Bolsonaro é acusado de racismo por frase em palestra na Hebraica
Duas representações são encaminhadas à Procuradoria-Geral da República em razão de crítica a negro quilombola; ‘nem para procriar ele serve mais’, disse
Dez parlamentares do PT e uma do PCdoB e a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) entraram nesta quinta-feira com duas representações na Procuradoria-Geral da República pedindo a abertura de investigação contra o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) pelo crime de racismo em razão de comentários feitos durante uma palestra na sede da Hebraica, no Rio de Janeiro, na última segunda-feira.
O ponto em comum nas duas representações são os ataques a indígenas e quilombolas (descendentes de escravos) – o parlamentar prometeu, caso seja eleito presidente da República em 2018, acabar com todas as demarcações de terra para essas comunidades. “Pode ter certeza de que, se eu chegar lá, não vai ter dinheiro pra ONG (..). Não vai ter um centímetro demarcado para reserva indígena ou para quilombola. Onde tem uma terra indígena, tem uma riqueza embaixo dela. Temos que mudar isso daí”, afirmou.
Ele também fez crítica aos quilombolas. “Eu fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas (arroba é uma medida usada para pesar gado; cada uma equivale a 15 kg). Não fazem nada. Eu acho que nem para procriador ele serve mais. Mais de R$ 1 bilhão por ano é gasto com eles”, disse, sob risos da plateia de cerca de 300 pessoas.
Na representação, a Conaq diz que Bolsonaro “compara um integrante de comunidade quilombola a um animal que tem sua massa corporal medida através de arrobas” e lembra que “durante mais de três séculos e meio, pessoas negras foram legalmente comercializadas como escravas no Brasil, comercializadas inclusive em função da massa corporal que ostentavam.”
Outras críticas
O deputado também criticou o acolhimento a refugiados pelo Brasil. “Não podemos abrir as portas para todo mundo”, disse. Mas não se mostrou avesso a todos os estrangeiros. “Alguém já viu algum japonês pedindo esmola? É uma raça que tem vergonha na cara!”, afirmou.
Em outra frase polêmica, ele prometeu revogar o Estatuto do Desarmamento e incentivar o armamento da população. “Se depender de mim, todo cidadão vai ter uma arma de fogo dentro de casa”, afirmou.
Mesmo quando pretendeu descontrair a plateia, o deputado provocou polêmica, como ao falar dos seus cinco filhos. “Foram quatro homens, na quinta, dei uma fraquejada e veio uma mulher”, afirmou, novamente sob risos da plateia.
Protesto
Bolsonaro deu palestra na Hebraica do Rio depois de ter a sua participação cancelada em evento na Hebraica de São Paulo, após protestos de parte da comunidade judaica. No evento do Rio, o deputado também foi recebido com protestos – cerca de 150 pessoas fizeram uma manifestação do lado de fora.
O parlamentar ironizou. “O pessoal aí embaixo [manifestantes] eu chamo de cérebro de ovo cozido. Não adianta botar a galinha, porque não vai sair pinto nenhum. Não sai nada daquele pessoal”, afirmou. Foi aplaudido.
Na representação, os parlamentares pedem quem, além da condenação por racismo, o deputado seja processado por improbidade administrativa (por violação aos princípios da administração pública) e que que seja proposta contra ele também uma ação de reparação moral por danos coletivos pela violação da dignidade das populações indígenas e comunidades quilombolas.
Assinaram a representação os senadores Gleisi Hoffmann (PT-PR), Humberto Costa (PT-PE) e Paulo Rocha (PT-PA) e os deputados federais Benedita da Silva (PT-RJ), Maria do Rosário (PT-RS), Vicentinho Paulo da Silva (PT-SP), Paulo Fernando dos Santos (PT-AL), Wadih Damous (PT-RJ), Erika Kokay (PT-DF), Carlos Zarattini (PT-SP) e Jandira Feghali (PCdoB-RJ).
Procurada, a assessoria de Bolsonaro disse que ele iria se manifestar por meio de suas redes sociais, o que não havia feito até as 21h40 desta quinta-feira.
Incitação ao estupro
Em março deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou, por unanimidade, todos os recursos de Bolsonaro em dois processos e manteve o parlamentar como réu pela suposta prática dos delitos de incitação ao crime de estupro e injúria contra a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS).
Em discurso no plenário da Câmara dos Deputados, em dezembro de 2014, Bolsonaro, durante discussão com a parlamentar gaúcha, disse que a deputada “não merecia ser estuprada”. No dia seguinte, segundo a acusação, em entrevista ao jornal Zero Hora, Bolsonaro reafirmou as declarações, dizendo que Maria do Rosário “é muito feia, não faz meu gênero, jamais a estupraria”.
Veja as frases polêmicas de Bolsonaro:
Se eu chegar lá, não vai ter dinheiro pra ONG (..). Não vai ter um centímetro demarcado para reserva indígena ou para quilombola.
Eu fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada. Eu acho que nem para procriador ele serve mais.
Não podemos abrir as portas para todo mundo (…) Alguém já viu algum japonês pedindo esmola? É uma raça que tem vergonha na cara!
Se depender de mim, todo cidadão vai ter uma arma de fogo dentro de casa.
Continua após a publicidadeForam quatro homens, na quinta, dei uma fraquejada e veio uma mulher.
Deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ), na Hebraica do Rio
(Com Estadão Conteúdo)