Como a nova federação de PP e União Brasil será peça-chave para as eleições de 2026
O novo gigante da centro-direita nasce como alternativa tanto à esquerda quanto à hegemonia do PL na direita

Um concorrido evento no Salão Negro da Câmara dos Deputados, na tarde de terça-feira 29, sacramentou um dos acontecimentos mais relevantes até aqui na pré-corrida eleitoral para 2026. Na presença de pesos-pesados da política nacional como os presidentes da Câmara e do Senado, ministros, governadores e caciques de ao menos cinco partidos, nasceu, após meses de intensa negociação, a União Progressista, federação formada pelo PP e União Brasil, que passa a ser a principal força do Congresso (veja o quadro). Embora as duas legendas tenham assentos na Esplanada, os discursos e o manifesto de lançamento deixaram claro que o movimento é de divórcio. Houve críticas à “economia que patina” e propostas de uma “reforma modernizadora do Estado”, com o livre mercado e o capital privado como motores do crescimento. Houve, ainda, a defesa da responsabilidade fiscal, da necessidade de reduzir a dependência da população dos programas sociais, com a inclusão econômica dos beneficiários, e a defesa de que o Estado não pode mais ser um “obstáculo” a um “choque de prosperidade”. E, o mais significativo: não houve nenhuma menção que não fosse em tom de crítica ao governo Lula.

O peso político dá à União Progressista um papel relevante na discussão da centro-direita para 2026. A opção do bloco por um caminho independente do governo pôde ser demonstrada com o destaque dado ao único presidenciável do grupo hoje, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, crítico de Lula e um dos primeiros a falar no evento, quando enfatizou a possibilidade de o seu campo político vencer a corrida ao Planalto. A sua candidatura enfrenta dificuldades para conseguir consenso, mas ele ganhou da federação um gesto de boa vontade: ficou estabelecido que terá até o início do ano que vem para ultrapassar o patamar de 10% das intenções de votos para se viabilizar internamente — considerando-se as pesquisas recentes, nas quais pontua longe desse patamar, poucos acreditam que a candidatura vai decolar. No rol de possibilidades da nova entidade partidária, estão outros governadores tidos como potenciais presidenciáveis, como Romeu Zema (Minas Gerais), Ratinho Jr. (Paraná) e, principalmente, Tarcísio de Freitas (São Paulo).
Nenhum desses governadores é da União Progressista, mas isso não é um problema, pois a federação pode perfeitamente compor a chapa presidencial com um nome na posição de vice. O poder de atração dela é tão grande que no seu lançamento estavam o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos), e o governador Helder Barbalho (MDB), cotado a presidenciável ou vice de Lula em 2026. Segundo Ciro Nogueira, que preside o PP e será um dos presidentes da nova agremiação, junto com Antonio Rueda (cacique do União Brasil), o movimento está só no começo. “Essa federação pode ser ainda maior. Estamos discutindo com outros partidos que podem ser incorporados”, disse Ciro ao programa Ponto de Vista, de VEJA.
Entre os grandes partidos de centro-direita ausentes no evento, o que mais chamou a atenção foi o PSD. Mas isso não quer dizer que a sigla não esteja no mesmo espectro de articulações para 2026. Naquele dia, em dois eventos em São Paulo, o chefe da legenda, Gilberto Kassab, disse que o PSD apoiará qualquer um dos nomes de centro-direita em eventual segundo turno contra Lula. “Não dá para imaginar que o PSD não vá apoiar o Ratinho, o Caiado, o Zema, o Tarcísio, o Eduardo Leite”, disse. E completou dizendo que o governador de São Paulo é o único que pode unificar a direita, já que o ex-presidente Jair Bolsonaro, inelegível, dificilmente conseguirá viabilizar seu nome. “Se o Tarcísio for candidato, a centro-direita não lança nenhum outro nome”, afirmou.
Com o governo Lula brigando para estancar a queda de popularidade, em meio a um grave escândalo envolvendo desvios no INSS (veja a reportagem na pág. 26), ficam cada vez mais claros os sinais de que o apoio do centro ao governo vai derreter. “Não tenho dúvida que isso vai acontecer”, diz Ciro Nogueira. Com o novo peso que ganhou no Congresso, a federação pode criar mais problemas ao governo, que já enfrentava muitas dificuldades no Parlamento. A junção União Brasil-PP tem força para ser o fiel da balança em votações de pautas que podem atingir diretamente os interesses do governo, como a criação de uma CPI para apurar desvios no INSS e a tramitação do projeto de isenção de imposto de renda para quem ganha até 5 000 reais por mês — neste caso, o próprio Ciro Nogueira tem um projeto alternativo, que agora pode ser priorizado em detrimento da proposta do Executivo. “Não é uma boa notícia para o governo porque isso vai unindo e compactando a oposição”, avalia o cientista político Jairo Nicolau, pesquisador da FGV/CPDOC e autor de Multipartidarismo e Democracia.

Lula, certamente, tentará fazer uma política de varejo e manter o apoio de ao menos parte da federação. Um aliado de peso é o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), que vem atuando como um contraponto a iniciativas da oposição (veja a reportagem na pág. 40). Ele indicou três ministros para a Esplanada: Celso Sabino (Turismo), Waldez Góes (Integração e Desenvolvimento Regional) e o último deles, Frederico de Siqueira Filho, que assumiu a pasta de Comunicações após a recusa do líder da bancada do União Brasil na Câmara, Pedro Lucas Fernandes (MA), em episódio vexaminoso que mostrou a relação difícil do União Brasil com o governo. Mesmo próximo de Lula, Alcolumbre foi ao lançamento da federação e, ao discursar, defendeu que a unificação dos partidos suplante as divergências regionais e as predileções pessoais.
As diferenças, é verdade, não são poucas. A presidência da federação, por exemplo, será exercida inicialmente em conjunto por Ciro e Rueda, já que não houve consenso na proposta que previa alternância entre representantes de cada legenda. Há divergência entre lideranças em nível estadual, que atravancam as discussões em torno da definição sobre quem serão os candidatos em 2026. Durante as conversas, a intenção era que os 27 diretórios seriam divididos em três blocos, sendo nove para cada partido e nove conduzidos pela Executiva Nacional. Mas o impasse foi tão grande que a federação foi lançada sem que houvesse uma definição formal de quem seriam os líderes em cada estado.

A criação da União Progressista segue um movimento que vem tomando corpo nos últimos anos não só no Brasil, mas em outras democracias relevantes do mundo, que é o de reaglutinação das forças políticas em poucos e grandes partidos. No caso nacional, seria uma rearrumação do cenário após a explosão de partidos que ocorreu depois da redemocratização, quando o país chegou a ter mais de quarenta siglas. Como parte desse movimento, PSDB e Podemos anunciaram nesta semana que estão a um passo de se fundirem em uma só legenda. O processo de aglutinação não se resume à direita. PSOL e Rede formaram uma federação para escapar da cláusula de barreira, e o PT fez o mesmo movimento para salvar PCdoB e PV. Para o cientista político Alberto Carlos Almeida, isso tem a ver com o instinto de sobrevivência. “Os partidos estão percebendo que as disputas estão se fechando cada vez mais em poucas e grandes legendas”, diz. O novo gigante da centro-direita nasce como alternativa tanto à esquerda quanto à hegemonia do PL na direita e dá início a uma nova etapa do jogo eleitoral para 2026.
Publicado em VEJA de 2 de maio de 2025, edição nº 2942