
- Capacitar funcionários e colaboradores por meio de letramentos raciais e treinamentos, com mínimo de 6h anuais.
- É dever do estabelecimento agir com presteza no atendimento ao consumidor negro. Vendedores e atendente deverão ser orientados a dispor pronto atendimento.
- É vedado impor quaisquer barreiras, físicas ou simbólicas, que restrinjam o acesso do consumidor negro aos produtos expostos e disponíveis aos clientes, bem como limitar sua livre circulação e permanência.
- É dever agir com cautela ao abordar o consumidor negro. A abordagem deve ocorrer somente mediante a existência de provas inequívocas e apresentadas antes de qualquer revista.
- Adotar medidas inclusivas que promovam a contratação de funcionários negros.
- Atendimento ao consumidor negro com respeito e dignidade, vedadas formas de tratamento discriminatório, incluindo comunicações estereotipadas ou ofensivas.
- Informações sobre preços e condições de pagamento devem ser disponibilizadas de forma clara, acessível e adequada. Vedado ao atendente informar verbalmente o preço de um produto sem solicitação prévia.
- Garantir representatividade na publicidade.
- Estabelecimentos que comercializem itens de beleza têm a obrigação de manter estoque adequado e suficiente de produtos atendendo às características específicas de consumidores negros, incluindo diferentes tonalidades de pele e tipos de cabelo.
- Esses estabelecimentos de itens de beleza devem adotar medidas inclusivas, entre elas capacitação técnica com formação e especialização para atendimento do consumidor negro.