Como a prisão de miliciano nº 1 do Rio pode desvendar o caso Marielle
Zinho, que se entregou à Polícia Federal na véspera do Natal, está preso em Bangu 1

A prisão do criminoso mais procurado do Rio, Luís Antônio da Silva Braga, conhecido como Zinho, na véspera do Natal, representa um duro golpe no poderio das milícias cariocas – estima-se que elas já controlem 25,5% dos bairros da cidade, em um total de 57,5% do território. Mas não apenas isso. Por trás da negociação que fez com que o bandido se entregasse à polícia pode estar a solução de um crime que chocou o país e está há quase seis anos com várias perguntas sem respostas. A grande expectativa é que o chefão da maior milícia carioca, que domina a Zona Oeste e várias regiões da Baixada Fluminense, contribua com informações que levem, enfim, ao mandante dos assassinatos da vereadora Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes.

A negociação entre a defesa do criminoso e a Secretaria de Segurança Pública fluminense para sua rendição, que teve o conhecimento do governador Cláudio Castro, durou uma semana. Um dos indícios que apontam para o fato de Zinho ser uma peça-chave no caso do duplo homicídio é a declaração do ex-ministro da Justiça e futuro ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Flávio Dino, em meio às tratativas entre as duas partes. No último dia 21, ao fazer um balanço da sua gestão na pasta, Dino afirmou que o país estava mais próximo de conhecer os mandantes do crime envolvendo a parlamentar: “Afirmo, com a autoridade de quem acompanha a evolução neste ano pretérito, que haverá solução do caso Marielle e Anderson. Demos a diretriz e ela será cumprida. A Polícia Federal tem uma equipe dedicada a isso”.
Outro fato, aliás, que chama atenção no acordo feito entre o miliciano e as autoridades é que Zinho se entregou na sede da Superintendência da Polícia Federal do Rio e não em uma unidade da Polícia Civil, o que seria o natural. A segurança do criminoso, que já passou por uma audiência de custódia na terça-feira, dia 26, e está na Penitenciária Laércio da Costa Pelegrino, conhecida como Bangu 1, é prioridade para o governo. Já se cogita, inclusive, a sua transferência para um presídio de segurança máxima fora da capital fluminense.
Tanta precaução pode ser explicada pela expectativa em torno das informações que o miliciano carrega. Zinho se entregou à polícia seis dias após a PF e o Ministério Público terem deflagrado a Operação Batismo, que tinha como alvo principal a deputada estadual Lúcia Helena Pinto de Barros (PSD), conhecida como Lucinha. As investigações apontaram que a parlamentar integrava o braço político do grupo paramilitar liderado pelo miliciano — que controla serviços básicos (luz, gás, transporte, entre outros), além de impor taxas a moradores e comerciantes da Zona Oeste e Baixada do Rio. Nessa mesma operação, havia 12 mandados de prisão, um deles tendo o subtenente da Polícia Militar Antonio João Vieira Lázaro como alvo.
Integrante do grupo de Zinho, Lázaro teve seu nome envolvido nas investigações do assassinato da vereadora Marielle Franco, quando foi citado pelo miliciano Orlando Oliveira de Araújo, o Orlando Curicica, como participante de um encontro com os líderes do Escritório do Crime, para encomendar a morte. O policial militar é ex-assessor de Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE).
Curicica afirmou, durante as investigações do caso Marielle, em depoimento à Polícia Federal e a procuradores da República, colhido no presídio federal de Mossoró, no Rio Grande do Norte, ter participado de um encontro com o major da PM Ronald Paulo Alves Pereira, um dos chefes do grupo de matadores conhecido como Escritório do Crime. Nessa reunião, realizada em 2017, no Mirante do Roncador, no bairro do Recreio dos Bandeirantes, no Rio, estavam presentes Curicica e Ronald, além de Hélio Paulo Ferreira, conhecido como Senhor das Armas, e o policial militar Lázaro, do bando de Zinho.
O ministro interino da Justiça, Ricardo Cappelli, já deixou transparecer que está confiante no potencial de informações que o líder da maior milícia do Rio tem. Ele afirmou que só a questão de Zinho ter permanecido no Rio ao longo dos cinco anos em que esteve foragido já demonstra o quanto tem a falar. “Ele não estava na Tailândia. Durante a maior parte desse tempo estava na casa dele. Só a rede de proteção de que desfrutou ao longo desse tempo mostra o quanto tem a falar”, comentou. Cappelli também disse acreditar que as mortes, em confrontos com a polícia, de seu irmão Wellington da Silva, o “Ecko”, e de seu sobrinho Matheus Rezende, o “Faustão”, que estiveram na liderança da milícia que comanda hoje, foram decisivas no acordo que levou o miliciano a se entregar à PF. Há informações ainda de que uma possível delação premiada de Zinho também teria feito parte da negociação.