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Aposta de Lula, Boulos vê sinais de alerta na corrida eleitoral em SP

O candidato levou um choque de realidade com a divulgação das últimas pesquisas, que mostraram um conjunto relevante de problemas no horizonte do psolista

Por Valmar Hupsel Filho, Adriana Ferraz 16 mar 2024, 08h00

Guilherme Boulos (PSOL) se consolidou como pré-candidato à prefeitura de São Paulo já em maio de 2022, quando abdicou de concorrer ao governo do Estado e lançou-se a deputado federal, em um acordo que garantiu para ele o inédito apoio do PT a um nome de outro partido na maior cidade do país. Com recall de três campanhas (para presidente em 2018, prefeitura em 2020 e deputado em 2022), em que teve votações expressivas, ele saiu na frente logo nas primeiras pesquisas de intenção de voto. Principal aposta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da esquerda para a eleição, Boulos segue como favorito para chegar ao segundo turno, mas tomou um choque de realidade com a divulgação das últimas sondagens, que mostraram um conjunto relevante de problemas no horizonte do psolista. Segundo o Datafolha, ele está agora empatado tecnicamente com o prefeito Ricardo Nunes (MDB) — 30% a 29% — e tem a maior rejeição do eleitorado (34%) no momento em que seu maior padrinho político também perde prestígio em São Paulo (veja o quadro).

arte Boulos

Boulos era tido como o nome a ser batido já quando Nunes assumiu o cargo, em maio de 2021, com a morte de Bruno Covas. Ex-vereador discreto, o prefeito ainda buscava se tornar mais popular, fincar a sua marca na gestão e se credenciar a uma tentativa de reeleição. Três anos depois, Nunes não só aparece em pé de igualdade com o deputado do PSOL, mas o supera em segmentos estratégicos do eleitorado, como entre os mais pobres (com renda familiar até dois salários mínimos), que representam 40% dos votantes. Também viu a avaliação de sua gestão subir e hoje é tão conhecido do eleitor quanto Boulos (85% a 83%).

O cenário de empate técnico a sete meses da votação confirma a sensação de que o pleito paulistano será altamente polarizado entre os dois favoritos, com fortes emoções reservadas ao longo da campanha. Embora o estafe de Boulos não tenha demonstrado preocupação com o Datafolha, alguns dados merecem atenção. A aprovação de Nunes, por exemplo, vem crescendo à medida que ele se torna mais conhecido. Para o cientista político Alberto Carlos de Almeida, do Instituto Brasilis, a aprovação da gestão é o principal índice a ser considerado numa disputa com candidato à reeleição, porque o eleitor avalia se quer permanecer com o governo vigente ou mudar. Almeida lembra que essa avaliação cresceu 12 pontos percentuais desde abril de 2022, mas precisa crescer mais 11 para deixá-­lo em condição privilegiada. “Para que o prefeito se torne franco favorito, ele precisa de 40% de ótimo/bom ou mais”, pontua — Nunes tem hoje 29%.

ESTRATÉGIA - Ricardo Nunes: aposta em um grande programa de obras
ESTRATÉGIA - Ricardo Nunes: aposta em um grande programa de obras (Ronaldo Silva/Ato Press/Agência O Globo/.)

A estratégia de Boulos passa por impedir que essa melhora continue. A campanha já iniciou ofensiva para aumentar a rejeição do prefeito, como um programa em suas redes sociais para noticiar problemas da cidade e irregularidades da administração. A ideia é colar a imagem de que o crescimento de Nunes se dá pelo uso ostensivo e irregular da máquina pública. Segundo a campanha da esquerda, foram mais de 200 milhões de reais gastos em publicidade, além de quase 5 bilhões de reais em obras sem licitação nos últimos dois anos. Em paralelo, o comitê tentará diminuir a rejeição do próprio Boulos. A avaliação é que houve ao menos um apontamento positivo no Datafolha: a intenção de voto espontânea nele cresceu de 8% em agosto para 14% agora. “Isso mostra a solidez da candidatura”, afirma o marqueteiro de Boulos, Lula Guimarães.

