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Ataque em escola expõe avanço de facções e vira munição eleitoral no Ceará

Tiros que mataram dois jovens e feriram outros três em Sobral são também um pesado golpe na imagem da educação pública, um dos maiores orgulhos do estado

Por Bruno Caniato Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 4 out 2025, 08h00

Na manhã de 25 de setembro, uma quinta-feira, Sobral, no interior do Ceará, foi palco de um bárbaro episódio de violência produzido pelo crime organizado. Em uma rua lateral à Escola Estadual Professor Luis Felipe, no bairro Campos Velhos, dois homens desceram de uma moto e, sem tirar seus capacetes, sacaram revólveres e abriram fogo em direção ao estacionamento do colégio. Os disparos atingiram cinco alunos, e dois deles, de 16 e 17 anos, morreram no local — a ação não durou mais do que quinze segundos. As aulas foram suspensas por duas semanas em meio ao medo dos pais, à comoção da população e às investigações policiais, que já identificaram relações de atiradores e vítimas com facções do narcotráfico. Além dos jovens mortos e feridos, os tiros disparados contra os estudantes atingiram em cheio um dos orgulhos de Sobral e do Ceará — a qualidade de suas escolas públicas —, escancararam a crise de segurança vivida pelo estado e espalharam estilhaços na pré-corrida para a eleição ao governo em 2026.

As motivações do ataque estão sendo investigadas, mas há evidências de disputa entre facções criminosas. Um dos suspeitos, preso no dia seguinte, é apontado como ex-integrante do Comando Vermelho que migrou para o Primeiro Comando da Capital (PCC) e foi jurado de morte — ele cumpria pena por homicídio desde 2016, foi solto e novamente detido em 2019 por roubo e estava em liberdade desde março. O segundo atirador, também ligado ao PCC, continuava foragido até quinta-feira 2. Já os jovens mortos, segundo as autoridades, tinham relações com o CV e estavam com drogas e uma balança de precisão nas mochilas quando foram mortos. Em 2024, a apreensão de drogas no Ceará chegou ao recorde de 10,7 toneladas, mais que o dobro do ano anterior.

PRESSIONADO - Elmano: alta da criminalidade desgasta o petista, que vai tentar a reeleição em 2026
PRESSIONADO - Elmano: alta da criminalidade desgasta o petista, que vai tentar a reeleição em 2026 (@elmanofreitas/Instagram)

O ataque intensificou a pressão sobre o governador Elmano de Freitas (PT), que almeja a reeleição e sofre para entregar bons resultados contra a criminalidade. Em 2024, a escalada dos homicídios derrubou o secretário de Segurança Pública e Defesa Social, Samuel Elânio. Seu sucessor, Roberto Sá, que já chefiou as pastas estaduais no Rio de Janeiro e no Espírito Santo, defende que a Justiça seja mais rígida para manter criminosos na cadeia e cobra apoio do governo federal para custear a modernização das polícias e a integração nacional nas investigações. “Não podemos pensar a segurança com a mentalidade do passado contra roubo de bicicletas no bairro. A polícia precisa estar aparelhada com tecnologia, e integrantes de facções que cometem esses crimes devem ser reprimidos à altura”, diz o secretário.

A tragédia de Sobral gerou munição eleitoral para adversários. “É o governador-carreata: acontece o crime e as ruas ficam lotadas de viaturas, que ficam um ou dois dias e vão embora”, diz o deputado André Fernandes (PL), um dos líderes da oposição, que foi à escola gravar vídeos com críticas a Elmano. Político com raízes eleitorais em Sobral, o ex-governador Ciro Gomes (PDT), que ensaia enfrentar o petismo na eleição estadual, declarou que Elmano e seu padrinho, o ministro da Educação, Camilo Santana (PT), têm as “mãos sujas de sangue inocente”. “O entranhamento das facções na política do Ceará é fato chocante e impune”, disse.

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NO ATAQUE - Ciro: críticas ao governador e ao seu padrinho, Camilo Santana
NO ATAQUE - Ciro: críticas ao governador e ao seu padrinho, Camilo Santana (Brenno Carvalho/Ag. O Globo/.)

O palco da chacina, uma escola pública, representa um pesado golpe à imagem da principal vitrine do estado — o Ceará tem vinte das cinquenta melhores cidades do país nos anos finais do ensino fundamental, segundo o último Ideb (2023). Não por acaso, Camilo Santana chefia a Educação no governo Lula — o ministro publicou mensagem de solidariedade às vítimas e mobilizou equipes do MEC para prestar apoio. Sobral figura recorrentemente nas primeiras posições de rankings nacionais de ensino, mas os alunos hoje correm risco de morte ao atravessar áreas controladas por facções para ir à aula. “A juventude está exposta à violência do tráfico, e a resposta envolve políticas de proteção e incentivo à profissionalização, cultura e lazer”, diz Danielle Tsuchida, coordenadora de projetos no Instituto Sou da Paz. Nos últimos dez anos, um terço das vítimas de homicídios dolosos no Ceará (12 700 casos) tinha entre 12 e 23 anos. O estado agora desponta em outro tipo de ranking: tem, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2025, a terceira maior taxa de mortes violentas intencionais do Brasil — 37,5 casos por 100 000 habitantes, quase o dobro da taxa nacional, de 20,8 — e três das dez cidades mais violentas do país, incluindo a campeã, Maranguape, com índice de 79,9.

O avanço das facções criminosas não é recente e não se restringe ao Ceará, atingindo também outros estados do Nordeste e do Norte do país. Para especialistas, as políticas de combate à criminalidade no Brasil estão defasadas. “É preciso priorizar a capacidade investigativa e a perícia técnica, capazes de desmantelar redes complexas de criminalidade e produzir provas que responsabilizem definitivamente os autores”, diz Sérgio Adorno, sociólogo e coordenador do Núcleo de Estudos da Violência (NEV) da USP. Fato inegável é que a segurança pública já ocupa o topo das preocupações dos brasileiros, que vão cobrar nas urnas, em 2026, medidas concretas do poder público. A execução de jovens dentro da escola em Sobral demonstra que a resposta das autoridades, por ora, está longe de ser eficaz.

Publicado em VEJA de 3 de outubro de 2025, edição nº 2964

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