Ícone de fechar alerta de notificações
Avatar do usuário logado
Usuário

Usuário

email@usuario.com.br
Relâmpago: Revista em casa por 9,99/semana

A retomada do inquérito que investiga Rui Costa em escândalo milionário na pandemia

Gonet pediu prosseguimento das apurações sobre envolvimento do ministro-chefe da Casa Civil no caso da compra de respiradores que nunca foram entregues

Por Laryssa Borges Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 3 out 2025, 12h27 - Publicado em 3 out 2025, 06h00

Desde que assumiu a chefia da Casa Civil do governo Lula, Rui Costa é alvo de muitas intrigas — nenhuma delas, porém, incomoda e preocupa mais o ministro do que as recorrentes insinuações sobre seu envolvimento num esquema de corrupção que desviou 48 milhões de reais dos cofres públicos durante a pandemia de 2020. Na época, ele era governador da Bahia, presidente do Consórcio Nordeste e milhares de pessoas morriam vítimas da covid-19. Numa operação até hoje não totalmente esclarecida, Costa autorizou a compra de 300 respiradores; na sequência foi contratada uma empresa para intermediar o negócio, os valores foram quitados antecipadamente, mas os equipamentos nunca foram entregues. As investigações indicam que houve uma fraude planejada do início ao fim. Os principais responsáveis pelo golpe foram identificados, mas o inquérito, cinco anos depois, continua inconcluso e protegido por segredo na Justiça. Apontado como suspeito de envolvimento na trama, o ministro sempre jurou inocência.

“Apesar de não ter tido contato com o governador Rui Costa, eu entendi que ele estava ciente do negócio, porque, conforme já mencionado, Carlos Gabas dizia que só atuava com o o.k. de Bruno Dauster, que por sua vez dizia que a última palavra era do governador Rui Costa.” - Cristiana Taddeo, proprietária da Hempcare, em delação premiada
“Apesar de não ter tido contato com o governador Rui Costa, eu entendi que ele estava ciente do negócio, porque, conforme já mencionado, Carlos Gabas dizia que só atuava com o o.k. de Bruno Dauster, que por sua vez dizia que a última palavra era do governador Rui Costa.” – Cristiana Taddeo, proprietária da Hempcare, em delação premiada (Rogerio Albuquerque//)

Desde que assumiu o seu posto no governo Lula, Rui Costa procura autoridades do Judiciário para dar sua versão sobre o caso. Recentemente, ele iniciou uma nova peregrinação pelos tribunais superiores, em Brasília, particularmente pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), onde o inquérito dormitou durante anos. Aos interlocutores garante que nunca se envolveu diretamente na compra dos respiradores e justificou o fato de não ter chamado a atenção dele nem mesmo o estranho nome da empresa contratada para realizar o serviço — Hempcare (hemp em inglês é maconha). O ministro explicou que isso teria ocorrido porque ele não domina o idioma inglês. A justificativa não convenceu o procurador-geral da República, Paulo Gonet, que, em junho passado, apontou a existência de indícios que justificam o prosseguimento das investigações. Em seu parecer, Gonet destacou que o ministro assinou o contrato de compra dos respiradores com a previsão de pagamento antecipado e sem as garantias necessárias para proteger os cofres públicos, e defendeu que o caso continuasse no STJ.

A peça mais importante do inquérito é a delação premiada de Cristiana Prestes Taddeo, dona da empresa que vendeu, mas não entregou os respiradores. VEJA teve acesso ao primeiro capítulo da confissão. No depoimento, Cristiana revela como embolsou milhões de reais sem precisar de grandes esforços, identifica os envolvidos na trama e expõe, entre muitas barbaridades, o nível de ganância e crueldade das pessoas que decidiram saquear os cofres públicos se aproveitando de uma tragédia humana. Cristiana afirma ainda que foi informada que todas as ordens de compra daquele período passavam necessariamente pelo crivo do governador, detalha a participação direta de dois lobistas ligados a Rui Costa e afirma ter ouvido de várias fontes que era ele quem daria a palavra final sobre o negócio, quando o golpe já estava em andamento. Os lobistas, segundo ela, também demonstravam ter proximidade com a então primeira-dama, Aline Peixoto, atual conselheira do Tribunal de Contas do Estado. Além de contar o que sabia em troca de benefícios judiciais, a delatora devolveu 10 milhões de reais do dinheiro desviado pela quadrilha.

INDÍCIOS - Gonet: procurador-geral da República recomendou o prosseguimento do inquérito
INDÍCIOS - Gonet: procurador-geral da República recomendou o prosseguimento do inquérito (Leobark Rodrigues/SECOM/MPF//)
Continua após a publicidade

Segundo Cristiana, tudo começou em abril de 2020. Na época, o Brasil havia acabado de superar a China em número de óbitos. A dona da Hempcare conta ter recebido uma ligação de Bruno Dauster, secretário da Casa Civil da Bahia e braço direito de Rui Costa, perguntando se ela topava assinar um contrato com o Consórcio Nordeste para importar 300 respiradores, um negócio de 48 milhões de reais. “Eu achei que fosse um trote”, confidenciou ela. Não era.