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Outra estratégia é mirar o eleitorado mais pobre, que hoje está majoritariamente com Nunes. Para isso, a campanha conta com ajuda do PT, partido que tem muito mais capilaridade na periferia. O anúncio da ex-prefeita Marta Suplicy (PT) como vice, no fim de janeiro, não teve impacto até agora — Boulos tem praticamente o mesmo percentual de votos que tinha em agosto (32% a 30%). Mas é certo que o petismo mergulhará na campanha, até porque Lula já deixou claro que vai se empenhar pessoalmente pela vitória de Boulos. “Houve um estranhamento inicial porque queríamos que o PT tivesse candidato, mas essa questão já está superada e estaremos com força total”, anuncia o deputado estadual Ênio Tatto.

INCERTEZA - Kim: deputado tem dificuldade de convencer o próprio partido
INCERTEZA – Kim: deputado tem dificuldade de convencer o próprio partido (Eliane Neves/Fotoarena/.)

Enquanto sorri com os ventos favoráveis, Nunes também prepara a sua estratégia. Um dos pontos é não forçar a polarização nacional que Boulos e a esquerda tanto desejam. Enquanto a campanha adversária tenta ligá-lo a Bolsonaro, chamando-o de apoiador de golpista por ter ido ao ato convocado pelo ex-presidente na Avenida Paulista, Nunes tenta colar em Boulos a imagem de radical, invasor de terras e apoiador de extremistas como o Hamas — mas sempre ataca o candidato e nunca mira em Lula. Com o bolsonarismo, o desafio é caminhar no fio da navalha, já que o mesmo Datafolha mostrou que a maioria não o liga ao ex-presidente e 63% disse que não votaria em um nome indicado por Bolsonaro. A difícil missão é conquistar o voto de quem é bolsonarista, mas não ser identificado como tal para o eleitor que rejeita o ex-presidente.

arte Boulos

Um ponto que conta a favor do prefeito é que as eleições municipais, historicamente, tendem a não ser nacionalizadas. Pesquisas mostram que o eleitor tenderá a se guiar por questões que atingem seu bairro e seu cotidiano. Por isso, Nunes aposta nas entregas de obras como unidades de saúde, creches, parques e recapeamento asfáltico. “A população começa a perceber que não é esse o debate que ela quer”, declarou, em vídeo distribuído a aliados em comemoração aos resultados da pesquisa. Para mostrar o que faz, o prefeito também tem outro trunfo: ele deve ter mais de 60% do tempo de rádio e TV e a maior fatia dos fundos partidário e eleitoral.

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ALTERNATIVA - Tabata: aposta na saturação da polarização para ganhar terreno
ALTERNATIVA – Tabata: aposta na saturação da polarização para ganhar terreno (Eliane Neves/Fotoarena/.)

A eleição, claro, ainda está longe. Em sete meses, muita coisa pode mudar no humor do eleitor e até na configuração do páreo. Em terceiro lugar, com 8%, Tabata Amaral (PSB) aposta na saturação do ambiente polarizado para ganhar terreno. “Isso gera forte desgaste e é aí que o eleitor pode se interessar em ouvir o que ela tem a dizer”, diz o marqueteiro de sua campanha, Pablo Nobel. Para ele, a alta taxa de desconhecimento (47% não a conhecem) aliada à baixa rejeição (19%) dão a Tabata um caminho para crescer. No início do ano, circulou nos bastidores a informação de que Lula planejava atuar para tirá-la da disputa. Apoiada pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, Tabata não dá sinais de desistir. Mais difícil é a vida do deputado Kim Kataguiri (União Brasil), que tem 4% e cuja candidatura é fortemente ameaçada pela intenção de seu partido em apoiar Nunes.

A eleição paulistana sempre foi a mais importante do país, dado o peso da cidade e o tamanho do seu orçamento (o quarto maior do país, atrás apenas da União e dos estados de São Paulo e Minas Gerais). Agora, as atenções devem ser ainda maiores em razão do apoio de Lula e Bolsonaro aos dois favoritos. Boulos carrega nos ombros a missão de levar a esquerda de volta aos tempos de glória nas eleições municipais. Enquanto isso, uma vitória de Nunes representaria não apenas um triunfo do ex-­presidente: seria também uma demonstração de força do governador paulista Tarcísio de Freitas, outro cabo eleitoral importante do atual prefeito. A disputa está equilibrada, como mostram as últimas pesquisas, mas o viés de alta de Nunes inegavelmente acendeu o sinal vermelho na campanha adversária.

Publicado em VEJA de 15 de março de 2024, edição nº 2884

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