A empresa recebeu 34 milhões de reais apenas quatro dias depois do telefonema. Menos de 24 horas depois, mais 14 milhões sem qualquer garantia, sem assinatura de qualquer contrato ou documento. As negociações ocorriam por WhatsApp, não havia checagem prévia da confiabilidade das importadoras que se dispunham a vender os equipamentos, lobistas combinavam abertamente as respectivas comissões pela suposta influência junto ao governador e os pagamentos ocorriam antecipadamente e sem qualquer certeza de que os produtos um dia seriam entregues. Os respiradores nunca chegaram e o dinheiro evaporou. “Em quase todas as comunicações mantidas com Bruno Dauster ele mencionou que dependia de autorização de Rui Costa para tomar as decisões”, disse a delatora no acordo de colaboração. Havia pouco ou nenhuma preocupação dos envolvidos com futuras investigações.

Uma nota fiscal endossada na época por três instâncias do Consórcio Nordeste, inclusive pelo então secretário-executivo do grupo e ex-ministro do governo Lula, Carlos Gabas, dava conta de que os respiradores não só haviam sido entregues como foram “por nós aceitos em perfeitas condições” — um absurdo. Cristiana Taddeo nunca chegou a comprar qualquer aparelho e, em sua delação, admitiu que, “para maquiar a importação”, fraudou guias de notificação da empresa que supostamente fabricaria os ventiladores com informações falsas de que eles haviam apresentado defeito e que, por isso, o envio ao Brasil seria atrasado. “Essas notificações não são verídicas e foram elaboradas (…) para auxiliar Bruno Dauster a justificar aos demais governadores do Consórcio Nordeste o atraso na entrega dos respiradores”, explicou. Dauster chegou a ser alvo de mandado de busca e apreensão em 2022. Gabas, que atestou o recebimento dos respiradores e é um dos investigados no inquérito, respondeu a um processo administrativo instaurado no Tribunal de Contas da União (TCU). Contrariando parecer da equipe técnica, em abril passado a Corte simplesmente o eximiu de responsabilidades pelo escândalo. Ele ainda ocupa o cargo de secretário-executivo do Consórcio Nordeste. Em nota, ele informou que “o Consórcio e seus gestores foram vítimas de um golpe” e disse que aguarda que “os particulares que fizeram isso sejam responsabilizados e o dinheiro apreendido na totalidade e devolvido a cada estado”.

Continua após a publicidade
RESPIRADORES - Pandemia: dinheiro desviado enquanto milhares de pessoas agonizavam
RESPIRADORES – Pandemia: dinheiro desviado enquanto milhares de pessoas agonizavam (Silvio Avila/AFP)

Com o fracasso da importação, a delatora conta que a quadrilha ainda simulou a compra de respiradores supostamente fabricados no Brasil, o que também não aconteceu. “Apesar de não ter tido contato com o governador Rui Costa, eu entendi que ele estava ciente do negócio, (…) Carlos Gabas dizia que só atuava com o ok de Bruno Dauster, que por sua vez dizia que a última palavra era do governador Rui Costa”, explicou Cristiana Taddeo.

“Em quase todas as comunicações mantidas com Bruno Dauster ele mencionou que dependia da autorização de Rui Costa dos Santos para tomar as decisões.”

Cristiana Taddeo, contando o que viu e ouviu durante a execução da fraude
Continua após a publicidade

O inquérito sobre o caso já esteve com a Polícia Civil da Bahia, com o Superior Tribunal de Justiça, o Supremo Tribunal Federal, a Polícia Federal, o Tribunal de Justiça da Bahia, voltou ao Supremo, de onde foi enviado novamente ao gabinete do ministro Og Fernandes, do Superior Tribunal de Justiça, em agosto passado. Esse passeio de 1868 dias se deve às divergências sobre o foro adequado para o prosseguimento da investigação, já que o caso envolve um ex-governador, promovido a ministro de Estado.

Rui Costa repete em sua defesa que foi o próprio Consórcio Nordeste que, ao detectar as fraudes, acionou a polícia para as devidas apurações. Procurado por VEJA, ele afirmou, em nota, que “a peça da PGR não agrega nenhum elemento acusatório quanto à conduta do então governador da Bahia e que o próprio Ministério Público já tinha manifestado, em parecer emitido no decorrer do processo, que não existe nenhum fato que o vincule a qualquer irregularidade na compra dos respiradores”. O recente parecer do PGR deve levar em breve à retomada das investigações, que não avançaram nesse interminável vaivém de anos. É fundamental punir os responsáveis, o que ajudará a afastar também qualquer sombra de dúvida sobre os nomes dos inocentes envolvidos no caso.

Publicado em VEJA de 3 de outubro de 2025, edição nº 2964

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

15 marcas que você confia. Uma assinatura que vale por todas.

OFERTA RELÂMPAGO

Digital Completo

A notícia em tempo real na palma da sua mão!
Chega de esperar! Informação quente, direto da fonte, onde você estiver.
De: R$ 16,90/mês Apenas R$ 1,99/mês
ECONOMIZE ATÉ 28% OFF

Revista em Casa + Digital Completo

Receba 4 revistas de Veja no mês, além de todos os benefícios do plano Digital Completo (cada revista sai por menos de R$ 10,00)
De: R$ 55,90/mês
A partir de R$ 39,99/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$23,88, equivalente a R$1,99/mês.